RTP quer deixar de pagar pelos comentários de políticos

Televisão pública está a rever as regras e critérios sobre pagamentos de avenças, que ficarão estabelecidas no livro de estilo.

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Gonçalo Reis, presidente da RTP Miguel Manso

Tendencialmente, a RTP vai deixar de pagar aos políticos para serem comentadores nos seus diversos canais. A garantia foi dada esta quarta-feira no Parlamento pelo presidente da empresa, quando questionado pelo PSD sobre a existência na RTP de “avenças milionárias” para comentadores políticos.

Não houve referência directa, mas os contratos milionários a que o PSD se referia eram os do socialista Carlos César, que recebe seis mil euros mensais pela participação no programa "Três Pontos", da RTP Informação, assim como do presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira (quatro mil euros - que nunca chegou a receber) e o centrista Nuno Melo (dois mil euros – que também nunca recebeu porque não entregou recibos).

“Os contratos anteriores deviam ter a sua lógica”, admitiu Gonçalo Reis, explicando que à medida que os actuais contratos forem terminando – como é o caso do de Carlos César, que acaba no final deste mês –, a lógica que a empresa vai tentar implementar é de “os políticos, tendencialmente, não serem pagos”.

A televisão e a rádio públicas estão a rever as suas regras e critérios para o pagamento aos comentadores políticos, que ficarão definidas nos respectivos livros de estilo.

Gonçalo Reis, que está a ser ouvido na Comissão de Ética sobre as contas de 2014 e o plano de actividades de 2015, remeteu a estratégia editorial sobre comentário político para a Direcção de Informação, mas vincou que a administração considera que a equipa liderada há dois meses por Paulo Dentinho “tem conduzido muito bem” esta área, estando a definir e a implementar uma política de “debates plurais, abertos e confrontacionais”.

“A Direcção de Informação definiu que não deve haver políticos sozinhos em espaços de opinião, devem estar sempre em confronto, e enquadrados com outro tipo de comentadores, como especialistas e directores de jornais, por exemplo”, descreveu Gonçalo Reis.

Regresso à aposta na produção interna

Sobre a produção, o presidente contou que as direcções de conteúdo têm analisado nos últimos dois meses “centenas de projectos”. Tendo em conta que a administração definiu como orientação estratégica o reforço da produção interna, Gonçalo Reis diz que a sua equipa está a “corrigir as políticas anteriores de externalização da produção”.

“É contra natura, tendo em conta aquilo que são a tradição e as valências da RTP, externalizar a produção”, defendeu ainda, demonstrando uma posição oposta à filosofia que o próprio ministro Miguel Poiares Maduro defendeu para o serviço público. “A RTP tem os meios técnicos e humanos e a capacidade instalada. A produção, sobretudo de programas de fluxo como os da manhã e da tarde, deve ser internalizada. É uma forma de usar activos e mobilizar as nossas equipas e de darmos mais oportunidades de trabalho aos nossos profissionais”, argumentou Gonçalo Reis.

Para isso, está a renegociar diversos contratos com produtoras externas, alguns que vigoravam até final de 2016. Está decidido que já em Setembro o programa da manhã "Agora Nós" voltará a ser produzido pela RTP, no centro de produção do Porto e tornará a chamar-se "Praça da Alegria", exemplificou Gonçalo Reis. “Esta filosofia é compatível com a de trabalhar com produtores independentes para a ficção”, acrescentou.

Sobre a polémica compra dos direitos de transmissão da Liga dos Campeões, decidida ainda pela anterior administração, assim como sobre as despesas com outras grandes competições desportivas como os campeonatos europeu e mundial e os jogos da selecção, o presidente disse que está já decidido sub-licenciar direitos a outros operadores de forma a cobrir parte dos custos.

Questionado sobre salários, Gonçalo Reis defendeu que “são bastante aceitáveis. A média por trabalhador, tirando a administração e as direcções, é de 2300 euros brutos. Recebem o dobro da média nacional que é de 1100 euros.” E sobre as remunerações da administração, contestadas pela Comissão de Trabalhadores, o presidente argumentou que foram “definidos pelo Estado”, que terá tido em conta a estrutura hierárquica da empresa.

Esta administração tem estado a negociar com os sindicatos o novo acordo de empresa e o gestor garante que tem feito “propostas bastante conciliadoras, mais progressivas e generosas do que as que estavam em cima da mesa”. Referindo-se ao conflito que a anterior administração mantinha com os sindicatos depois de ter denunciado o acordo, Gonçalo Reis salientou que esta equipa “não faz ultimatos” e tem uma “atitude moderada”. Exemplificou com a proposta de estabelecer um suplemento de reforma em 6% do ordenado, por contraponto com a redução para zero da anterior administração. E disse também querer instituir um sistema de avaliação para substituir o princípio das progressões automáticas.

Gonçalo Reis afastou de vez qualquer fantasma de despedimento colectivo, reforçou que a administração conta com todos os trabalhadores e disse que a empresa até “tem gente a menos numa série de áreas”, como é o caso do online, onde será preciso recrutar pessoal como programados, webdesigners e gestores de redes sociais.

Empresa sustentável em 2015, garante presidente

A audição na Comissão de Ética destinava-se também a falar sobre as contas da empresa referentes a 2014. Gonçalo Reis contou que no ano passado a RTP teve custos operacionais de 212 milhões de euros – valor semelhante a 2013 – e um resultado operacional de 1,6 milhões de euros. Mas, avisou, apesar de ser positivo, a empresa não estava ainda numa situação de sustentabilidade financeira já que só de juros teve que pagar 3,9 milhões de euros.

“Estamos a trabalhar para atingir a sustentabilidade financeira já em 2015, ou seja, este ano os resultados operacionais deverão cobrir os encargos com a dívida e o financiamento”, assegurou Gonçalo Reis que considerou desnecessário apresentar um orçamento rectificativo e prometeu cumprir o orçamento que recebeu.

O presidente descreveu as alterações que a nova administração introduziu na empresa nestes quatro meses de mandato, incluindo a reorganização orgânica, a mudança de estratégia nos conteúdos com especial incidência no digital, o reforço das equipas de ficção e de apoio ao cinema, a venda de imóveis que não estão a ser usados, a renegociação da dívida bancária (há uma proposta de um consórcio de quatro bancos que está a ser analisada), a remodelação dos centros regionais dos Açores e da Madeira, a recuperação do arquivo, a análise do processo da TDT, e a operação internacional – que Gonçalo Reis jurou que não vai ser reduzida.

 

Notícia corrigida às 19h40: o gabinete de Rui Moreira afirma que o autarca nunca chegou a receber qualquer remuneração apesar de isso estar previsto no contrato.

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