Final de Agosto

Chego ao fim das férias descansado e disponível para mais um ano de trabalho. Como professor universitário, tudo recomeça em Setembro e acaba em Julho: os exames dos meus alunos da Faculdade de Medicina precedem o mês de férias de Verão e o fim de Agosto marca o retorno às actividades profissionais.

Neste fim de tarde, passeio pela Praia Grande da minha infância. Desta vez não há neblina e a água do mar está em temperatura aceitável. Observo as famílias, onde os mais pequenos ainda estão junto aos pais e os adolescentes estão com os seus amigos, só se juntam aos familiares em breves encontros à beira-mar. As conversas são sobre bares ou restaurantes, só de vez em quando oiço um tema político, depois das saudações de um só beijo ou de um aceno descomprometido.

Volto para casa e encanto-me com Amada Vida, de Alice Munro. Apaixonado por romances, fico preso a esta contista do quotidiano, capaz de colocar todos os sentimentos mais profundos a partir de incidente banal. E leio os jornais do fim-de-semana.

Já estamos em campanha eleitoral, mesmo que oficialmente esteja marcada para mais tarde. As sondagens dizem-nos que a coligação de direita ou o PS poderão vencer as legislativas. Começo justamente por aí: para ganhar, o PS sozinho tem de vencer dois partidos, facto evidente mas que, infelizmente, é pouco citado. Os simpatizantes e militantes socialistas exigem esse grande esforço, que significará um novo rumo para a política portuguesa.

A análise dos últimos dias mostra a repetição constante, por parte dos partidos do Governo, de uma mensagem simples: herdámos o caos, conseguimos resolver o essencial, estamos em condições de oferecer um futuro menos difícil, mas com a garantia de que nunca mais haverá perigo de bancarrota, nem despesismo descontrolado, típico do PS. Esta mensagem é eficaz à primeira vista, mas parte do pressuposto de que os portugueses vão esquecer o que sofreram, durante pelo menos três dos quatro anos desta governação.

O PS tem de aproveitar bem o mês de Setembro para mostrar como pode fazer diferente. O trabalho realizado no campo económico merece o nosso respeito e aplauso, mas tem de ser complementado por indicações bem fundamentadas do que poderá ser executado no campo da saúde, da educação e da segurança social, as matrizes essenciais da prática social-democrata. Responder só no campo da economia e das finanças restringirá o debate, tornando-o difícil para a maioria dos portugueses, que querem sobretudo saber como vai ser a escola, o hospital e a pensão de reforma e, sobretudo, como se vai diminuir o desemprego.

Pela minha parte, gostaria que o tão falado empate técnico nas sondagens não conduzisse ao despique pela frase de melhor efeito, antes levasse a um apuramento das propostas dos partidos e à demonstração clara de quem tem melhores condições para liderar o Governo. À pergunta sobre quem vai ser o próximo primeiro-ministro, sabemos que a resposta é: Passos Coelho ou António Costa. Entre os dois, quem mostra melhores condições para o cargo? Quem os portugueses consideram mostrar mais garantias para o futuro, com base no que fizeram nos últimos anos?

O PS, para ganhar, tem de marcar a campanha com propostas claras sobre o futuro dos cidadãos e nunca permanecer preso à ideia de que basta prometer a diferença. Um pouco de autocrítica será o melhor antídoto da acusação de despesismo: reconhecer alguns erros e providenciar para que não se repitam é uma demonstração de inteligência.     

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