Pais de alunos do ensino artístico especializado acusam MEC de discriminação

A denúncia é feita numa petição pública que visa obrigar o Parlamento a discutir as regras de acesso ao ensino superior, que foram alteradas em 2012 e terão aplicação plena em 2015.

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Público (arquivo)

Os pais e encarregados de Educação dos alunos dos cursos de Artes Visuais e dos Audiovisuais do Ensino Artístico Especializado (EAE) acusam o Ministério da Educação e Ciência (MEC) de ter produzido legislação que discrimina aqueles estudantes no acesso ao ensino superior e lançaram uma petição para que o assunto seja debatido na Assembleia da República. “Esta lei é espécie de vingança cujos efeitos recaem sobre terceiros, uma coisa absurda”, apoia José António Fundo, subdirector da Escola Artística Soares dos Reis, do Porto.

Para José Fundo, a questão é simples – “É verdade que durante anos os alunos das escolas do EAE foram beneficiados em relação aos dos cursos científico-humanísticos no que respeita às regras de ingresso. Este Governo, em vez de criar condições de igualdade entre uns e outros, resolveu vingar-se das gerações anteriores nos estudantes actuais, o que é absurdo e mesmo escandaloso”, afirma. Rui Naldinho, dirigente da Associação de Pais da Soares dos Reis, diz que a discriminação só pode ser explicada “por razões economicistas, através da criação de dificuldades aos alunos de escolas que obrigam a um investimento do Estado mais relevante, e ideológicas, por parte de um Governo que desvaloriza as Artes”.

Em causa está legislação cuja aplicação integral já foi adiada duas vezes pelo mesmo MEC que a criou, em 2012. Até àquele ano, a classificação final dos cursos do ensino artístico especializado era calculada com base na média das notas obtidas nas disciplinas e do resultado da Prova de Aptidão Artística, que contavam, respectivamente, 80% e 20% para o resultado final. E para efeitos de acesso ao ensino superior, os estudantes apenas tinham de realizar os exames nacionais exigidos pela instituição que pretendiam frequentar.

Aquelas regras foram, no entanto, alteradas em Agosto de 2012 pela ex-secretária de Estado Isabel Leite. Esta determinou que no cálculo da média de candidatura destes alunos passariam a entrar as notas de dois exames, de Português e Filosofia; que estas de ser iguais ou superiores 9,5 valores e que teriam um peso de 30 por cento sobre toda a média do secundário. Para além disso, a classificação relativa às componentes específicas do ensino artístico especializado deixaria de ser contabilizada no acesso ao superior.

Foi naquela altura que se iniciou a primeira batalha, protagonizada pelos directores das escolas artísticas Soares dos Reis (Porto) e António Arroio (Lisboa), bem como por pais e alunos dos dois estabelecimentos de ensino. Estes acusaram o Ministério da Educação e Ciência de estar a discriminar os estudantes de AEE em relação aos alunos dos cursos científico-humanísticos.

Os argumentos, diversos, foram os mesmos que agora constam da petição. No regime científico- humanístico é exigido que os alunos obtenham 95 pontos na média entre as classificações externa e interna e não no exame (o que significa, usando um exemplo extremo, que um estudante do chamado ensino regular poderá ter 18 a Português no fim do secundário e 4 no exame nacional). Além disso, alegam, naquele regime as classificações dos (quatro) exames têm um peso de 30% que incide na classificação interna da respectiva disciplina e não sobre toda a média do secundário. Por fim, apesar de terem de fazer quatro exames no curso, no 11º ano é dada a opção entre diversas disciplinas.

Normas transitórias acabam este ano
Acusado, também, de ter mudado as regras a meio do jogo, em Dezembro de 2012 o Governo recuou, mas não tanto como exigiam os contestatários. Para o cálculo da média de ingresso no ensino superior voltaram a ser tidos em conta os resultados obtidos na Prova de Aptidão Artística e na Formação em Contexto de Trabalho e ficou definido que, em 2013, os alunos que estavam a concluir o 12.º ano só seriam obrigados a realizar o exame nacional de Português (para além das provas de ingresso às faculdades a que se candidatassem). Estas normas transitórias foram estendidas, recentemente, a 2014/2015, mas não estarão em vigor no próximo ano, quando estiver em causa o ingresso de alunos que entraram no secundário depois da aprovação da nova legislação.

Não são, contudo, as normas transitórias que preocupam os encarregados de educação, que exigem, sim, condições de igualdade em relação aos restantes alunos, nomeadamente de artes visuais dos cursos científico-humanísticos. No texto da petição reclamam os alunos possam realizar exame a outra disciplina, que não Filosofia, e que as classificações dos exames façam média ponderada com a classificação interna final da disciplina a que se reportam com um peso de 30%. Também desejam que não exista nota mínima nos exames.

José António Fundo, da Soares dos Reis, assegura que se não for assim “continuarão a sair do país dos estudantes que em Portugal se vêm discriminados no acesso ao Ensino Superior, mas que no Reino Unido são admitidos nas mais prestigiadas instituições daquele nível de ensino apenas com base nos respectivos portfólios”. 

No total, serão cerca 600 os alunos que frequentam o 12º ano cursos de artes visuais e de audiovisuais do EAE. Mas o objectivo, diz José António Fundo, é que a alteração abranja também os estudantes dos cursos de Música, Dança e Teatro, em que o ingresso se faz com as mesmas regras mas não com as mesmas consequências. Isto, explica, porque “naqueles casos não existe a concorrência dos cursos científico-humanísticos, já que nas instituições de Ensino Superior daquelas áreas há a tradição de prestação de provas práticas de aptidão”.

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