“Se as instituições estão a fechar cursos, compreende-se que também não apresentem novos pedidos”

Entre 2011 e 2015, universidades e politécnicos encerraram mais de 2000 cursos. As consequências desse ajustamento ainda estão a fazer-se sentir, avalia o investigador Paulo Peixoto, coordenador do Observatório das Políticas de Educação e Formação do Centro de Estudos Sociais de Coimbra.

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Sérgio Azenha

O que pode explicar o decréscimo do número de novos cursos que as instituições de ensino superior pretendem abrir?
Há uma confluência de vários factores. A Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES) apareceu em 2009, numa altura em que o número de alunos no ensino superior aumentava de ano para ano. Depois houve uma fase de maior estagnação e, a partir de 2011, uma redução da procura. Em 2013, a tutela começou a adoptar uma regra que determinava que os cursos que, nos dois anos anteriores, não tivessem tido pelo menos dez alunos inscritos teriam que fechar. Entre 2013 e 2015 foram fechados compulsivamente 74 cursos no total. Não foram muitos porque as instituições decidiram ser elas a fechar os cursos com menor procura. Entre 2011 e 2015, a A3ES vetou a abertura de 344 novos cursos. Neste mesmo período, as instituições de ensino superior encerraram voluntariamente cerca de 2000 cursos. Não por acaso, este período corresponde também ao da maior crise da procura do ensino superior.

Podemos dizer que a auto-regulação funcionou no ensino superior?
A auto-regulação funcionou com um estímulo da tutela muito nítido. Foi dado um sinal governativo positivo, mas o número de cursos fechados compulsivamente (74) não é nada relevante quando comparado com os 2000 cursos que as instituições fecharam voluntariamente. As instituições quiseram contrariar a imagem negativa que podiam ter se tivessem cursos compulsivamente fechados pelo ministério. Este foi um fenómeno que aconteceu mais no ensino politécnico do que nas universidades e também mais no sector privado do que no público, porque foram as partes do sistema mais afectadas pela quebra da procura, ainda que esta também tivesse afectado as universidades. Neste contexto de retracção compreende-se que seja mais do que admissível que as instituições, se estão a fechar cursos, também não apresentem pedidos de novos cursos.

As instituições e a tutela têm visto os cursos técnicos superiores profissionais [formações de dois anos, ministradas exclusivamente nos politécnicos] como a principal via para aumentar o número de alunos inscritos no ensino superior. A aprovação destes cursos não passa pela A3ES, ao contrário do que acontece com licenciaturas, mestrados e doutoramentos. Parece-lhe que faz sentido que assim continue?
As formações curtas apareceram mais recentemente como uma espécie de ensino profissional ao nível superior. Se o nosso sistema continuar, como tem vindo a ser opção, a separar nitidamente o ensino politécnico do ensino universitário, acho que as instituições de ensino superior, designadamente os politécnicos, devem ter essa liberdade de criar cursos e de oferecer formações sem terem que passar por mecanismos de acreditação mais complexos. Faz sentido que os mecanismos de acreditação usados para os cursos técnicos superiores sejam diferentes dos usados para os cursos de licenciatura ou em mestrados porque são ciclos de formação diferentes. Uma licenciatura não pode ser revista todos os anos, enquanto os cursos técnicos superiores profissionais, por serem curtos, têm que se adaptar mais às lógicas do mercado e da procura.

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