Serviços de Urgência – responsabilidade e coragem precisam-se!

O problema das urgências resolve-se quando houver coragem de ver estes serviços como dedicados a intervir em doentes críticos/urgentes.

O Serviço de Urgência (SU) é a porta de entrada do cidadão no Serviço Nacional de Saúde em Portugal, o que faz com que estes se confrontem com inúmeras questões e problemas.

A sobrelotação dos SU têm recebido atenção dos media, população e classe política nos últimos tempos. Apesar da implementação e muito bom funcionamento do sistema de Triagem de Manchester a sobrelotação e elevado tempo de espera para atendimento pós-triagem continuam a ser um problema para a segurança e qualidade de cuidados. Este problema tem múltiplos fatores que o agravam, dentro e fora do SU e do próprio hospital, que é importante resolver.

Apesar da recente tendência da diminuição do número de admissões nos SU em Portugal, o cidadão que hoje recorre aos Hospitais é mais dependente e tem maior necessidade de cuidados. A procura de cuidados deve-se ao positivo envelhecimento da população, que naturalmente vive mais tempo e com problemas de saúde mais complexos, combinados com um aumento das expectativas dos cidadãos.

A crise económica e a política de austeridade teve um forte impacto sobre o número de enfermeiros nos serviços e no acesso aos cuidados, limitando os níveis de recrutamento de pessoal, numa altura em que a os serviços de saúde enfrentam uma crescente procura de cuidados. O governo cortou na despesa em cuidados de saúde e consequentemente, na enfermagem. Além disso, a crise fez com que muitos enfermeiros portugueses fossem obrigados a procurar trabalho fora do país ou em outras profissões. Segundo dados da Ordem dos Enfermeiros de 2013 estima-se que estejam a emigrar entre 2000 a 2500 enfermeiros por ano.

Durante os últimos anos, um dos principais problemas que têm desafiado os gestores dos SU é encontrar uma metodologia para determinar os rácios adequados. As organizações profissionais, sindicatos, e legisladores têm vindo a debater o rácio profissional de saúde/doente, mas continuam a ser contabilizados de acordo com as realidades históricas. Geralmente esta discussão, como outras, é centrada apenas numa profissão e o número determinado por «Posto de Trabalho», adaptado ao conhecimento casuístico e fluxos de procura de cada SU, sendo claramente subjetiva quando percebemos a utilização dos recursos de enfermagem. Um cidadão pode não apresentar um elevado risco de vida, mas devido a outros fatores, por exemplo incontinência, confusão mental ou confinamento ao leito, apresentará uma dependência muito elevada. Ele exige cuidados de enfermagem significativos, apesar de poder não ser um doente crítico.

No atual contexto socioeconómico tem sido difícil um investimento no que diz respeito a tecnologias, estrutura física e recursos humanos, pelo que se torna evidente que a estratégia passará pela retenção e pela potenciação dos enfermeiros nos serviços tal como foi inscrito no memorando da troika e que o atual governo deixou cair no esquecimento. O problema das urgências resolve-se quando houver coragem de ver estes serviços como verdadeiros serviços de urgência, dedicados a intervir em doentes críticos/urgentes. Deverá haver um reforço/investimento da intervenção comunitária para que o cidadão que é triado com pulseira verde ou azul possa vir a ser devida e atempadamente observado em regime ambulatório saindo assim dos SU.

Claro que para tudo isto é preciso responsabilidade e coragem. A coragem política de investir onde é preciso sem centrar a discussão em questões populistas meras angariadoras de votos e a responsabilidade de pensar a saúde com todos os profissionais de saúde e com o cidadão.

Enfermeiro, candidato a Presidente do Conselho Directivo Regional Sul

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