Sonhar sem mentir

Os sonhos que sonhamos guardam-se entre as coisas que nunca quisemos e as coisas que nunca aconteceram.

Os nossos sonhos, à medida que vamos sabendo cada vez mais (tornando-nos mais sábios e menos sabidos, vão-se tornando cada vez mais claros. O esquecimento ajuda.

O maior deles é mentirmos menos. Mentir é uma coisa que fazemos nos outros sonhos. Aquilo não só não aconteceu como nunca acontecerá.

Deve ser por isso que mentimos sobre os sonhos que sonhámos. Se nos lembrássemos mais mentíamos mais.

O grande dever na vida - tão curta e ilusória como é - é descobrirmos o que é bom e o que é verdade e, na mais desejada e menos provável das situações, descobrirmos ainda o que é bom e verdade ao mesmo tempo.

Pode não ser nada: não sabemos. Nunca saberemos. Aí reside a alegria da nossa única esperança.

Os sonhos que sonhamos guardam-se entre as coisas que nunca quisemos e as coisas que nunca aconteceram.

As nossas mentiras são desejos guardados que ninguém quer. Pensamos que são vontades que pertencem a outras pessoas mas são indesejadas por toda a gente.

Sonhar é aprender a saber fugir sem pagar ou sofrer. Sonhar é um verbo que arrasta outros desejos para o silêncio.

Sonhar é a vingança de viver. Se viver é bom os sonhos são melhores: são horríveis mas desparecem quando acordamos. Esquecemo-nos deles como se nunca os tivéssemos sonhado. Só noutros sonhos se repetem. Só noutros sonhos os reconhecemos. E fugimos deles, aterrorizados. Mas só nos sonhos. E sem mentir.

É assim que a vida se vinga de nós e das nossas mentiras de verdade.

Sugerir correcção
Comentar