Profissionais escrevem carta aberta a Paulo Macedo contra cortes na saúde

Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo impede realização de conferência de imprensa no interior da USF em Alvalade.

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Paulo Macedo Daniel Rocha

O bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, lançou nesta quarta-feira, em Lisboa, um apelo aos portugueses na defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS), para que “não permitam que a qualidade do serviço público prestado às populações seja posta em causa”, e criticou a “atitude salazarenta” daqueles que “impedem que a comunicação social tenha acesso às instituições de saúde”.

As críticas de José Manuel Silva visavam directamente a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), que, nesta quarta-feira, impediu que a conferência de imprensa promovida pela Associação Nacional de Unidades de Saúde Familiar (USF) e pela Ordem dos Médicos e Ordem dos Enfermeiros fosse realizada no interior das instalações da USF do Parque, no antigo Hospital Júlio de Matos.

A conferência de imprensa, destinada a divulgar o teor da carta aberta que as três instituições entregaram terça-feira ao ministro da Saúde e na qual afirmam que “a vida, a saúde e os cidadãos exigem mais e melhores cuidados de saúde primários (CSP)”, foi autorizada quer pelo coordenador da associação das USF, Luís Rebelo, e pela directora executiva do Agrupamento de Centros de Saúde, Manuela Peleteiro, mas viria a ser desautorizada pelo vice-presidente da ARSLVT, Luís Pisco.

Na carta aberta dirigida a Paulo Macedo, onde se afirma que “o valor das USF está demonstrado através dos resultados nas áreas do acesso, da continuidade, do desempenho, da qualidade e da eficiência”, as três instituições apelam aos profissionais de saúde, aos cidadãos e às suas organizações para que “não deixem a reforma [dos cuidados de saúde primários] ser capturada pelas administrações, contribuindo para a convergência, o envolvimento, a mobilização de todos eles, indispensável ao relançamento do processo de transformação e de desenvolvimento organizacional dos cuidados de saude primários”.

As três entidades consideram “fundamental para a sociedade portuguesa que exista, desde já, um forte investimento nas unidades de saúde familiar e nos cuidados de saúde primários para que se tenha um Serviço Nacional de Saúde (SNS) de proximidade e de qualidade”. Na carta, sublinham ainda que a “reconfiguração dos CSP em Portugal abriu um processo de crescimento, maturação e inovação no funcionamento dos cuidados de saúde, no sentido da flexibilização organizativa e de gestão, da desburocratização, do trabalho em equipa, da autonomia, da responsabilização, da melhoria contínua da qualidade, da contratualização, da avaliação (interna e externa) e da sustentabilidade, tendo as USF sido as impulsionadoras da mudança”.

Afirmando que as “USF fazem mais e melhor com menos custos na prescrição de terapêutica e de meios auxiliares de diagnóstico”, Bernardo Vilas Boas, presidente Associação Nacional das Unidades de Saúde Familiar, lembrou que o Memorando de Entendimento da troika “contém explicitamente orientações para reforçar e desenvolver os cuidados de saúde primários, em especial as USF modelo B”.

Contra os cortes na saúde, os signatários da carta aberta desafiam o Ministério da Saúde e a Assembleia da República “a adoptarem iniciativas e medidas que permitam combinar vontade política e capacidade operacional para haver mais CSP, mais enfermeiros e médicos nos cuidados de saúde primários em Portugal e para que seja atribuída uma equipa de saúde familiar a todos os cidadãos e famílias”. Nesse sentido, consideram necessário criar condições para “promover o investimento e a alocação de recursos financeiros e humanos na área dos CSP, de forma estratégica e sustentada, por serem ainda mais eficientes e úteis para a população”.

Na conferência de imprensa, realizada no exterior da USF do Parque debaixo de um frio imenso, ouviram-se muitas críticas à Administração Regional de Saúde (ARS) do Norte, que, contra a orientação do próprio ministro, “está a travar que cuidados de saúde primários (modelo A) passem a USF modelo B, apesar de terem pareceres técnicos da equipa regional. O bastonário da Ordem dos Enfermeiros, Germano Couto, referiu expressamente que “o vogal da ARS-Norte, Rui Cernadas, tem vindo a ameaçar de despedimento enfermeiros e outros profissionais de saúde com mais de 10 anos de contrato a termo”.

 

A Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSVT) justificou a não autorização da realização da conferência de imprensa nas instalações da USF do Parque, em Alvalade, promovida pela Associação Nacional das USF, Ordem dos Médicos e Ordem dos Enfermeiros, para não comprometer o funcionamento normal da unidade.

Para além deste argumento, a assessora de imprensa da ARSLVT disse ao PÚBLICO que a admnistração regional de saúde entendeu não fazer sentido disponibilizar as instalações daquela unidade quando a Ordem dos Médicos e a Ordem dos Enfermeiros dipõem de instalações próprias onde podem realizar este tipo de iniciativas.

Em Portugal, existem 356 USF, onde trabalham 6.902 profissionais de saúde, dos quais 2.458 são enfermeiros, 2.482 médicos de família e 1.962 secretários clínicos, abrangendo 4.393.567 portugueses. No entanto, para a população abrangida, deveriam estar alocados 2.835 enfermeiros.
E qual é a diferença entre as USF modelo A e modelo B? As primeiras têm um tipo de organização menos exigente e o sistema de remuneração não beneficia de incentivos, sendo igual ao das unidades tradiconais dos centros de saúde.  As USF modelo B são unidades mais exigentes, quer do ponto de vista da organização, quer em relação às metas que são fixadas. Têm direito a incentivos que são contratulizados com as administrações regionais de saúde, mas para usufruírem desses incentivos têm de apresentar ganhos demonstrados a nível de acessibilidade aos seus utentes, ganhos de qualidade e também ganhos de desempenho económico.

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