Ministério da Educação não quer sindicatos dentro das escolas no dia da prova dos professores

Na nota enviada às escolas, o MEC não esconde que a restrição de acesso visa impedir a realização dos plenários marcados para a mesma hora da prova pelas organizações sindicais.

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Quem não estiver envolvido na prova não deve entrar na escola Adriano Miranda

Para evitar a realização de reuniões sindicais, o Ministério da Educação e Ciência (MEC) está a fazer chegar aos dirigentes escolares a indicação de que na manhã desta terça-feira o “acesso às escolas [em que se realiza a prova de avaliação para professores] deverá ser restrito às pessoas envolvidas” na realização daquele serviço, que diz ser de “natureza urgente e essencial”.

O presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, considera a situação “lamentável”. “Fomos apanhados numa guerra política”, diz.

Na mensagem electrónica dirigida aos directores das cerca de 80 escolas em que se realizam as provas para professores contratados, o MEC refere-se directamente ao facto de várias organizações sindicais, incluindo a Federação Nacional dos Professores (Fenprof), estarem a convocar plenários e a apelar aos professores do quadro para que faltem à vigilância das provas ao abrigo da lei sindical, impedindo assim a sua realização. Citando a Lei 59/20908, o MEC sustenta que o direito de exercer a actividade sindical no interior do órgão de serviço “não pode comprometer a realização do interesse público e o normal funcionamento dos órgãos e serviços” e que, no caso de a reunião se realizar durante o horário de trabalho, "os promotores devem apresentar uma proposta que assegure o funcionamento dos serviços de natureza urgente e essencial”.

Numa nota enviada à comunicação social ao princípio da tarde desta segunda-feira, o MEC insiste que a prova foi “assumida como uma prioridade desde o primeiro momento” pelo actual Governo, “em benefício dos (…) alunos e da escola pública”, e recorda que parte dos professores a que se aplica – docentes sem vínculo à função pública e com menos de cinco anos de serviço – já a realizou, a 18 de Dezembro. Confirma, assim, a indicação dada às escolas, que justifica com a necessidade de “garantir as condições de tranquilidade adequadas à realização da prova de avaliação de conhecimentos e capacidades, salvaguardando o interesse público e o direito dos candidatos à sua realização”.

Contactado pelo PÚBLICO, Filinto Lima frisa que “o MEC terá o direito de classificar os serviços como sendo de natureza urgente e essencial”. “O que já é difícil de aceitar é esta situação em que todos – incluindo nós, os directores, somos levados a cometer excessos. Devíamos estar concentradíssimos na preparação do próximo ano escolar e temos de estar preocupados com esta guerra política em que nós e as escolas fomos apanhados”, lamenta.

O presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), Manuel Pereira, que só ao princípio da tarde teve conhecimento da orientação, considera-a “estranhíssima”, por colocar em causa “o princípio da confiança nos professores e o pressuposto de que estes são pessoas equilibradas e responsáveis". “Não permitir que entrem na escola outros professores que não os envolvidos no serviço da prova é alterar as regras de uma forma que ultrapassa a razoabilidade”, afirma. E acrescenta: “Já é suficientemente lamentável a situação em que o MEC colocou os directores, ao marcar a prova às escondidas de todos e com um prazo apertado. As coisas devem ser feitas de forma transparente – quem não deve não teme”, critica.

Queixa-crime contra quem emitiu nota enviada às escolas
Contactado pelo PÚBLICO João Louceiro, dirigente da Fenprof, frisou que os serviços “não podem ser classificados de natureza urgente e essencial por capricho dos ministros”. “Neste caso, é claramente abusivo: estamos perante um serviço que não faz parte da actividade normal da escola, que não se dirige a quem anda na escola e que até é estranho à escola”, sustenta. Afirma ainda que "a medida é um artifício que visa evitar a realização de plenários legalmente convocados e que constituem um dos direitos, liberdade e garantias consagrados na Constituição”.

Com esta leitura, a direcção da Fenprof vai apresentar uma queixa-crime contra o director da Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares, que emitiu a nota enviada às escolas. Em comunicado promete ainda participar daqueles que nos estabelecimentos de ensino assumam o impedimento da realização das reuniões sindicais convocadas ou a participação nelas dos professores interessados; avisa, por fim, que chamará a polícia, se os dirigentes sindicais forem impedidos de entrar nas escolas.

Mais tarde, numa conferência de imprensa em que pediu a demissão do Ministro da Educação, Nuno Crato, o secretário-geral da Fenprof, Mário Nogueira, acusou os governantes de “até na maldade serem incompetentes”.  Assegurou que há docentes que dispõem comprovativos de que não puderam fazer a prova em Dezembro e que não foram chamados a realizá-la, agora; e frisou que legalmente o MEC não pode impedir quem não fizer a prova de dar aulas, já que esta não fazia parte dos requisitos verificáveis à data dos avisos dos concursos e “ já foram publicadas, entretanto, as listas provisórias das candidaturas” dos professores que podem vir a ser colocados nas escolas, no próximo ano lectivo. Nogueira disse ainda acreditar que os directores não vão impedir a realização dos plenários e apelou aos professores dos quadros para não vigiarem os colegas.

Uma das hipóteses em aberto é os dirigentes escolares indicarem escolas do respectivo agrupamento diferentes daquelas em que se realizam as provas para a realização das reuniões sindicais. Desta forma, o MEC afasta do local de realização da prova os sindicalistas, mas ainda terá para resolver o problema dos docentes que ameaçam boicotar a realização da prova e que estão a apelar à mobilização da população em geral.

Este movimento não conta com o apoio dos sindicatos. Esta segunda-feira, Mário Nogueira voltou a apelar aos professores que não participem em situações de violência. “Já basta a que o MEC está a exercer contra os professores. Vamos mostrar que temos a dignidade e o sentido de democracia que o MEC não tem”, justificou.

 

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