Primeiro reitor da Universidade de Évora morreu aos 93 anos

O pai queria que fosse empregado de escritório mas ele sonhava com aviões. Acabou em Agronomia, onde trabalhou com Adriano Moreira e Amílcar Cabral. Terminou a sua longa carreira como reitor na universidade alentejana.

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Faleceu esta terça-feira, em Lisboa, com 93 anos, o professor catedrático jubilado do Instituto Superior de Agronomia, Ário Lobo de Azevedo. Nasceu na cidade de Lourenço Marques, hoje Maputo (Moçambique) em 1921. Nesta cidade frequentou o ensino liceal obtendo a média final de 14 valores que lhe valeu a atribuição de uma bolsa de estudo na metrópole, onde se licenciou em Engenharia Agronómica pelo Instituto Superior de Agronomia, em 1946, ano em que pela primeira entraram mulheres no curso que concluiu como engenheiro silvicultor em 1953.

Foi professor catedrático e Investigador pedologista da Missão de Hidráulica Agrícola ao Sul de Angola, da Missão de Pedologia de Angola (de que também foi responsável, de 1960 a 1962) e da Missão de Pedologia de Angola e Moçambique. Entre 1965-1970 assumiu as funções de director do Centro de Estudos de Pedologia Tropical da Junta de Investigações do Ultramar. Após apoiar a organização do Instituto Universitário de Évora, o ministro Veiga Simão empossou-o como reitor da Universidade de Évora a 4 de Janeiro de 1974.

O pai, agricultor e comerciante, queria fazer um exemplar empregado de escritório, mas o jovem irrequieto persistia no seu interesse pelas coisas da mecânica. Numa entrevista que deu em 2010, a Cláudia Castelo, sobre o tema Património científico: colecções e memórias para o Arquivo Científico Tropical, recorda que a oficina tinha vários operários, e “eu era um deles, o mais novo e descobri que o facto de eu ter melhor educação, saber inglês, permitia-me ler os catálogos e os livros de instruções” um grau de conhecimentos que o projectou na hierarquia da oficina. “Ali aprendi o valor do estudo”, realçou Ário Azevedo.

Quando concluiu o 7.º ano, com 14 valores, teve uma agradável surpresa. Havia uma regra estabelecida pela Câmara Municipal de Lourenço Marques, onde vivia, que quem tivesse 14, recebia uma bolsa de estudo. Ainda saboreava o sucesso quando “uns senhores acharam que eu não merecia o 14 e que ficava com 13, de modo que, perdi a bolsa de estudo". O desaire obrigou-o a trabalhar mais 5 meses na oficina para pagar a passagem de barco para Lisboa para prosseguir os estudos, onde? “Eu tinha uma ambição. Ser construtor de aviões.” Os aviões era, a sua paixão.

Acontece que, quando chega a altura de se apresentar no serviço militar, o seu sonho maior continuava centrado nos aviões. Sobretudo pilotá-los. Novo percalço. “Era tão magro, tão magro, que não tinha peso para voar, de modo que fui excluído, de modo que fiquei em Agronomia” para onde foi encaminhado pela mão do professor Mário de Azevedo Gomes.

Trabalha em Angola, viaja para os Estados Unidos para estudar em pleno em pleno mcartismo, para ser ameaçado de expulsão por ter feito sobre uma afirmação de um senador americano. Regressou a Moçambique e ajuda a fundar a Casa dos Estudantes do Império, e seu primeiro vice-presidente.

Foi assistente de Física Agrícola no Instituto Superior de Agronomia quando Amílcar Cabral era aluno. “E, dei-me muito bem com ele, porque ele era um homem inteligente, era um homem aplicado, era um homem interessado.” Um conceito que formula em relação a Adriano Moreira quando este foi ministro do Ultramar num Governo de Salazar.

O seu percurso de andarilho sofre um interregno ao aceitar o convite do ministro Veiga Simão em 1974 para ser o primeiro reitor da Universidade de Évora, após a sua restauração. Ali permanece no desempenho desta função até 1987.

O testemunho publicado no site da universidade, descreve Ário Azevedo como “um docente, um pedagogo, um cientista e um homem de cultura, facetas transversais a todas as suas acções, difíceis de dissociar ao longo da sua vida.” E relembra as suas próprias palavras no encerramento da cerimónia da sua jubilação em 1992: "Julgo saber o que fiz, sei aquilo que quis ser e hoje fiquei a saber o que alguns dizem que sou.”

Em comunicado, a Universidade de Évora anunciou que o corpo de Ário Lobo de Azevedo estará em câmara ardente na Basílica da Estrela, em Lisboa, estando previsto que o funeral saia, às 10H45 de quarta-feira, para o cemitério dos Olivais.

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