Hilda não sabia que tinha direito a benefícios fiscais por ter tido um cancro

Há alguns direitos estabelecidos para quem sobrevive a um cancro. Mas muitas pessoas desconhecem-nos.

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Hilda Custódio diz que há muitas mais pessoas prejudicadas por desconhecerem tanto os seus direitos, como a hipótese de obter apoio jurídico gratuito Hugo Santos

Hilda Custódio tinha 58 anos quando lhe foi diagnosticado cancro da mama. A consulta que desencadeou todo o processo aconteceu no final de 2010. Era funcionária pública, tinha um trabalho essencialmente administrativo. Fez oito sessões de quimioterapia e 35 de radioterapia, tendo-se mantido ao serviço, com excepção dos dias que sucediam à “quimio, que era mais pesado”. Manter o trabalho, diz, foi a melhor opção. “Estar sozinha era impensável”, assim “estava com os colegas e tinha a cabeça ocupada”.

Como sucede em muitos casos do cancro da mama, seguiu-se a mastectomia e o esvaziamento da axila. Depois de se submeter a uma junta médica foi-lhe atribuído 60% de incapacidade, percentagem que lhe deu acesso a benefícios fiscais, tal como previsto na lei, durante cinco anos. Após a doença reformou-se, pois “não sentia capacidade” para continuar a desempenhar o trabalho que tinha.

Passados os cinco anos da primeira avaliação, uma nova junta médica baixou-lhe a percentagem de incapacidade para 49,86%. Teve então conhecimento que uma amiga, em situação semelhante, não descontava para o IRS. “Mas a mim estão-me a descontar!” Foi então que decidiu recorrer à Unidade de Apoio Jurídico da Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC).

De entre os sobreviventes de cancro, a grande maioria dos que recorrem a esta unidade da LPCC do Centro são mulheres — representam quase três quartos das assistências prestadas pelos advogados. Na distribuição etária, a maior fatia vai para os sobreviventes entre 51 a 75 anos e os motivos com mais peso que ali os levam prendem-se com questões laborais e com as relacionadas com a Autoridade Tributária.

Hilda Custódio, agora com 63 anos, encaixa-se neste perfil, mas refere que há muitas mais pessoas prejudicadas por desconhecerem tanto os seus direitos, como a hipótese de obter apoio jurídico gratuito. Com ajuda dos advogados da LPCC, enviou um requerimento a expor o seu caso às Finanças e à Caixa Geral de Aposentações. Não obteve resposta por escrito, mas quando passados 90 dias olhou para o recibo da reforma viu que tinha sido ressarcida dos 11 meses em que descontara sem que a isso fosse obrigada.

Fátima Bernardo é outra sobrevivente de cancro. Lembra-se de cada data do “processo”, como lhe chama. Agora com 49 anos, a formadora e técnica superior da qualidade tinha 39 quando o cancro da mama lhe foi diagnosticado. No dia em que teve a confirmação, a 24 de Abril de 2007, começou logo com os tratamentos de quimioterapia.

Na altura trabalhadora independente, não tinha hipótese de meter baixa e manteve-se a trabalhar, tal como Hilda Custódio. “Costumo dizer, em jeito de piada, que acabava de vomitar e ia.”

Nesse mesmo ano submeteu-se a uma intervenção: “Fiz mastectomia radical modificada. Para além de ter ficado com algumas lesões no braço, tenho pouca sensibilidade na mão.” E, por isso, foi-lhe atribuída uma incapacidade de 75%. Cinco anos depois, com a nova avaliação, passou para 24%. Teve de pagar mais de IRS e também o Imposto Único de Circulação. Já este ano, recorreu ao apoio jurídico da LPCC e conseguiu recuperar parte do que lhe foi cobrado, mas, sublinha, há dinheiro que não conseguirá reaver.

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