Um detido especial?

Nas primeiras 48 horas que passou na cadeia de Évora, Sócrates recebeu pelo menos três visitas. E teve de se adaptar à burocracias da prisão, o que não lhe terá agradado por aí além.

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Para Sócrates, “o Governo está há muito tempo doente” NICOLAS ASFOURI/AFP

Os serviços prisionais evocam a lei para garantirem que não abriram nenhuma excepção no tratamento do recluso José Sócrates. Mas será mesmo assim?

Nas primeiras 48 horas que passou na cadeia de Évora - destinada aos agentes das forças de segurança e a outros reclusos cujo contacto com presos regulares possa fazer perigar a sua segurança – o ex-primeiro ministro foi visitado pelo antigo ministro e presidente da Federação Distrital de Évora do PS Capoulas Santos, a sua ex-mulher Sofia Fava e, por fim, pelo antigo Presidente da República Mário Soares (ver texto ao lado). Este último chegou mesmo a explicar que foi o director da cadeia, “muito simpático”, quem lhe permitiu antecipar a visita que era para ter feito só nesta quinta-feira, dia em que ia estar ocupado por ir lançar um livro. Segundo o regulamento desta cadeia, as quartas-feiras são, a par dos fins-de-semana e feriados, os únicos dias de visita – muito embora a lei diga que o recluso preventivo colocado em regime comum pode receber visitas “sempre que possível todos os dias”.

Habituado a defender agentes das forças de segurança, o advogado Melo Alves conhece bem o funcionamento das prisões. “Cada recluso tem direito a visitas duas ou três vezes por semana, que só podem ter lugar com autorização das educadoras”, figuras do estabelecimento prisional que têm a seu cargo um conjunto de presos. Admitindo que também já beneficiou de autorizações excepcionais para visitar constituintes seus detidos ao fim-de-semana, por exemplo, o advogado pensa mesmo assim que José Sócrates “está a ter direitos que outros reclusos não têm”.

“É verdade que em certas circunstâncias se consegue visitar o recluso no próprio dia em que se pede autorização para tal. Mas com um recluso normal as coisas não aconteceriam com tanta celeridade. Não teria este tipo de facilidades”, observa, numa referência ao facto de o ex-governante ter recebido três visitas e se preparar com certeza para receber muitas mais “visitas de cortesia”.

Sócrates já não se encontra na cela isolada onde passou as duas primeiras noites: foi transferido para uma ala, onde continua numa cela individual. Já tomou o pequeno-almoço com os restantes presos e teve de lidar com as burocracias inerentes ao seu ingresso no estabelecimento prisional, o que não lhe terão agradado por aí além, como tratar do cartão de utente dos serviços prisionais para poder fazer chamadas dos telefones da cadeia e fazer compras no bar.

Segundo o Regulamento Geral dos Estabelecimentos Prisionais, aprovado quando era ainda primeiro-ministro, cada recluso só tem direito a uma chamada telefónica por dia para o exterior, com a duração máxima de cinco minutos, e a outra para o seu advogado, com a mesma duração, embora o director da prisão possa autorizar contactos telefónicos mais frequentes a quem não receba visitas regulares. Também só pode telefonar para dez números diferentes, além do do seu advogado. Esta cadeia para polícias foi inaugurada em 2007, altura em que Sócrates estava à frente do Governo.

Entretanto, a mulher de João Araújo, o advogado do ex-primeiro-ministro, apagou dois tweets seus que davam conta de pormenores do interrogatório feito ao primeiro-ministro pelo juiz Carlos Alexandre que não eram do conhecimento público, e que poderiam dar azo a queixas de violação do segredo de justiça.  “Curioso, durante todo o interrogatório os arguidos não foram confrontados com um único facto concreto de corrupção”, escreveu a consultora de comunicação Alda Telles. “Sem crime a montante, por exemplo corrupção, não há branqueamento de capitais”, acrescentou a mulher do advogado.

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