Ervas que nos dão prémios (e muito prazer)

Limonete de produção biológica nacional considerado como o melhor em concurso mundial. Uma experiência sensorial e prazer únicos, concluiu o júri dos Great Taste Awards, prémios vistos como os Óscares dos produtos alimentares.

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As irregularidades detectadas na concessão das ajudas agrícolas não são um exclusivo de Portugal Paulo Pimenta

Chamemos-lhe bela-luísa, que talvez seja entre os vários nomes por que é designada a planta aquele que melhor se ajusta ao estilo feminino e luminoso, mas também doce, fresco e perfumado, das folhas do limonete. Há também quem a designe por lúcia-lima ou doce-lima, mas o que é mesmo importante nesta altura é dizer que a nossa Aloysis triphylla atingiu os píncaros. Ou seja, o prémio para a melhor do mundo.

A distinção coube ao lote reserva de limonete do Cantinho das Aromáticas, que é cultivado em modo biológico e que foi eleito como o melhor do mundo logo no primeiro ano de produção.

E não é uma distinção qualquer, já que os Great Taste Awards, que se realizam todos os anos em Londres, são tidos como uma espécie de Óscares na área alimentar. Os produtos submetidos a concurso são apreciados por um exigente júri de especialistas, entre os quais se incluem chefes cozinheiros, críticos e responsáveis pelas compras dos mais reputados e exclusivos armazéns e cadeias de distribuição. Toda a avaliação é feita em provas cegas, ou seja, sem que os jurados conheçam a origem, as marcas ou as embalagens daquilo que analisam.

Eram este ano mais de dez mil os produtos a concurso originários dos mais diversos pontos do planeta e entre os que foram eleitos como os melhores nas respectivas categorias estavam dois portugueses: o lote reserva de limonete Cantinho das Aromáticas; e o queijo DOP de Azeitão do produtor Victor Fernandes.

E se no caso do queijo esta já não é a primeira vez que os produtos da península de Setúbal sobem ao primeiro lugar do pódio, tal como já aconteceu também noutros anos com alguns azeites de produção nacional, no caso das ervas aromáticas trata-se de uma novidade absoluta. E a par da classificação máxima (três estrelas) para o limonete, o concurso deste ano levou ainda ao pódio (com uma estrela) mais dois produtos com ervas de produção nacional: o lote reserva de erva-príncipe, também do Cantinho das Aromáticas, e a tisana de limonete da Hands on Earth, uma empresa de Braga que pelo terceiro ano consecutivo vê produtos seus entre os eleitos.

“Não há melhor forma de premiar o nosso projecto e o constante trabalho de equipa e de investigação que temos vindo a desenvolver”, refere Luís Alves, o principal responsável pelo Cantinho das Aromáticas. A empresa, que se dedica à agricultura e investigação apenas com ervas aromáticas, tem uma exploração com três hectares no coração da cidade de Gaia e sobranceira ao rio Douro. E é caso único na Europa ocidental de uma exploração agrícola em modo biológico em ambiente urbano.

À espera da ministra
“Somos caso de estudo no país e já fazemos parte da história recente da agricultura portuguesa”, refere, sem falsas modéstias, o apaixonado líder do projecto, que espera agora por uma visita da ministra da Agricultura, à qual foi já endereçado o respectivo convite. “No Reino Unido, estes prémios têm enorme repercussão e o ministro da Agricultura faz questão de felicitar todos o vencedores. Estamos ansiosos pela visita da ministra Assunção Cristas, não só para validar este tipo de agricultura mas também para incentivar a produção biológica de plantas aromáticas”.

Quanto à erva que o júri considerou como a melhor do mundo, o jovem agricultor explica que o apuramento das qualidades das plantas é o resultado de um trabalho de investigação que vem sendo feito no Cantinho das Aromáticas. Deu lugar não só aos lotes de limonete e de erva-príncipe agora premiados, mas também aos lotes reserva de tomilho-limão e de hortelã vulgar. O projecto envolve a Escola de Biotecnologia da Universidade Católica do Porto, a Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto e ainda a SenseTest, uma empresa que se dedica a estudos de análise sensorial a produtos alimentares.

Tal como acontece com os outros lotes reserva, para o limonete que conquistou o júri do Great Taste Awards são colhidas só as pontas mais viçosas das plantas e apenas nos dias mais compridos do ano, entre Julho e Setembro. “É quando concentram mais quantidade de óleos e de açúcares, devido ao maior período de insolação”, explica Luís Alves.

Foram também estudados a temperatura, o tempo de extracção e a quantidade de erva mais adequados para cada planta, indicações que constam de cada embalagem. A ideia é a de proporcionar com cada infusão uma experiência sensorial e prazer únicos, tal como expressamente assinalou o júri do concurso em relação ao limonete. Segundo a nota de prova registada na embalagem, “o seu aroma delicadamente cítrico combina com o viçoso sabor frutado no qual se descobrem notas de limão e um aprazível final de boca persistente”.

Mas nem sempre foi assim, já que no início do projecto era sobretudo outro o destino dado às ervas aromáticas. “Optámos por potenciar o prazer e a experiência sensorial e queremos agora esquecer as capacidades medicinais das plantas”, enuncia o mentor do projecto, dando conta de um percurso que consolidou o Cantinho das Aromáticas em pouco mais de uma década.

Tudo começou em 2002 com um pequeno viveiro, até que começaram a exportar para França ervas secas destinadas às indústrias farmacêutica e de cosmética. Foi a partir dos trabalhos de investigação que veio a decisão de acabar com a exportação a granel e concentrar a actividade na criação de marca própria, com uma linha de infusões, condimentos e os lotes reserva. O próximo passo é a produção de tisanas e outras misturas com condimentos específicos para saladas, peixes e carnes.

Conceito holístico
Os principais clientes estão em Inglaterra, França, Bélgica, Alemanha e Suíça. “O nosso objectivo é agora entrar no mercado dos países árabes, mas este é um produto de nicho, que precisa da grande distribuição, mas sobretudo de lojas que lhe dêem valor”, explica Luís, olhando o futuro. Daí o entusiasmo com que relata as ligações que os responsáveis pelas compras das mais prestigiadas lojas de Londres com ele quiseram estabelecer logo durante a cerimónia de entrega dos prémios.

Apesar do reconhecimento do mercado, Luís Alves diz que o Cantinho das Aromáticas quer ser mais que uma marca: “Procuramos um conceito holístico, que podes conhecer, visitar e aprender fazendo.” Além do incentivo às visitas guiadas para escolas, universidades, grupos e famílias (www.cantinhodasaromáticas.pt), há também espaço para todos aqueles que queiram frequentar a exploração por períodos mais prolongados, participando e conhecendo as actividades agrícolas, modos de produção e colheita. A par do espaço de exposição e venda, há também uma espécie de experimentação, onde além de bibliografia e informação sobre o mundo das plantas aromáticas se podem provar infusões e vários outros produtos preparados à base das plantas.

O convite torna-se ainda mais aliciante sabendo-se que os terrenos pertencem à Quinta do Paço, uma propriedade histórica da realeza portuguesa que D. Pedro e Inês de Castro terão habitado durante três anos (1351-53) para aí viverem uma boa parte da sua trágica história de amor.

Romances à parte, a evidente paixão do jovem agricultor pelo cultivo das ervas aromáticas já lhe valeu o reconhecimento por parte da Presidência da República, uma homenagem como novo paradigma para as pequenas e médias empresas agrícolas durante as comemorações do 10 de Junho de há dois anos.

Mostra evidente desse entusiasmo é também o livro Erva uma vez..., uma belíssima e muito útil obra em co-autoria com Patrícia Vilela, Nelson Garrido e Pedro Botelho. Além de toda a informação sobre ervas aromáticas, suas especificidades e modos de produção e cultivo, a obra tem também um apetitoso conjunto de receitas, simples e saudáveis, à base de ervas. Para a tal experiência sensorial e prazer únicos.

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