Governo limita acesso às facturas de água e luz para agilizar despejos

Famílias monoparentais ou com menores, idosos, deficientes e vítimas de violência doméstica vão ter prioridade no acesso a uma casa social.

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Acesso à habitação social vai ter novas regras Nuno Ferreira Santos

O Governo mantém a intenção de aceder aos consumos de água, gás ou electricidade dos inquilinos das casas sociais, mas apenas nos casos em que tenha visto goradas pelo menos duas tentativas de contactar o arrendatário.

Depois das objecções levantadas pela Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) relativamente à proposta inicial de revisão do regime de arrendamento apoiado, que previa o acesso àqueles dados relativamente a todos os inquilinos de casas sociais, com o objectivo de fundamentar o despejo dos inquilinos nos casos em que houvesse ausência de consumo, o Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território alterou a redacção proposta. Continua a reservar aos senhorios dos cerca de 120 mil fogos de cariz social – Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), câmaras, instituições particulares de solidariedade social... – o direito de aceder àqueles dados para efeitos da cessação do contrato por renúncia, nos casos em que haja ausência de consumos, mas apenas quando tenham resultado goradas “pelo menos duas tentativas de notificação” do arrendatário.

A prioridade no acesso a uma casa social às famílias monoparentais ou que integrem menores, aos deficientes, idosos com mais de 65 anos de idade e às vítimas de violência doméstica é uma das novidades desta proposta de lei que estabelece o novo regime de arrendamento urbano - que deverá, se aprovada pela Assembleia da República, substituindo o decreto-lei n.º 166/93, de 7 de Maio, cuja alteração vem sendo reivindicada há mais de uma década, sobretudo por implicar aumentos de rendas tidos como incomportáveis para quem habita um fogo social. “A introdução desse mecanismo de apoio às populações de maior vulnerabilidade parece-me uma evolução positiva”, comentou ao PÚBLICO Paula Marques, vereadora da Habitação na Câmara de Lisboa.

Sem ter tido tempo para analisar a proposta que lhe chegou às mãos por via da Associação Nacional de Municípios, a vereadora da Habitação da entidade que é a maior senhoria do país – a Câmara de Lisboa gere 23 mil fogos sociais -, Paula Marques lamenta que o Governo não tenha falado directamente com as autarquias. “Numa matéria desta importância teria sido produtivo ouvir os municípios antes de fazer avançar a proposta”. De igual modo, Manuel Pizarro, vereador da Habitação na Câmara do Porto, que é detentora de 12.800 fogos, também não tinha conseguido ainda analisar a proposta. Mas adiantou concordar à partida com a necessidade de “simplificar e agilizar os meios que permitem travar os abusos e fazer uma gestão rigorosa das casas”, embora considere tratar-se de “fenómenos minoritários” no universo do parque habitacional social.

As alterações à lei visam, conforme se lê no preambulo da proposta, travar a “descaracterização da finalidade” a que os fogos sociais se destinam. Trata-se de uma ajuda, preferencialmente provisória, às famílias em situação de carência económica. O problema é que, segundo o documento, as taxas de mobilidade no parque de habitação social português rondam os 2%, ou seja, são bastante inferiores às apresentadas por outros países que chegam aos 13%. “Esta ausência de mobilidade, muito associada à ideia de que uma casa é para toda a vida, criou situações paradoxais, em que famílias que obtiveram melhorias significativas do seu nível de rendimentos continuam a beneficiar de habitação social com rendas muito baixas em prejuízo de agregados familiares em situações de graves carências económicas”, aponta o documento.

Entre as novidades contam-se assim também alterações na fórmula de cálculo da renda a pagar, com uma taxa de esforço que, podendo ser inferior a 2% do rendimento da família, “vai aumentado de forma progressiva à medida que aumentam os rendimentos”, mas não podendo nunca resultar daí uma renda superior a 25% do rendimento mensal corrigido do agregado familiar. Outra das diferenças é que (e na senda do que fora recomendado em 2008 pelo então provedor de Justiça, Nascimento Rodrigues) o cálculo do valor da renda passará a ter em conta a dimensão e as características do agregado familiar.

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