Portugal e Bolonha

Bolonha não obrigou nenhum país a usar determinados nomes. Cada um deu-lhes os que entendeu.

“Tal como aconteceu com o Processo de Bolonha, que encurtou muitas licenciaturas”, lê-se na legenda da figura, no escrito de Samuel Silva sobre os cursos mais curtos (PÚBLICO de 8 de Fevereiro de 2014). No texto lê-se: “O Processo de Bolonha já tinha feito o mesmo com as licenciaturas – que passaram de cinco para três anos”. Essa ideia, que foi muito apregoada, não é exacta.

Terei de voltar atrás uns vinte anos. Depois de ter conversado com diversas entidades sobre o que considerei um grave erro da legislação de 1980 – que introduziu os mestrados – sem conseguir qualquer resultado, expus em 1994, no PÚBLICO (2 de Julho), as linhas gerais do que considerava necessário para a correcção. Entendia que todo o ensino superior devia ser padronizado em três níveis:

Bacharel (3 anos); licenciado (5 anos de cadeiras+1 ano para tese de licenciatura); doutoramento (após a licenciatura, normalmente dois anos, ou o que fosse necessário). Os mestrados seriam extintos, terminando apenas os que estivessem em curso.

No ano seguinte, 1995, a propósito da criação da Escola Superior Agrária de Elvas, publiquei no “Linhas de Elvas” (5 de Maio) uma pormenorização do sistema que propunha. Como, na União Europeia, as discrepâncias eram grandes, sugeri que Portugal propusesse uma padronização de níveis semelhante. (Se a sugestão tivesse tido eco, a Declaração teria sido de Coimbra, de Évora ou de qualquer outra das nossas cidades universitárias).

Em 1999, a Declaração de Bolonha – que Portugal assinou – veio dizer, com muito mais pormenores, quase exactamente o que eu tinha proposto cinco anos antes.

A diferença é que eu propunha 3+3+2 anos de escolaridade e Bolonha propõe 3+2+2. Não considero tão bom, mas aceito.

Bolonha não obrigou nenhum país a usar determinados nomes. Cada um deu-lhes os que entendeu. Eu tinha proposto o desaparecimento dos mestrados. O nome de mestre não tem tradição no ensino superior português. Na nossa língua, mestre é o supra-sumo dos doutores, ou o mestre carpinteiro, o mestre sapateiro, etc. Nos ofícios, desde a Idade Média, havia o aprendiz, o oficial e o mestre. Temos ainda a antiga figura simpática do mestre-escola.

Bacharel, licenciado e doutor era o que havia em Portugal antes de 1980 e entendi que devia ser retomado. É usado em muitos países do mundo, como na Inglaterra e Estados Unidos.

Não é, portanto, verdade, dizer-se que “o Processo de Bolonha encurtou muitas licenciaturas”. Quem decidiu chamar ao primeiro ciclo “licenciatura” foi quem em Portugal mandou nessa matéria. Mas não pode esquecer-se que a licenciatura pós-Bolonha não é comparável com as antigas e é internacionalmente considerada um bacharelato. É a quem tem um “bachelor” que se manda fazer um “master”.

Investigador coordenador e professor catedrático, jubilado

 

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