Três perguntas a Manuel Lemos: lares deviam pedir “caução ou fiador” quando recebem idosos

“Agora acontece o antídoto do abandono: os familiares que vão buscar o idoso ao lar”, diz especialista. “Mas há muita gente que não paga os lares dos pais porque não pode”.

O presidente da União das Misericórdias Portuguesas, Manuel Lemos, defende que o problema do abandono dos idosos nos lares não se combate pela via da criminalização mas sim pela penalização.

O que está a acontecer nos lares de idosos das misericórdias?
É preciso enquadrar a situação actual. A sociedade não está preparada para o envelhecimento. Antigamente, as pessoas reformavam-se e viviam dois a três anos, hoje vivem um terço da sua vida após a reforma. Com o êxodo rural para as cidades e a entrada da mulher no mundo do trabalho, começou o fenómeno do abandono. Os idosos iam para os lares, os familiares pagavam as comparticipações, mas depois alguns não iam lá vê-los.

Agora acontece um fenómeno que é o antídoto do abandono: há familiares que vão buscar o idoso ao lar. Os provedores das Santas Casas têm reagido. Perguntam: “Então você há dois anos veio entregar o seu pai porque a casa não tinha condições e agora vem buscá-lo? A casa já tem condições?”

Depois, há o problema dos familiares que deixam de comparticipar as mensalidades. O fenómeno está a acelerar por razões económicas.

Como se combate isto? Pela via criminal? Como jurista, digo que não. Pela via da penalização, sim. Mas há muita gente que não paga porque não pode. Uma solução poderia passar pela instituição de uma caução ou um fiador [ficar responsável] quando um idoso vai para um lar.

As listas de espera continuam a ser muito grandes?
As listas de espera não são tão grandes assim. Primeiro, porque nalgumas zonas do país a pressão demográfica já começa a diminuir, como são os casos de Castelo Branco e Portalegre. Segundo, porque os idosos agora resistem até ao limite para irem para um lar. Antes iam “just in case”, agora vão “just in time”. Por vezes, quando decidem, já não deviam ir para um lar, mas sim para uma unidade de cuidados continuados [por terem problemas de saúde]. Há famílias que há quatro, cinco anos empurravam os idosos para os lares, agora não, porque percebem que têm que gastar 200 ou 300 euros por mês. O que faz baixar a lista de espera são as dificuldades económicas.

É verdade que as misericórdias têm muitas vagas nas camas que criaram para privados, sem subsídios da Segurança Social?
Na altura do boom dos lares, os acordos de cooperação com o Estado não aumentaram o suficiente para a capacidade instalada e criaram-se essas vagas [privadas]. Nos anos 80 até houve misericórdias que fizeram quartos na parte de cima dos edifícios para as pessoas que podiam pagar. Infelizmente há cada vez menos pessoas dessas.

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