Três queixas, três ilações

A linearidade de um título “compromete”, por vezes, o conteúdo da notícia.

Resolvi, hoje, articular três queixas apresentadas por leitores. Repõem assuntos diferentes, mas talvez possa concluir que são atravessadas por suspeitas, interrogações, sentimentos, que têm a ver com a responsabilidade imputada ao acto da notícia, a quem a dá, e também, a quem reage e como reage à informação. Episódios simples que fazem a vida dos jornais e a sua relação com os leitores. Os casos vêm abaixo relatados.

Adianto, porém, desde já, as ilações, contando que os leitores vão ler os assuntos que as sugerem: 1) De como a linearidade de um título “compromete”, por vezes, o conteúdo da notícia; 2) De como, a Banca, relevante autor e actor da crise que nos persegue desde 2008, ainda não percebeu a importância da transparência para criar credibilidade; 3) De como é possível, por pequenas coisas, o leitor perder a confiança na informação recebida.

1.A “queixa”: “Venho por este meio” – escreve o leitor Jorge Emídio - “manifestar a minha completa estupefação e incredulidade sobre a notícia:"Destacamentos de professores por doença indignam colegas." (PÚBLICO, 27.07.15) . Os autores da notícia metem no "mesmo saco" todos os docentes que apresentam problemas de saúde. No entanto deixo ao Provedor e principalmente aos jornalistas, Graça Ribeiro Graça e António Rodrigues, o seguinte: 

Despacho n.º 4773/2015 refere o seguinte: "8 — A mobilidade dos docentes ao abrigo do presente despacho não pode originar insuficiência ou inexistência de componente letiva dos docentes do agrupamento de escolas ou da escola não agrupada onde seja efetuada a colocação." Chega???” - pergunta o leitor.

O comentário: Sobre este assunto pedi esclarecimentos aos jornalistas autores da notícia. Ausente, por gozo de férias, a jornalista Graça Ribeiro, respondeu-me a editora da secção PORTUGAL, Andrea Cunha de Freitas: (…) “No quarto parágrafo, os autores da notícia referem que “Isto porque este grupo de docentes veio acompanhado de uma indicação para os directores: aqueles não podem ocupar horários dos professores do quadro da escola em que são colocados; mas, desde que isso seja salvaguardado, deve ser-lhes atribuída componente lectiva (em todos os casos, se o destacamento se dever a terceiros, e sempre que possível, caso o problema de saúde seja do próprio). Apesar de os professores destacados libertarem vagas, algures, isto faz, com que sejam abertas menos vagas nas zonas urbanas, as mais disputadas no concurso de mobilidade interna, para professores de Quadro de Zona Pedagógica e para quem não tem componente lectiva na escola de origem”. “Assim, antes de mais,  o que está em causa não é a “ameaça” aos professores que estão nestas escolas onde os docentes são colocados mas o prejuízo que outros professores alegam ter por serem “ultrapassados” por estes docentes.”

Por sua vez, o jornalista António Rodrigues respondeu: “De facto, a informação que é solicitada na reclamação está, na minha opinião, explicada nos dois parágrafos citados pela Coordenadora Andrea Cunha Freitas. Aliás, essa foi, também, a informação prestada, por escrito, pela Assessoria do Ministério da Educação que, no entanto, recusou responder a várias das questões colocadas pelo PÚBLICO, por escrito.

Vários directores de escola confirmaram que estão a atribuir componente lectiva aos professores destacados no âmbito da mobilidade por doença, à excepção daqueles que assinam uma declaração, pedida pela escola, sob compromisso de honra, em que os professores garantem não ter condições de assumir qualquer turma. Aos restantes, mediante indicação do Ministério, está a ser-lhes atribuída componente lectiva.

Reforço que a situação afecta, este ano, não os professores de quadro de agrupamento (tal como está plasmado no decreto e na peça) mas os professores de quadro de zona pedagógica, para além dos professores contratados (que já eram afectados nos anos anteriores). Ou seja, na minha opinião, é o próprio Ministério que, na sua reclamação, está a colocar todos os docentes "no mesmo saco”.

Comentário do provedor: Parece-me estarem dados os devidos esclarecimentos. Porém, julgo, mais uma vez, estarmos sob um título que, de alguma maneira, atraiçoa a complementaridade da notícia.

 

2. A queixa: “Desculpe mais um desabafo que até pode nem ter qualquer fundamento, mas a notícia em destaque no PÚBLICO do dia 24/7/15 (Banco de Portugal denuncia Montepio ao Ministério Público) entrou, a meu ver, em conflito com os canais noticiosos do mesmo dia e na imprensa escrita do dia seguinte. A notícia era desmentida e até o responsável do Montepio declarava na TV que iria defender o bom-nome daquela instituição pelas vias judiciais. Esperava no dia seguinte ler no PÚBLICO ou a correção ou a confirmação do assunto, mas nada até hoje. Estranho também não encontrar desde então e nos mesmos canais e na imprensa escrita qualquer nova abordagem do caso, dando-me a impressão de lhe ter sido colocado um pedregulho em cima. Que se passa?”

Comentário do provedor: O que se passa é que, no dia 27 de Julho, segunda – feira, o Ministério Público veio confirmar que, efectivamente, recebera do Banco de Portugal o aludido alerta sobre o Montepio Geral. Como deve o leitor ter reparado, neste caso, o PÚBLICO estava tão seguro da informação divulgada que, apetece dizer, “nem mugiu nem tossiu”, não obstante a ameaça por parte de responsáveis do Montepio que iriam processar judicialmente o jornal. O atraso do MP dever-se-á, por certo, à circunstância do fim-de-semana não ter dado lugar à recepção formal da comunicação do BP. Da parte do Montepio, mais uma vez, verificamos que, em regra, a actuação da Banca, opta pela falta de transparência, sem ainda ter compreendido que, para a tão propalada confiança, regra base da credibilidade dos cidadãos nos bancos, a receita mais recomendada é não utilizar subterfúgios. O que se passou foi como o leitor M. Gaspar Martins reconhece, ao pedir desculpa da temeridade acusada ao PÚBLICO: afinal, “pelo que ouvi e vi nos noticiários, o pedregulho” saltou fora.

 

3. A “queixa”: “Ontem, 23.07.2015 vi na TVI a entrevista com o Primeiro-Ministro. Entrevista que foi feita com o Primeiro-Ministro a pé e nunca sentado e com um cenário mais ou menos moderno. Hoje ao ler o Público na página sobre a reportagem dessa mesma entrevista está uma fotografia do Primeiro-Ministro sentado num cadeirão numa sala decorada num estilo digamos clássico. Ou seja a fotografia não tinha nada a haver com a reportagem.
Acho isto no mínimo deontologicamente estranho. E tira a total confiança sobre se o que está neste melhor jornal português é mesmo verdade. Por outras palavras o leitor só pode perder a confiança no jornal”.

Pedi à jornalista Maria Lopes um comentário a este reparo do leitor João Minnemann. A jornalista esclareceu que “apesar de ser a autora do texto não tive qualquer responsabilidade na escolha da fotografia que o acompanha. Nem sempre isso acontece, mas desta vez foi assim”. Esclareceu ainda que quando as televisões entrevistam políticos, em regra, põem algumas condições ao acesso dos fotógrafos da imprensa. “ E no caso das últimas entrevistas da TVI no formato Tenho uma pergunta para si, não tem sido possível fotografar a entrevista.” (…)”A foto que acompanha o meu texto é de arquivo. (…) Admito que seria mais correcto acompanhar a assinatura do fotógrafo com a referência “Arquivo”. Mas julgo exagerado poder dizer que é um episódio que contribui para que o leitor perca a confiança no jornal.”

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