Universidade Atlântica: “O importante não é o título”, defende reitor

O Governo retirou o estatuto de universidade à instituição, mas o desfecho do caso está agora nas mãos da justiça. Actuais proprietários já fizeram desaparecer do logótipo a menção a universidade.

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Para o reitor da Universidade Atlântica, os estudos sem prática "já não fazem sentido" Rui Gaudêncio

O reitor da Universidade Atlântica, Carlos Guillén, é peremptório quando se refere ao diferendo que opõe a instituição ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, e que levou já este a determinar, em Maio passado, a retirada do estatuto de universidade àquela instituição. “O importante não é o título, mas sim que os cursos sigam normalmente, reconhecidos pelo ministério, e que os estudantes tenham os seus diplomas no final. Isso é que importa”, afirma.

Como a Atlântica recorreu, o desfecho do caso está agora nas mãos da justiça e enquanto este prossegue o estatuto de universidade mantém-se. O ministério limitou-se a informar que “o processo está em curso”. Já Guillén frisa que os problemas que levaram ao diferendo actual são da responsabilidade dos anteriores proprietários e gestores da Atlântica.

A decisão do ministro do Ensino Superior, Manuel Heitor, deve-se ao facto de a instituição nunca ter tido um doutoramento, uma vez que o pessoal docente não tinha a qualificação suficiente para tal. Este critério é obrigatório para manter o estatuto de universidade.

A instituição, que faz agora 20 anos, foi um dos exemplos paradigmáticos da ligação entre poder político e universidades. Na sua fundação, em 1996, tinha entre os seus accionistas dois membros do então governo socialista de António Guterres: a secretária de Estado da Educação, Ana Benavente, e o ministro da Justiça, Vera Jardim. Três anos depois, foi a vez do social-democrata Marques Mendes assumir a presidência da entidade proprietária da Atlântica, a EIA-Ensino, Investigação e Administração.

“Não os conheço de lado nenhum”, comenta Guillén, garantindo deste modo que a ligação entre a Atlântica e o poder político, de que esta universidade foi um dos exemplos paradigmáticos, pertence agora ao passado.

Professores doutorados

Guillén assegura que actualmente a Atlântica “reúne todos os requisitos” que são exigidos por lei, a começar pelo facto de “todos os docentes da universidade serem doutorados”. Em breve, acrescentou, serão apresentadas na A3ES, agência que acredita os cursos do ensino superior, propostas para a criação de cursos de doutoramento na universidade que se localiza numa zona rural de Barcarena, no concelho de Oeiras.

Pelo caminho, do logotipo oficial da instituição já desapareceu o nome de universidade. É apresentada como Atlântica, instituição de ensino universitário. É esta também a nova designação apontada pelo ministro Manuel Heitor no despacho em que determina a retirada do estatuto de universidade, que foi publicado em Diário da República em Maio passado.

Guillén garante que a mudança de logótipo nada teve na ver com o diferendo actual, tendo sido concretizada, adianta, logo após a compra, em 2014, da maioria (87%) do capital da empresa que detém a instituição pelo grupo industrial Carbures. O grupo tem sede em Espanha e é especialista no fabrico de materiais de fibra de carbono destinados à aeronáutica. É, aliás, fornecedor da Boeing e da Airbus.

O actual reitor, que antes era professor na Universidade de Cádis, também entrou em funções depois da entrada em cena do grupo Carbures. Antes era a Câmara de Oeiras que detinha 41% do capital da Atlântica. Com a entrada do Carbures, impôs-se uma “nova mentalidade”, diz, que passou pela alteração do nome de universidade para instituição de ensino universitário, pela requalificação do corpo docente e pela mudança dos planos de estudos das oito licenciaturas então existentes.

Agora existem mais duas: Engenharia de Materiais, que começou no ano lectivo passado, e Engenharia Aeronáutica, que se estreou este ano. Também este ano lectivo abriram dois novos mestrados nestas áreas, que são a menina dos olhos do grupo, a que se juntou Gestão da Produção. No total, a Atlântica tem 1200 alunos.

"Empresa-universidade"

Da “nova mentalidade” faz parte também uma forte aposta na prática. “Os estudos sem investigação e sem prática já não fazem sentido”, defende o reitor. Esta componente prática reforçar-se-á em Janeiro, com a primeira leva de estágios, que estão garantidos para todos os anos das licenciaturas, nas fábricas do grupo Carbures e da Airbus, em Espanha. No Verão, seguirão para Espanha os alunos de mestrado.

O caminho para a Atlântica é o de transformar-se numa “empresa-universidade”, destaca o reitor, frisando que este é um modelo novo em Portugal. O que quer isto dizer? Que a universidade “é parte de uma empresa, alimenta-se desta, resolve problemas da empresa, contribuindo com investigação”.

Na prática, o que o grupo Carbures pretende, segundo as palavras de Guillén, é que a Atlântica funcione como um berço de criação de produtos, embora a fabricação seja sempre em Espanha, que possam ser patenteados, para além de fornecer os seus serviços para fazer ensaios de materiais produzidos fora. Com Samuel Silva

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