Terrorismo: o papel das cidades

Cabe a cada uma das cidades prevenir o terrorismo, combater situações de exclusão, de diferenças entre culturas e religiões, de desespero dos marginalizados e de todas as formas de injustiça.

As cidades são, talvez, as entidades mais importantes para o futuro da humanidade. Numa altura em que os Estados estão a ser quase engolidos por entidades supranacionais, em particular no que diz respeito a questões de justiça e economia, as cidades, como no início da civilização, têm um papel determinante na satisfação das necessidades dos cidadãos, assim como na sua integração para a cidadania.

É também nas cidades, creio, que encontraremos as melhores respostas para o fenómeno do terrorismo.

As cidades ainda inspiram um forte vínculo de confiança política entre os cidadãos e os eleitos. São uma referência mesmo onde outras instituições falharam. Sendo certo que não poderemos dispensar os Estados e as entidades supranacionais no combate ao terrorismo, sabemos também que, tal como acontece com outros fenómenos relacionados com a violência, a melhor resposta ao extremismo passa pela adoção de políticas de prevenção implementadas nas cidades.

Os terroristas não são, hoje, os estrangeiros de outros tempos. São os companheiros que conhecemos na escola ou no bairro da nossa cidade. O terrorista é alguém que está na nossa comunidade e que em algum momento decide exprimir-se de uma forma extrema.

Vivemos, como bem notou Gilles Lipovetsky, numa sociedade onde o apelo constante à satisfação individual pode agudizar a frustração das expectativas das pessoas. O hedonismo perdeu o seu estilo triunfal e há uma grande insatisfação em cada um de nós. A resposta a este sentimento parece passar, para alguns, pela adesão a contextos extremos, nos quais procuram afirmar a sua esperança e sua personalidade. Algumas destas escolhas conduzem, infelizmente, às novas experiências extremistas oferecidas por vários grupos radicais.

A melhor resposta para estes problemas deverá, creio, assentar no envolvimento cívico das pessoas, fornecendo-lhes objetivos positivos para perseguirem e meios adequados de integração na comunidade. Como qualquer outro assunto de natureza social, é necessário percorrer um caminho difícil, no qual vamos, certamente, enganar-nos, mas onde devemos ser capazes de aprender uns com os outros. Mas este deve, antes do mais, ser um caminho partilhado pelas cidades.

Nestes tempos de crescentes dificuldades económicas, temos de saber onde gastar o pouco dinheiro disponível e selecionar criteriosamente os nossos objetivos. Começa a ser claro que, em matéria de questões de delinquência, as políticas de prevenção são as mais eficazes e as menos dispendiosas. A prevenção nas cidades deve, assim, assumir um papel crescente também no que concerne ao extremismo.

De igual modo, o trabalho das cidades em rede constitui a melhor forma de partilhar conhecimentos e experiência, encontrar os bons caminhos, aprender com as melhores práticas e adotá-las. Isto é válido para a generalidade dos problemas e também no que respeita ao combate do terrorismo.

As 250 autoridades locais congregadas no Fórum Europeu para a Segurança Urbana (FESU), a que presido, têm como finalidade fortalecer as políticas de prevenção da criminalidade e promover o papel dos representantes e eleitos locais nas políticas de segurança nacionais e europeias. Estas cidades estão, assim, empenhadas na luta contra qualquer ameaça à segurança dos seus habitantes. O combate assenta na promoção de um sistema social que respeite os direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente os mais fracos, e a tolerância pela diversidade. Cabe a cada uma das cidades, para prevenir o terrorismo, combater situações de exclusão, de diferenças entre culturas e religiões, de desespero dos marginalizados e de todas as formas de injustiça. Para tal, trabalhamos em todos os tópicos relacionados com as relações de segurança e de construção urbana entre as autoridades locais europeias, através do intercâmbio de práticas e conhecimento, cooperação e formação.

O nosso Manifesto de Aubervilliers e Saint-Denis reúne os valores e princípios que fundamentam a ação dos seus membros. Com este manifesto, as autoridades locais em toda a Europa que são membros do FESU recusam a gestão da segurança de forma reativa, promovendo, em contraponto, políticas de continuidade e afirmando que a resposta está na prevenção, "uma opção racional e estratégica que beneficia da melhor relação custo-benefício" para "garantir a segurança das futuras gerações como um direito fundamental e um elemento essencial da qualidade de vida na cidade".

As comunidades do FESU pedem também que a participação do cidadão se torne um princípio de transversalidade das políticas de segurança.

A trabalhar há 27 anos para tornar as nossas cidades mais seguras, mais inclusivas, mais justas e mais resistentes, foi com consternação que o FESU presenciou os ataques em Paris e Copenhaga, no início do ano, mas também os de Tunes. Assim, e após o nosso projeto As Cidades contra o Terrorismo (2004-2005), a questão da radicalização que leva ao extremismo violento tornou-se novamente um tema importante dentro da organização. Desde o Verão de 2014, temos o apoio da Comissão Europeia para a execução do nosso projeto As Instituições Locais contra o Extremismo (Liaise), que visa o intercâmbio de práticas europeias, o diálogo entre a prática e pesquisa e a formação de agentes locais no domínio da prevenção da radicalização.

Desde os ataques em Paris, em janeiro, as cidades francesas do Fórum mobilizaram-se para ajudar a lidar com a radicalização dos problemas e com os temores que surgiram entre os cidadãos e as comunidades. Com um número significativo dos seus membros mobilizados para este tema, o Fórum tem vindo a desenvolver a ideia de uma rede de cidades europeias contra a radicalização, considerando que a aplicação da lei não é suficiente. Além da intervenção policial e judicial, devem, pois, ser gizadas políticas preventivas que mobilizem sistemas de parcerias locais para a prevenção do crime e que fortaleçam a resiliência dos indivíduos e dos grupos face ao risco de ações de radicalização. Pela sua proximidade aos cidadãos, o nível local é o mais adaptado para implementar essas ações e mobilizar todos os agentes locais necessários.

No quadro do projeto Liaise, o FESU está a preparar um programa de formação para os agentes locais que precisam de suprir necessidades específicas das cidades identificadas no âmbito do projeto de intercâmbio europeu com 12 parceiros de seis países (BE, DE, FR, IT, SP, UK). Este programa centra-se na prevenção da radicalização e no processo de "desradicalização", incluindo a desconstrução do discurso extremista, o estabelecimento de uma política de prevenção multi-disciplinar, a definição de funções na partilha da informação e as estratégias de comunicação, bem como a inclusão social e a participação dos cidadãos.

O Fórum propõe, nomeadamente, contribuir para a criação de uma caixa de ferramentas para a prevenção da radicalização para as autoridades locais; organizar oficinas de intercâmbio operacional de experiências e práticas entre as cidades europeias; planear uma conferência das cidades europeias sobre a questão e considerar a criação de uma rede de cidades europeias contra a radicalização.

Presidente do Fórum Europeu de Segurança Urbana e da Câmara Municipal de Matosinhos

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