Nem por isso

O "nem por isso" é a alforreca das respostas negativas.

Ainda acalento a esperança de vir a perceber a língua portuguesa mas, com cada ano que passa, a esperança queixa-se que está fria.

É coisa que me preocupe? Nem por isso. "Nem por isso": toda a gente sabe o que quer dizer mas qual é o "isso" por que ocorre o "nem"?

Se eu desafiasse alguém a comer exclusivamente gelado de caracol e mioleira durante o resto do Verão por quinhentos euros por dia e essa pessoa não estivesse nada para aí virada e vomitasse só de ouvir o convite, compreenderia que me respondesse "nem por isso". O significado seria "nem por esse pagamento eu faria o que me propõe".

Odeio quem diga "eu, pessoalmente" como se se não quisesse ser confundido com quem diz "eu, falando colectivamente por toda a gente que não conheço". É como dizer "na minha opinião, eu acho que não me posso pronunciar sobre esse assunto que desconheço".

Pergunta-se a alguém se gosta de viver em Portugal e ele responde "nem por isso". Não é bem "não". É "não especialmente". "Especialmente" é tão irritante como "pessoalmente".

"Nasceste em Lisboa?", pergunto. "Nem por isso", respondem. Ainda mais irritantemente: "não especialmente".

Todas estas manobras, com o "nem por isso" à frente, são um assalto brutal sobre a limpeza e a verdade do simples "não". O "sim" e o "não" têm de ser protegidos. São palavras claras, curtas e lindas.

O "nem por isso" é a alforreca das respostas negativas. O que mais enfurece nela é a falta não-absoluta de significância.

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