ONU teme que desinvestimento público faça Portugal regredir no Índice de Desenvolvimento Humano

Portugal mantém o 41.º lugar entre 187 países. Relatório alerta para riscos do desinvestimento em sectores como a saúde e educação. Ao todo, ainda há 2,2 mil milhões de pessoas em situação de pobreza.

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A DGS diz que são necessárias “medidas criteriosas mais eficazes” Foto: Rui Gaudêncio

Portugal é o 41.º país do mundo com melhor Índice de Desenvolvimento Humano, de acordo com um relatório agora publicado pela Organização das Nações Unidas (ONU). O país conseguiu, assim, manter em 2013 a mesma posição que tinha no ano anterior na lista de 187 países avaliados e subiu três lugares desde 2008. No índice, que varia entre zero e um, o país conseguiu um total de 0,822 pontos – mas a ONU destaca que Portugal tem vindo a cortar no investimento público, nomeadamente nos serviços de saúde e de educação, o que pode fazer com que muitos dos ganhos sejam revertidos.

O Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas avalia 187 países e, para classificar os progressos, tem em consideração vários factores, como o rendimento dos cidadãos e indicadores relacionados com o acesso à saúde e à educação nos países. O ranking divide os participantes entre países de desenvolvimento “muito elevado”, nos quais se insere Portugal, existindo ainda mais três níveis: “elevado”, “médio” e “baixo”.

No total, na edição agora publicada, relativa a 2013 e intitulada Sustaining Human Progress: Reducing Vulnerabilities and Building Resilience, 38 dos 187 países conseguiram melhorar a sua classificação, 114 mantiveram-na e 35 perderam lugares. A lista é encabeçada pela Noruega, com uma classificação de 0,944, seguida pela Austrália, Suíça, Holanda, Estados Unidos, Alemanha, Nova Zelândia, Canadá, Singapura e Dinamarca. À frente de Portugal surgem ainda países como a Irlanda (11.º), Israel (19.º), Itália (26.º), Espanha (27.º) ou Grécia (29.º). Na cauda da lista surge o Níger, com um índice de apenas 0,341, precedido por países como Congo, República Centro-Africana, Chade, Serra Leoa, Eritreia, Burkina Faso, Burundi, Guiné-Conacri e Moçambique.

Portugal está entre os Estados que conseguiram manter a sua classificação e surge numa situação de empate com o Chile. Contudo, no relatório a ONU tece algumas notas sobre a queda do investimento público em vários países, nos quais inclui Portugal. Para a ONU, apesar de alguns sinais de retoma económica, a queda de 40% deste tipo de investimento no país é motivo de preocupação. “Os cortes orçamentais também estão a afectar a oferta de serviços públicos. Entre 2009 e 2011 a despesa em saúde caiu num terço dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) – incluindo na Grécia, Irlanda, Portugal e Reino Unido”, lê-se no documento.

Ainda sobre este ponto, a ONU alerta que os cortes estão a levar a uma transferência de parte das despesas para os cidadãos e que é momento de tentar pensar em formas de apostar num “crescimento inclusivo e sustentável a longo prazo”. “A austeridade cria um ciclo vicioso”, defende o relatório, no qual as Nações Unidas alertam que os cortes acabam por aumentar de forma contraproducente a despesa com prestações sociais e por gerar iniquidades, que também são “um obstáculo ao crescimento sustentável e aumentam o risco de crises económicas e financeiras”.

A classificação portuguesa é influenciada positivamente por indicadores como a esperança média de vida à nascença, que se situou nos 79,9 anos, mas também pela mortalidade infantil, vacinação ou taxas de literacia. A média de anos de estudo no país ficou-se nos 8,2 anos, sendo que se prevê que as crianças que estão agora em idade escolar venham a ter um percurso de 16,3 anos. Do lado negativo estão alguns indicadores como a taxa de desemprego e outros dados relacionados com problemas laborais, assim como as quedas nos investimentos públicos em sectores como a saúde e educação.

Metade das pessoas com trabalhos precários ou informais
No resumo geral do relatório, a ONU reconhece que o desempenho global dos países é positivo. Mas o trabalho considera que o caminho ainda está muito dependente de factores externos como as crises e os desastres naturais, com uma vulnerabilidade ao risco que precisa de ser melhorada, assim como o acesso a serviços sociais básicos em áreas como a saúde, educação e protecção social, nas quais se incluem apoios como as pensões ou o subsídio de desemprego.

Ao todo, 2,2 mil milhões de pessoas ainda vivem em situação daquilo a que ONU chamada de “pobreza multidimensional” ou de risco de pobreza. E as protecções sociais não são suficientes para 80% da população mundial. A fome continua a ser um problema para 12% da população mundial, o que corresponde a mais de 840 milhões de pessoas. No campo do emprego, a precariedade e os trabalhos informais são uma realidade para metade das pessoas, ou seja, para 1,5 mil milhões de cidadãos.

As Nações Unidas constatam que existiu também um abrandamento no índice global, que melhorou apenas de 0,700 em 2012 para 0,702 em 2013. Além disso, mais de 15% das pessoas continuam vulneráveis a várias formas de pobreza, destacando o relatório os problemas de iniquidade e de violência que persistem na América Latina e o sul da Ásia por ter mais de 800 milhões de pessoas em situação de pobreza e 270 milhões em risco de passarem a estar – o que representa 71% da população daquela zona do globo. Sobre África é deixado o alerta para o impacto que os conflitos podem ter no desenvolvimento, estimando-se ainda que em todo o mundo, em 2013, mais de 45 milhões de pessoas tenham sido forçadas a deixar as suas casas devido a conflitos.

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