Análises ficam mais baratas ao Estado no público ou no privado?

Estudo diz que hospitais poupavam mais de 50 milhões se fizessem exames fora. E defende modelo de parcerias público-privadas na área dos exames complementares de diagnóstico. Mas o caminho desde 2011 é o contrário, precisamente para gerar poupanças.

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No ano passado o SNS gastou mais de 360 milhões com os exames com convencionados Adriano Miranda

Se os hospitais do Serviço Nacional de Saúde entregassem a maior parte dos exames que fazem a laboratórios no exterior poderiam poupar anualmente entre 53 e 80 milhões de euros. A conclusão faz parte de um estudo realizado pela consultora EY, com a colaboração de um laboratório privado, apresentado nesta quinta-feira na Universidade Católica, em Lisboa. Contudo, há várias experiências de unidades hospitalares que conseguiram fazer mais análises e exames dentro das instituições e que, com isso, pouparam dinheiro.

De acordo com o trabalho, a que o PÚBLICO teve acesso, os laboratórios externos aos hospitais “demonstraram resultados qualitativos semelhantes e, em muitos casos, um melhor tempo de resposta”. Além disso, segundo a consultora, estes modelos de parceria público-privada com o exterior “alcançam melhorias na eficiência e poupanças para o hospital com os custos laboratoriais que variam entre os 20% e os 50%”.

O estudo Panorama dos laboratórios clínicos em Portugal estima que esta poupança com os laboratórios teria um reflexo de menos 1,6% de despesa do Serviço Nacional de Saúde com os hospitais, o que a EY considera ser um caminho importante numa altura de reduções orçamentais para os hospitais. Do total a poupar, cerca de 83% seria directamente na área da patologia clínica, diz o trabalho.

“Para enfrentar estes desafios e garantir a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde, o Estado português está a implementar reformas nomeadamente o aumento das taxas moderadoras (contribuições pagas pelo paciente), e a introdução de directrizes para a gestão de prescrição de meios complementares de diagnóstico”, argumentam, acrescentando que, “neste contexto, as parcerias público-privadas, que são constituídas entre laboratórios privados e unidades públicas de cuidados primários, poderiam ajudar a garantir o fornecimento destes serviços”.

Além disso, com esta mudança, consideram que os exames e análises também passariam a ser feitos num cenário de melhor “acesso à inovação e uma melhoria da qualidade dos cuidados prestados”. Alertam, por outro lado, que outros países em dificuldades semelhantes às de Portugal optaram por enfrentar os problemas financeiras com “novos modelos de gestão que têm como meta assegurar a sustentabilidade dos serviços de saúde”. Entre essas estratégias o estudo destaca a “externalização de serviços, que incluem a redução de custos com a saúde, o aumento da eficiência, capacidade e flexibilidade das instituições de saúde e consequentemente a melhoria global dos resultados da saúde”.

A investigação (que contou com administrações centrais e regionais de saúde, gestores hospitalares, profissionais de saúde e doentes) conclui, ainda, que as maiores beneficiadas por estas mudanças seriam a região Norte, a região de Lisboa e Vale do Tejo e a região Centro – mais concretamente “os hospitais com capacidade instalada superior a 200 camas seriam aqueles com maiores poupanças”.

No entanto, apesar destas conclusões, no primeiro Governo de Pedro Passos Coelho, o ministro da Saúde tentou precisamente reduzir a despesa do SNS com as convenções privadas. Paulo Macedo exigiu que os hospitais fizessem internamente mais meios complementares de diagnóstica e terapêutica, precisamente para rentabilizar as equipas e equipamentos existentes e para gerar poupanças. Há vários relatos desta alteração, como o caso da Unidade Local de Saúde de Matosinhos que começou este caminho ainda antes de a tutela o exigir. Em 2003 gastava mais de 5,5 milhões ao ano em análises e exames que encaminhava para o convencionado e conseguiu reduzir esse valor para pouco mais de um milhão.

Internalização das análises resultou poupança de um milhão por ano à ULS Nordeste
Desde 2012 que a Unidade Local de Saúde do Nordeste decidiu avançar para a internalização das análises clínicas em Bragança, Macedo de Cavaleiros e Mirandela, como forma de cortar custos.

Anualmente, a ULS Nordeste que, para além de três hospitais naquelas cidades inclui ainda 14 centros de saúde no distrito de Bragança, gastava cerca de quatro milhões de euros. Actualmente, de acordo com António Marçôa, presidente daquela entidade, a poupança conseguida ultrapassa o milhão de euros anuais.

Os laboratórios dos três hospitais já estavam equipados e com pessoal adstrito. A administração concluiu que havia capacidade instalada para fazer mais em vez de pagar pelo serviço a laboratórios privados.

Despesa com privados inverte-se em 2014
No entanto, a despesa do Estado com exames e análises pagos ao sector convencionado, que emagreceu sempre desde 2011, em 2014 viu essa tendência inverter-se pela primeira vez. No ano passado, o Serviço Nacional de Saúde gastou mais de 360 milhões com os exames complementares dos seus utentes feitos em locais com acordos, o que representou um crescimento de 8,5%. Mesmo assim, em 2011 a factura era de mais de 418 milhões.

A maior fatia continua a ser canalizada para as análises clínicas, mas a subida foi sobretudo à custa das endoscopias gastrenterológicas, onde se inserem as colonoscopias, que viu a sua despesa duplicar de 10,4 milhões de euros para 22,3 milhões. A subida do número de colonoscopias acontece quando 2014 ficou marcado, logo em Janeiro, pelo caso de uma doente que esperou dois anos por um exame destes, o que atrasou o diagnóstico de um cancro colo-rectal.

“Mais de 40% dos encargos suportados com as entidades do sector convencionado tem a ver com a área das análises clínicas, seguindo-se a radiologia e a medicina física e reabilitação”, explicava o Relatório Anual sobre o Acesso a Cuidados de Saúde nos Estabelecimentos do SNS e Entidades Convencionadas de 2014, publicado em Julho deste ano. De acordo com o documento do Ministério da Saúde “foram realizados quase 60 milhões de exames no sector convencionado no ano de 2014, sendo que 80% desses exames foram da área das análises clínicas”. com A.G.R.

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