Organização feminista quer prevenir e criminalizar assédio sexual

O assédio sexual é punido pelo Código do Trabalho, mas a UMAR volta a defender que deve ser crime e reclama ainda códigos deontológicos nas empresas. A organização vai recolher assinaturas para apresentar proposta no Parlamento.

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As mulheres assassinadas pelo suspeito eram todas prostitutas Foto: Marco Maurício/arquivo

A União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) não desiste. Quer lançar uma “iniciativa legislativa cidadã” pela criminalização do assédio sexual, porque o recente projecto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda (BE) no Parlamento fica “bastante aquém” do que pretende, explica Claudia Múrias, da organização. Para que o projecto venha a ser votado na Assembleia da República, será necessário recolher um mínimo de 35 mil assinaturas.

A UMAR já tinha defendido a criminalização do assédio sexual no passado, mas têm sido várias as vozes a opor-se, lembrando que, apesar de este crime  não estar tipificado como tal no Código Penal, alguns dos actos que o integram, como as ameaças e a coacção, já são criminalizados, e está também previsto no Código do Trabalho.

A proposta da organização feminista foi, aliás, apresentada formalmente em Abril de 2014 aos deputados da subcomissão de Igualdade, no Parlamento. "Criminalizar por criminalizar não chega. É importante que a legislação portuguesa dê uma mensagem de que há comportamentos que não são aceitáveis, mas não é a criminalização que resolve. São precisas medidas de educação e protecção das vítimas", explicou, na altura, a presidente Maria José Magalhães.

A UMAR pretende ir para além da criminalização, obrigando as empresas a elaborarem um código deontológico de boas práticas em matéria de assédio sexual, que permita “a detenção do autor dos factos em flagrante delito” e a inversão “do ónus da prova" - ao contrário do que a lei estipula actualmente e que implica que seja a vítima a fazer prova.

O que é que deve ser punido, segundo a UMAR?  “Qualquer tipo de comportamento que humilhe as pessoas. Com carácter sexual, falamos, por exemplo, de comentários sobre a aparência física, de convites”, elenca Claudia Múrias. “As pessoas devem ser tratadas com dignidade”, justifica, sublinhando que em Portugal “há uma grande tolerância ou uma franca censura deste tipo de comportamentos”.

Entretanto, o Bloco de Esquerda elaborou em 2014 um projecto de lei,  que se baseia nas propostas da UMAR e também da APAV (Associação de Apoio à Vítima). Levou mesmo a discussão no plenário do Parlamento uma proposta que classifica como crime o assédio sexual (incluindo o assédio verbal) e outra para a chamada perseguição (stalking). Os partidos da maioria e o PS apresentaram então também propostas para criminalizar o stalking e o casamento forçado.

Discutido no plenário, o projecto do BE baixou sem votação e está a ser trabalhado na especialidade, no Grupo de Trabalho sobre as Implicações Legislativas à Convenção de Istambul (convenção do Conselho da Europa para prevenção e combate à violência contra as mulheres e violência doméstica). "Entendemos que a agressão sexual, física ou verbal, deve ser criminalizada. A única voz radicalmente contra foi a do PS. Tenho esperança de que haja alguma abertura", declarou na altura a autora da proposta, Cecília Honório.

No projecto, o BE lembra que o assédio sexual está  tipificado como crime autónomo em países como o Brasil, Espanha ou França e alega que, apesar de em Portugal estar contemplado no Código de Trabalho, com sanção através de contraordenações, é “entendimento de feministas e associações, como a UMAR e a APAV, entre outras, que esta previsão é insuficiente para a dimensão e gravidade destes comportamentos”.

Mas de que falamos quando falamos de assédio sexual? Segundo o BE, é “uma forma de coerção, tantas vezes exercida por alguém em posição hierárquica superior à das vítimas, maioritariamente mulheres” e que pode expressar-se através de “palavras ou actos de natureza sexual, indesejados e ofensivos”. Actos esses que podem ocorrer “em múltiplos espaços (ruas, escolas, universidades, transportes públicos, locais de trabalho). No projecto propõe-se uma pena “prisão até três anos, se pena mais grave não lhe couber por outra disposição legal”.

Nos termos do Código do Trabalho, o assédio sexual constitui uma contra-ordenação muito grave e a empresa em que a situação ocorrer pode ser alvo de coimas em montantes entre os 2040 e os 61.200 euros, sendo este valor o previsto para casos mais grave e dolosos. O Código de Trabalho faz depender o valor das coimas do volume de negócios, bem como da atitude da empresa face ao conhecimento da situação de assédio. com Pedro Sales Dias

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