Famílias de etnia cigana expulsas da Vidigueira continuam sem casa e as crianças privadas da escola

Famílias concentraram-se esta quinta-feira junto à Câmara da Vidigueira e reclamaram a cedência de terreno para poderem erguer tendas. O autarca, que em Julho se recusara a procurar um espaço para a Cruz Vermelha instalar um acampamento, prometeu-lhes ontem uma solução temporária.

Desesperadas pela indefinição e falta de resposta para a situação dramática em que vivem, as famílias ciganas a quem a Câmara da Vidigueira arrasou no início de Julho, à força de caterpillars, o barracão onde moravam e que foi construído pela autarquia, concentraram-se esta quinta-feira em frente do edifício da Câmara da Vidigueira na expectativa de serem recebidas pelo presidente, Manuel Narra.

Pretendem que este os autorize a ocupar um qualquer terreno municipal onde possam erguer as suas tendas. Ao final da tarde, o autarca prometeu-lhes uma solução temporária.

O patriarca da família, Jacinto Cabeças, contou ao PÚBLICO o seu dia-a-dia, desde que a Câmara da Vidigueira ordenou a destruição das casas, na sequência de um conflito entre elementos da etnia “Estamos a viver na rua e a guarda (GNR) sempre em cima da gente passando multas por estarmos a montar as tendas e com o frio que já se sente à noite, nem uma fogueira podemos fazer”.

O problema maior reside nas cerca de 15 crianças que não vão à escola, quando são obrigadas a frequentá-la. “Nem livros têm”, queixasse Jacinto Cabeças, igualmente preocupado com “a velhota”, a companheira de 74 anos, a convalescer de um AVC que a forçou a um internamento no Hospital de Santiago do Cacém. O médico avisou-a: “olhe que não pode estar na rua e à chuva”. Mas é lá que vive, debaixo de árvores.

“O pior de tudo, são as molhas que as crianças apanham de madrugada quando estão a dormir” descreve outro elemento da família. “Andamos à roda, de um lado para o outro, à chuva e ao frio, não temos casa para viver, pois as pessoas não as alugam a ciganos, e depois vem a guarda e é multa atrás de multa por montarmos tendas”.

O Alto Comissário para a Imigração e Diálogo Intercultural, Pedro Calado não esconde a sua revolta pela situação das famílias ciganas da Vidigueira, quando havia uma solução pronta a aplicar “em apenas 24 horas”.

Pedro Calado que se deslocou à Vidigueira onde reuniu com Manuel Narra, e a comunidade cigana no dia 18 de Julho, explicou ao PÚBLICO que observou um problema de saúde pública quando “fomos confrontados com casos de doenças crónicas e pessoas em grande fragilidade física”.

O Alto Comissário acordou com a Cruz Vermelha a instalação de um acampamento com tendas que garantiam um mínimo de qualidade de vida “em apenas 24 horas”.

O autarca da Vidigueira não acolheu a ideia alegando que não tinha verba para aplicar neste tipo de solução. Pedro Calado descansou-o: “ É uma solução a custo zero para a autarquia”. Só tinha é que disponibilizar um terreno municipal, que Narra alegou não dispor.

 Foi sugerido a Manuel Narra que apelasse às misericórdias, instituições de solidariedade social, mas, segundo Pedro Calado, a resposta foi negativa.

“Fiquei estupefacto”, recorda Pedro Calado, lamentando que o autarca “tenha boicotado uma solução para alojar as famílias ciganas em apenas 24 horas e a custo zero para a autarquia”. Mas ao final da tarde desta quinta-feira, o presidente da câmara comunicou às famílias concentradas em frente ao edíficio da câmara que tinha conseguido um terreno particular onde podiam estar acampados durante 10 dias, “enquanto procurava encontrar um outro local”, adiantou ao PÚBLICO Prudêncio Canhoto, mediador da comunidade cigana.

Entretanto, as famílias desavindas já fizeram as pazes e apresentaram uma queixa junto do Alto Comissário contra o autarca acusando-o de descriminação racial.

O PÚBLICO fez várias tentativas para ouvir o presidente da Câmara da Vidigueira, mas até ao fecho da nossa edição não obtivemos qualquer explicação.

 

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