Ligados à máquina

A comunicação faz mesmo falta e não é apenas na vida das empresas e dos negócios. Sim, aquele tipo de comunicação que liga as pessoas num sentido comum, que lhes dá ânimo, sentido de pertença e, que muitas vezes, as conforta.

As empresas não a descuram: kits de acolhimento, manuais de conduta, e-mails de motivação, reuniões de objectivos, mensagens de aniversários do chefe... Enfim, tudo o que cola pessoas a projectos, sejam directores ou operários. De que falamos então? De práticas de gestão, de orientação para os resultados, obviamente, mas, também, de olhar para uma verdade evidente: as pessoas são (deverão ser) o centro das organizações. O seu bem-estar, a sua cooperação, a sua motivação dão vida às organizações. Até agora, tudo pacífico, fácil de entender. O que já não é assim tão fácil de entender é por que é que estas verdades elementares não estão nos sítios mais vitais, como nos hospitais.

Vem este desabafo a propósito de um recente episódio que vivido num hospital público, onde a comunicação parece ser uma especialidade que passou ao lado da formação nas faculdades de medicina. E o quanto isso poderia fazer a diferença.

O caso conta-se rápido: uma situação de urgência deu lugar à necessidade de internamento, que se traduziu em sete dias numa enfermaria. Uma semana em que, apesar dos grandes esforços das enfermeiras no sentido de tranquilizar com algum tipo de informação, de pedidos para conhecer a situação clínica, os médicos controlavam o doente à distância. Em controlo remoto, portanto. Refugiados nas suas salas, ligados a ecrãs que debitam dados, exames e relatórios, acompanham, com presumível segurança técnica, o evoluir da situação. Esquecem-se que, por detrás de um corpo, está uma alma, muitas vezes num estado frágil, mesmo a precisar de cuidados humanos.

A verdade é que o doente saiu sem ter acesso ao ansiado detalhe – apenas o nome da doença e o encaminhamento para a consulta externa. Um médico lá apareceu para informar da alta e dar o envelopezinho com o relatório do episódio para a consulta externa. Sem mais pormenores. Lá se arrancou a ferros algo mais. A maquinaria do doente parecia ter respondido bem, presume-se.

Não foi a primeira vez no espaço de meio ano que notei esta relutância na conversa cara-a-cara num hospital, além de uma certa fixação nas máquinas – ecrãs de computadores, no caso. Estranho muito estes casos, até porque tenho extraordinários exemplos de médicos (alguns muito, muito próximos) que dedicam a sua vida à saúde e ao bem-estar dos doentes, ficando pacientemente a conversar sobre os males e as maleitas, dando conselhos e coragem. E como isso faz tão bem a quem está fragilizado. Devia fazer parte de qualquer terapia. Ainda por cima, é grátis.

Também serve este desabafo para relembrar raros mas bons exemplos vindos da academia, onde a componente da comunicação é tida em conta ou, ainda, de organismos públicos ligados à saúde que dão atenção crescente a estas questões – precisamente porque saber chegar a mensagem às pessoas pode fazer parte do processo em saúde.

A autora é investigadora na Universidade do Minho e directora da b+ comunicação

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