Sócrates diz que vai processar Estado por "abuso inqualificável"

O director do DCIAP, Amadeu Guerra, recusou comprometer-se com o prazo de 15 de Setembro para emitir despacho de acusação contra ex-primeiro-ministro.

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Sócrates insiste que Operação Marquês visou impedi-lo de ser candidato a Presidente da República Daniel Rocha

No mesmo tom indignado que se lhe tornou conhecido nos últimos meses, José Sócrates anunciou nesta quinta-feira que vai processar o Estado por aquilo que qualificou como “abuso inqualificável” no âmbito da Operação Marquês.

“A única coisa que exijo da justiça portuguesa e do director do DCIAP é que respeite a lei e o Estado de Direito. Ele não tem o direito de, com aquela arrogância, vir dizer na televisão ‘logo se vê’”, reagiu Sócrates, numa conferência de imprensa convocada depois de, numa entrevista à SIC, na quarta-feira à noite, o director do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Amadeu Guerra, ter recusado comprometer-se com o dia 15 de Setembro como data limite para arquivar o processo ou emitir o despacho de acusação no âmbito da Operação Marquês.

Asseverando que ninguém mais do que ele pretende dar o despacho final neste processo, Amadeu Guerra, que, em Março, tinha fixado o dia 15 de Setembro como limite para encerrar a investigação, não se compromete agora com datas. “Vamos ver. Vamos aguardar até 15 de Setembro. Ainda falta algum tempo”, disse, para contestar depois a acusação de que não há indícios contra o ex-primeiro-ministro: “Os resultados dos tribunais superiores falam por si.”

“Não é normal, nem decente: é infame”, apressou-se a reagir José Sócrates. Voltando a qualificar a Operação Marquês como um “processo político”, o ex-primeiro-ministro aproveitou para recuperar a tese de que a investigação desencadeada contra si teve um único objectivo: “Quiseram impedir-me de ser candidato a Presidente da República e de ter uma voz pública.”

José Sócrates foi detido a 21 de Novembro de 2014 e indiciado pelos crimes de fraude fiscal qualificada, branqueamento de capitais e corrupção passiva para acto ilícito, num processo entre cujos arguidos se encontram também a sua ex-mulher, Sofia Fava, o ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos e antigo ministro pelo PS, Armando Vara, e a sua filha, Bárbara Vara. Carlos Santos Silva, empresário e amigo do ex-primeiro-ministro, Joaquim Barroca, empresário do grupo Lena, João Perna, antigo motorista do ex-líder do PS, Paulo Lalanda de Castro, do grupo Octapharma, Inês do Rosário, mulher de Carlos Santos Silva, o advogado Gonçalo Trindade Ferreira e os empresários Diogo Gaspar Ferreira e Rui Mão de Ferro foram também constituídos arguidos.

Posteriormente, o juiz Carlos Alexandre ordenou a apreensão de quase 18 milhões de euros das contas de Carlos Santos Silva. E constituiu novos quatro arguidos: as empresas XLM, LEC SGPS, Lena Engenharia e Construções e Rentlei. E, mais recentemente, em meados deste mês, Zeinal Bava e Henrique Granadeiro foram também alvos de buscas, motivadas por suspeitas em relação a negócios da Portugal Telecom com a Vivo e a Oi. A Procuradoria-Geral da República alegou então que as buscas visavam apurar eventuais ligações entre os circuitos financeiros da Operação Marquês e os grupos PT e Espírito Santo.

Sobre esta nova linha de investigação no caso Marquês, o jornal Observador noticia esta quinta-feira que o amigo de Sócrates, Carlos Santos Silva,  terá recebido mais três milhões de euros do Grupo Espírito Santo por conta de um contrato imobiliário que o DCIAP entende ter sido simulado em Angola mas que terão sido financiados pelo Banco Espírito Santo Angola. O grupo da família Espírito Santo estaria assim a procurar garantir decisões favoráveis a nível da gestão e dos investimentos e participações na PT.  

“Tudo isto está a ser feito para insultar e caluniar. Querem fazer crer que havia uma ligação entre o engenheiro Sócrates e Ricardo Salgado que nunca existiu. É uma campanha de difamação a coberto de um processo judicial que não tem controlo jurisdicional nenhum”, acusa ao PÚBLICO um dos advogados do ex-primeiro-ministro, Pedro Delille, para quem, independentemente de vir a ser deduzida acusação, “o que se passou até agora já é suficientemente grave” para justificar o processo contra o Estado português.

“Ainda hoje, o Ministério Público recusa mostrar-nos o processo de forma completa. A última peça do processo que nos foi permitido conhecer é de 6 de Junho, portanto, com dois meses de atraso. Isto apesar da decisão da Relação que diz que o processo deve ser todo mostrado”, acrescentou Delille, para advogar que o prolongamento da fase de inquérito, a partir do dia 19 de Outubro, visava aprofundar a investigação dos crimes que já estavam em investigação e não “coisas novas”, que, aliás, “infirmam as suspeitas que havia anteriormente”.

 

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