Probabilidade de morrer com diabetes é maior no interior do país

Condições socioeconómicas são cada vez mais determinantes para a diabetes tipo 2. Portugal é o terceiro país, num total de 33, com maior prevalência da doença.

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Com a baixa do preço dos medicamentos, começou a haver problemas de rupturas de stocks Miguel Silva/Arquivo

Ao mesmo tempo que o número de novos casos de diabetes não pára de crescer no país, estão também a aumentar as assimetrias geográficas relacionadas com esta doença, com uma mortalidade bastante superior nas zonas do interior, indicam os dados preliminares de um estudo da especialista em geografia da saúde e planeamento urbano sustentável Paula Santana.

 

O mesmo trabalho aponta também para que na diabetes tipo 2 as condições socioeconómicas sejam cada vez mais determinantes.

As primeiras conclusões do estudo mostram que a mortalidade por diabetes em Portugal apresenta grandes assimetrias entre o litoral e o interior. Contudo, ao longo das últimas décadas registaram-se algumas alterações: de 1989 a 1993 a mortalidade associada a esta patologia foi maior no litoral; mas desde 2006 até 2010 houve uma inversão e agora a mortalidade é claramente maior nas zonas do Alentejo e Beira Interior Sul.

Em declarações ao PÚBLICO, a investigadora adianta que entre as explicações para esta assimetria pode estar o envelhecimento da população e a ruralidade, já que as pessoas vêem o acesso a cuidados de saúde primários e a uma alimentação de qualidade dificultados também pelos problemas económicos. E fala, por isso, num “problema transversal” que, para ser ultrapassado, precisaria de vários sectores e profissionais multidisciplinares, bem como de políticas públicas de maior proximidade, pelo que o estudo continuará a ser desenvolvido com profissionais de várias áreas.

O estudo será apresentado nesta terça-feira em Lisboa numa conferência sobre o tema “As Geografias da Diabetes: As Desigualdades Sociais e o Risco de Morte por Diabetes”, integrada no ciclo de conferências Diabetes Século XXI: O Desafio, organizado pela Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal. Paula Santana entende que perante a prevalência da diabetes no país e o grande crescimento da incidência é cada vez mais importante compreender a doença também pelo seu lado social e geográfico.

Prevalência da doença
Dados de 2010 da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) indicam que 12% da população, ou seja, mais de 990 mil indivíduos, tenha diabetes. Aponta-se também para uma prevalência de pré-diabetes de 26%, o que quer dizer que quase 40% da população é pré-diabética ou está diabética. Os mesmos dados divulgados em Abril indicam que Portugal é o terceiro país, num total de 33, com maior prevalência da diabetes.

Isto quando nesse mesmo ano em ambulatório, só em medicamentos, foram gastos 180 milhões de euros, o que correspondeu a 7,8% de toda a despesa nesta área, valor a que acrescem outros custos relacionados com as complicações da doença, como o absentismo. Ao todo, só em 2010 morreram em Portugal quase cinco mil pessoas devido a esta doença, segundo dados do Observatório Nacional da Diabetes.

O trabalho de Paula Santana estima que o risco de morrer por diabetes entre 2006 e 2010 foi mais elevado no Alentejo, Beira Interior Sul, Oeste, Médio Tejo e Lezíria, estando essa diferença precisamente associada a áreas de maior envelhecimento populacional, ruralidade e, potencialmente, com menor acesso aos cuidados de saúde. Além disso, nos últimos 20 anos mais de 72% dos municípios do continente pioraram os valores de mortalidade associados a esta doença, tendo em consideração dados padronizados pela idade.

A investigação descreve que no caso da diabetes a vulnerabilidade das condições sociais e económicas da área de residência são factores preponderantes, o que é ainda mais verdade no caso da diabetes tipo 2, que chegou a ser conhecida como não insulinodependente e que ao contrário da diabetes tipo 1 não é de origem apenas genética.

Os novos casos estão cada vez mais associados a grupos desfavorecidos, sendo que a prevalência é maior em pessoas com privações materiais, com baixa escolaridade, desemprego, condições de habitação precárias e com estilos de vida pouco saudáveis ou dificuldades de acesso a cuidados de saúde. Excesso de peso e obesidade, dietas muito calóricas, inactividade física e consumo de tabaco são outros factores a destacar. “As condições de sedentarismo, excesso de peso e obesidade e consumo de alimentos desadequados genericamente no país estão a contribuir para o aumento de casos”, reforça Paula Santana, insistindo que “a privação sociomaterial também tem muita influência”.

As previsões mais recentes da União Europeia também indicam que Portugal corre o risco de assistir nos próximos anos a uma explosão de casos de diabetes do tipo 2, devido à cada vez maior prevalência de obesidade infantil. Se os piores cenários se confirmarem, Portugal daqui a 13 anos pode ocupar um quarto ou quinto lugar da lista dos países com mais casos de diabetes deste tipo.

Também este ano o secretário de Estado adjunto e da Saúde, Fernando Leal da Costa, já se mostrou preocupado com a incidência “alarmante” de diabetes em Portugal e apontou para a necessidade de se aumentar o esforço para levar os portugueses a comer melhor e a praticar exercício.
 
 
 

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