Pais “perplexos” com cortes de mais 700 milhões na Educação

Dirigentes das escolas e sindicatos não conseguem entender onde pode ser feita a poupança prevista na proposta de Orçamento do Estado. Reitores ficaram aliviados por não ser pior.

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Carlos Lopes/Arquivo

“Perplexos” e “estupefactos”. Os pais e encarregados de educação foram apanhados de surpresa com a redução nas despesas com o Ensino Básico e Secundário em mais 700 milhões de euros, prevista na proposta de Orçamento do Estado (OE) entregue esta quarta-feira na Assembleia da República. Pais, dirigentes escolares e sindicatos têm também dificuldade em perceber onde e como pode ser conseguida a poupança estimada pelo Governo no documento.

A despesa total do Ensino Básico e Secundário e da Administração Escolar inscrita no OE para o próximo ano atinge os 5,5 milhões de euros. Este valor corresponde a um decréscimo de 11,3% face à estimativa de despesas deste ano, ou seja, são menos 704,4 milhões de euros destinados à Educação. “Não consigo perceber de onde virá esse dinheiro”, afirma o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), Jorge Ascensão, lembrando os cortes acumulados no sector ao longo dos últimos anos – nos três anos de vigência do memorando de entendimento, o sector tinha tido o triplo da dose de austeridade prevista, com uma redução de 1100 milhões de euros nas transferências do Estado.

Os pais representados pela Confap estão, por isso, “perplexos” com o que é proposto pelo Governo, conta Ascensão. “Estamos estupefactos”, acrescenta Isabel Gregório da Confederação Nacional Independente de Associações de Pais e Encarregados de Educação (Cnipe). “Com uma proposta destas, o Governo demonstra, cada vez mais, que não quer saber do futuro do país”, acusa.

Entre os dirigentes escolares também há surpresa com o nível da redução da despesa em Educação prevista no OE. “Já nos tinham cortado no músculo, agora estão a chegar ao osso”, ilustra Filinto Lima, da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). O mesmo dirigente destaca ainda o facto de o esforço previsto no documento ser maior do lado da escola pública do que dos privados – A redução nas transferências para os colégios é de 1,1%, ao passo que o corte transversal em todo o sector ultrapassa os 11%. “De há uns anos a esta parte, é sempre sobre nós”, sublinha.

O dirigente da ANDAEP diz igualmente não conseguir antecipar onde podem estar estas as despesas em que o Governo esperar cortar os 700 milhões de euros, esperando apenas que seja possível fazer com que os alunos sofram “o menos possível” com estas medidas. “É sempre possível poupar em Educação, até fechar a última escola no país”, responde, com ironia, o líder da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, Manuel Pereira. Um corte desta magnitude vai, porém, “atirar o sistema de educação português para o nível do terceiro mundo”, avisa.

Também o secretário-geral da Federação Nacional de Educação, João Dias da Silva, se mostrou surpreendido com o OE. Em declarações à agência Lusa, aquele responsável diz igualmente que está “por entender de que forma, e em que áreas, vai ser distribuído” o corte de despesa no sector. Estes são cortes “muito negativos”, que vão ter “reflexos nos recursos humanos dos estabelecimentos escolares, que já são escassos”, diz Dias da Silva.

Superior entre o alívio e a preocupação
O presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (Snesup), António Vicente, também não encontra “onde cortar mais” no sector, apesar de o OE prever uma nova redução de 1,5% (26,3 milhões de euros) nas despesas com as universidades e politécnicos. “A única solução é despedir mais docentes e investigadores, pondo em causa a qualidade do ensino e investigação”, sustenta o dirigente, para quem essa opção “fragilizaria ainda mais” o sistema de ensino superior.

Apesar de uma nova diminuição no investimento público no sector, os reitores receberam a proposta de OE com algum alívio, uma vez que não se confirmam as cativações sobre as suas receitas próprias, como chegou a ser aventado, nem existem outras medidas com impacto no sector além das já negociadas com a tutela. “Não gostamos de nos confrontar com o corte, mas é aquele que foi anunciado em Agosto e aparentemente não temos mais surpresas”, confirma o novo presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), António Cunha.

As dotações para as universidades inscritas no documento não prevêem os ajustes necessários a acomodar o impacto da última decisão do Tribunal Constitucional relativamente aos vencimentos dos funcionários públicos, mas o CRUP recebeu, entretanto, do secretário de Estado do Ensino Superior o reforço da garantia – já dada no Verão – de que essa correcção será feita na versão final do OE. Já o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos não quer, de momento, pronunciar-se sobre o OE proposto.

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