Maioria das vítimas de traumatismo crânio encefálico fica reformada ou desempregada

Seis em cada dez vítimas de traumatismo crânio encefálico grave estão desempregadas ou reformadas um ano após o acidente e 82% não têm acesso a terapias de reabilitação, revela um estudo divulgado esta segunda-feira.

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Portugal está abaixo da média da OCDE no número de camas por habitantes Fernando Veludo

O estudo "Impacto sociofamiliar do Traumatismo Crânio Encefálico (TCE)", realizado pela Novamente - Associação de Apoio aos Traumatizados Crânio-Encefálicos e Suas Famílias, quis verificar o impacto da doença na vida das vítimas e dos cuidadores, disse à Lusa a investigadora e directora da associação, Vera Bonvalot. A recolha dos dados foi realizada quatro, oito e doze meses após o acidente e analisou 266 casos admitidos nos serviços de urgência hospitalares nos últimos três anos.

O estudo, que é hoje apresentado na Fundação Calouste Gulbenkian, refere que "o drama do traumatismo crânio encefálico grave tem impacto na vítima, na família, mas também na sociedade, adiantou Vera Bonvolt. Cerca de 58% das vítimas (com idades entre os 18 e os 45 anos) trabalhavam ou estudavam antes de sofrer o traumatismo e após a lesão apenas 19% manteve a sua actividade.

Dos que voltaram a trabalhar, 75% desempenham a mesma função e trabalham as mesmas horas, 17% realizam menos horas e 8% mudaram de tipo de trabalho. A diminuição da frequência dos tratamentos é outra conclusão do estudo, salientando que 72% das vítimas não têm acesso a terapias de reabilitação ao fim de oito meses e 82% após um ano

É um número "muito assustador", porque as terapias de reabilitação são fundamentais para a recuperação das vítimas, explicou Vera Bonvalot.
O estudo acrescenta que esta situação, além de "comprometer seriamente" as melhorias físicas e neurológicas do doente, aumenta "a responsabilidade e trabalho dos cuidadores". Entre as razões apresentadas pelos inquiridos para esta dificuldade, encontram-se a falta de vagas, a demora da aprovação por parte das seguradoras e o elevado custo dos serviços privados.

Um aspecto relatado pelos cuidadores e vítimas como factor importante para a recuperação é o apoio que recebem da família e dos amigos, mas este vai diminuindo ao longo do tempo. Segundo o estudo, 73% perderam o contacto da família e 93% dos amigos. A doença também tem consequências nas vítimas, com 76% a apresentarem, ao fim de um ano, sinais de ansiedade e depressão e 71% de impulsividade, irritação, agressividade e perda de capacidade para lidar com as pessoas.

Os cuidadores têm um "grande peso na vida das vítimas e também sofrem", disse a investigadora, adiantando que, um ano após o acidente, 62% não retomaram em pleno a actividade laboral, 67% tiveram impactos negativos na saúde e 77% sentem-se emocionalmente esgotados. Muitas famílias não compreendem os comportamentos da vítima, o que resulta da "pouca informação que é transmitida à família que, além de se deparar com uma situação totalmente nova para si, não obtém qualquer informação que a ajude a compreender e a fazer face a esta realidade", sublinha o estudo.

O estudo conclui que o percurso da vítima e dos cuidadores "é complexo e exige a compreensão e intervenção adequada por parte de todos os profissionais que intervêm directamente com estes casos e uma entidade externa que possa defender e representar a família". Nos últimos 25 anos, mais de 275.000 pessoas terão sofrido um TCE grave em Portugal e vivem com sequelas. As quedas são a causa mais frequente (59%), seguidas de acidentes de viação, de desporto e agressões.

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