Ministra da Justiça recusa transferir para já tutela da PJ para o Ministério Público

O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público e a Associação Sindical dos Funcionários da Investigação Criminal da PJ defendem a mudança de tutela.

Foto
Paula Teixeira da Cruz diz que há "mistificação" sobre facturas Nuno Ferreira Santos

A ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, recusou esta sexta-feira à margem do X Congresso do Ministério Público, em Vilamoura, entregar até ao final da legislatura a tutela total da Polícia Judiciária (PJ) ao Ministério Público, como propõe o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público e a Associação Sindical dos Funcionários da Investigação Criminal da PJ. Em causa está a dependência organizativa, administrativa e disciplinar daquela polícia, uma tutela actualmente exercida pelo Ministério da Justiça. Funcionalmente a PJ já depende do Ministério Público, que é quem dirige as investigações criminais.

Paula Teixeira da Cruz não fechou a porta ao debate que os sindicatos querem impor, mas avisou que essa mudança “será muito difícil, para não dizer impossível”. Quando questionada sobre a possibilidade de levar a cabo essa reforma até ao final desta legislatura, a ministra foi peremptória: “Nem pensar”.

Este foi um dos assuntos que o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, Rui Cardoso, abordou no discurso de abertura do congresso, que decorre até domingo. Rui Cardoso defendeu que os 30 anos do modelo actual, em que a direcção da PJ é escolhida directamente pelo Governo e fica na dependência orgânica do Ministério da Justiça, demonstrou “muitos aspectos negativos”. O dirigente recordou as palavras de um importante procurador, Rodrigues Maximiano, já falecido: “Os dirigentes da PJ são nomeados pelo Governo, pelo Ministério da Justiça, com base na sua confiança política, constituindo um corpo de titulares de um cargo administrativo com o dever de lealdade política perante o ministro”.

Rui Cardoso defendeu que os poderes que são hoje do Executivo deveriam passar para a Procuradoria-Geral da República e para o Conselho Superior do Ministério Público, o órgão de gestão e disciplina desta magistratura. Ao realçar que “é tempo de assumir quem verdadeiramente quer a independência da investigação criminal”, Rui Cardoso alertou: “Ou, pelo contrário, quem está confortável com a possibilidade de o poder executivo, de forma mais ou menos dissimulada, manter condições de interferência no trabalho da Polícia Judiciária e, logo, no próprio Ministério Público”.

O presidente do SMMP aproveitou para pedir meios, nomeadamente humanos, precisando serem necessários pelo menos 100 procuradores e 1000 funcionários judiciais. “Sem eles, os tribunais não andam, a justiça pára”, avisou. O magistrado lembrou que são essenciais assessores que apoiem o Ministério Público em áreas específicas, como as financeiras ou as informáticas, e sublinhou: “Os gabinetes de apoio aos magistrados continuam por instalar. Não desde Setembro de 2014. Desde Abril de 2009”.

O sindicalista lamentou que o Ministério Público tenha necessidade de “estender a mão” ao poder político para levar a cabo o seu trabalho. “Temos, não raramente, o Ministério Público de mão estendida para o executivo, pedindo meios para realizar a investigação A ou a investigação B. Por vezes com resposta positiva, mas normalmente com resposta negativa”, afirmou. A ministra respondeu que nunca recusou nenhum reforço concreto, fosse de uma fotocopiadora ou de um computador.

A autonomia financeira do Ministério Público foi outra das exigências de Rui Cardoso e igualmente da procuradora-geral, Joana Marques Vidal. Mas neste ponto Paula Teixeira da Cruz concordou. “Enquanto ministra, pugno pela efectiva autonomia do Ministério Público. Administrativa e financeira, seja da Procuradoria-Geral da República ou o do Conselho Superior do Ministério Público. Essa autonomia e desejável para todos", sublinhou a ministra, que se comprometeu a consagrar isso mesmo nos estatutos dos procuradores, actualmente em revisão.

Paula Teixeira da Cruz garantiu ainda que a mudança dos estatutos será concluída até ao final da legislatura, tentando pacificar um receio de Rui Cardoso. Sobre a reforma do mapa judiciário, no terreno há cerca de seis meses, a governante reconheceu que ainda é cedo para fazer um balanço, sublinhando, contudo, que tem ouvido opiniões positivas de autarcas, advogados e membros dos conselhos de gestão das novas comarcas. Apelou, no entanto, para que os profissionais da Justiça abandonem “questiúnculas” e trabalhem num ambiente de “cooperação estratégica”. Teixeira da Cruz reconheceu que há pormenores por limar nesta reforma e prometeu “acertos” ao modelo. No fim, a ministra repetiu elogios ao dirigente sindical: Rui Cardoso, que termina o mandato em breve e não se irá recandidata, deu “um contributo inestimável” para as reformas da Justiça.

Sugerir correcção
Comentar