Incomparavelmente

Dizem-me que "Fulana cozinha incomparavelmente melhor do que Sicrana". A frase ficou-me porque reúne dois erros que já se enraizaram a tal ponto que deixaram de ser erros.

A primeira aula de linguística ensina que a língua é a maneira como as pessoas falam. Este mês perfaço 60 anos e há 30 anos que vou fazendo o que posso para defender o "mais bem" e "menos bem" em vez de "melhor" ou "pior" sempre que se trata do advérbio "bem". Já que "melhor" e "pior" são (ou eram?) comparativos (é favor manter em mente esta palavra) dos adjectivos "bom" e "mau".

Dantes a frase do meu amigo era errada. Hoje é a correcção que é hiper-correcta, que é como quem diz, com desdém, "meramente" académica: obsoleta.

Acontece o mesmo com "incomparável" e "não há comparação". Dois dos meus maiores amigos dizem (acerca da Grécia) que "não há comparação entre a situação financeira da Portugal e a da Grécia".

Dizem-no porque, depois de compararem as duas situações, chegaram à conclusão que a situação de Portugal era melhor. Negam o acto da comparação - que consiste em avaliar uma coisa em relação a outra parecida - depois de se terem dado ao trabalho de fazê-la.

O erro só é evidente à minoria que não caíu nele. É como o azeite ou o vinho que, depois de terem sido comparados com os concorrentes e julgados melhores, se apresentam como "incomparáveis".

"Incomparável" agora quer dizer melhor, seja mais bem ou "mais bom". É pior e é comparável mas é mesmo assim.

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