Portugal "encolheu" 60 mil pessoas em 2013

Aumento da emigração e da esperança de vida e diminuição dos nascimentos deixaram o país ainda mais envelhecido. Há agora 136 idosos por cada 100 jovens.

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Entre 2003 e 2013, o índice de envelhecimento passou de 106 para 136 idosos por cada 100 jovens Daniel Rocha

Nada surpreendentes, os números com que o Instituto Nacional de Estatística (INE) compõe o retrato da população portuguesa em 2013 confirmam “a crise demográfica grave” que o país atravessa. Entre mortos e emigrantes permanentes, o país perdeu 60 mil residentes. “São números que confirmam as piores expectativas”, interpreta o investigador João Peixoto, do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG).

Se estas tendências se mantiverem ou agravarem em 2014, “seria catastrófico, porque é a sustentabilidade futura do país que está ameaçada”, adianta o mesmo investigador, para quem, tanto como a economia recessiva, “é o ambiente de pessimismo nacional o grande impulsionar do ciclo vicioso em que o país mergulhou e que se resume de forma simples: se as expectativas são más, as pessoas não investem, não consomem, não têm filhos, vão-se embora e os imigrantes não entram ou vão-se embora também”.

As estimativas divulgadas nesta segunda-feira pelo INE apontam para a existência de 10.427.301 pessoas a residir em Portugal, no final de 2013. São menos 59.988 do que a população estimada para 2012. A tendência de decréscimo populacional vem já de 2010, tendo atingido no período em análise um valor de -0,57%. Em termos regionais, o Norte, que possui 3,64 milhões de habitantes, foi a região que mais habitantes perdeu: 22.039 pessoas, ou seja, quase 37% das perdas totais. No mesmo período, a região de Lisboa, onde residem cerca de 2,8 milhões de pessoas, perdeu 10.863 habitantes.

Para este decréscimo populacional global concorreu um saldo natural negativo (menos 23.756 pessoas), agravado exclusivamente pela diminuição dos nascimentos. É que as mortes até diminuíram em 2013 (registaram-se 106.543 óbitos em 2013, quando em 2012 esse valor fora de 107.598). O problema aqui é que o número de nados-vivos diminuiu ainda mais: 82.787 bebés em 2013, menos 7,9% do que os 89.841 nascimentos de 2012.

Temos por isso uma redução do número médio de filhos por mulher em idade fértil para um novo mínimo: 1,21. Se recuarmos uma década até 2003, cada mulher tinha em média 1,44 filhos. Descontadas variações regionais (e estas mostram-nos que os Açores continuam a ser a região onde nascem mais bebés, com o município de Ribeira Grande a apresentar uma taxa de 7,9 nascimentos por mil habitantes, e, no lado oposto da moeda, Torre de Moncorvo regista apenas 2,5 nascimentos por mil habitantes), o problema está diagnosticado há muito. Aliás, em Fevereiro, o PSD incumbiu uma comissão presidida pelo professor da Universidade Católica Joaquim Azevedo de apresentar propostas capazes de promover a natalidade em Portugal. Em cima da mesa poderão estar medidas que vão da flexibilização dos horários das creches, e redução dos respectivos preços, à promoção do trabalho em part-time, mas estas só deverão ser formalmente apresentadas no início de Julho, segundo adiantou ontem ao PÚBLICO o presidente daquele grupo de trabalho.

Enquanto isso, a população portuguesa continua a envelhecer também por via do aumento da esperança média de vida à nascença. No caso das mulheres, a meta aumentou para os 82,79 anos. Já entre os homens, esse valor fixou-se nos 76,91 anos. Tudo conjugado, o índice de envelhecimento passou para 136 idosos (mais de 65 anos de idade) por cada 100 jovens (menos de 15 anos).

O segundo factor que ajuda a explicar a perda de população é o saldo migratório que foi negativo em 36.232 pessoas, resultado da diferença entre os 53.786 emigrantes permanentes (por mais de um ano) e os 17.554 imigrantes. Mas, segundo adiantou ao PÚBLICO o investigador José Carlos Marques, do Centro de Estudos de Sociologia da Universidade Nova de Lisboa, “haverá mais emigrantes permanentes do que os estimados, até por causa dos que saem de forma temporária e acabam por ficar por mais de um ano”.

O próprio INE sublinha que o número de emigrantes é muito superior aos referidos 53.786 permanentes, porque a estes têm que se somar os 74.322 portugueses que saíram do país em 2013 com a expectativa de regressarem em menos de um ano. “Alguns não voltarão antes de decorrido esse prazo”, segundo José Carlos Marques. Por outro lado, na conta dos 17.544 imigrantes conjugam-se “alguns imigrantes que entram pelo reagrupamento familiar”, ainda segundo José Carlos Marques, mas também “os estudantes que vêm fazer pós-graduações nas universidades portuguesas por períodos superiores a três meses”, segundo o geógrafo Jorge Malheiros.

A estes somar-se-ão, embora residualmente, os estrangeiros que obtiveram autorizações de residência no âmbito dos vistos gold, os quais “embora polémicos, obedecem a um princípio generoso de abertura do país ao estrangeiro que parece louvável”, na óptica de João Peixoto. Para o investigador, o Governo tem dado tímidos sinais de estar preocupado com o desequilíbrio migratório. “A transformação do antigo ACIDI [Alto-Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural] em Alto-Comissariado para as Migrações, é um sinal positivo que aponta para a integração das diferentes políticas”, conclui. 

Notícia actualizada às 18h10 com comentários de especialistas

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