Enfermeiros começam greve nacional de dois dias com adesão superior a 80%

Protesto tem como principal motivo a carência generalizada de profissionais de enfermagem e a degradação das condições de trabalho. Cirurgias e tratamentos em ambulatório e nos centros de saúde são os serviços mais afectados pela greve. Ministério da Saúde comprometeu-se a contratar mil enfermeiros neste ano e mais 700 em 2015.

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No Hospital de São José, em Lisboa, há utentes à espera Miguel Madeira
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João Semedo do Bloco de Esquerda está solidário com os enfermeiros Miguel Madeira
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Secretário-geral do sindicato em declarações aos jornalistas Miguel Madeira

Depois de a última tentativa de negociação com o Ministério da Saúde (MS) ter falhado, os enfermeiros deram início nesta quarta-feira a uma greve de dois dias que terá o ponto alto na quinta-feira, com uma concentração frente à sede da tutela, em Lisboa. No primeiro turno a adesão está a ser superior a 80%, diz a TSF. A carência generalizada de profissionais de enfermagem, a falta de progressão na carreira, as horas extraordinárias acumuladas e as folgas por gozar são alguns dos motivos invocados para a paralisação convocada pelo Sindicado dos Enfermeiros Portugueses (SEP) em nome da “dignificação da profissão”.

Apesar dos números avançados pelo SEP, no Hospital de São José, em Lisboa, o cenário no edifício das consultas externas é de aparente normalidade. Há muita gente nas salas de espera, na maior parte dos casos para fazer análises clínicas ou para consultas médicas.

É difícil encontrar quem tenha ficado sem tratamento de enfermagem. Mas Maria da Glória Fernandes, de 76 anos, é uma delas. Vinha mudar um penso na perna e chegou pouco depois das 8h. Já passa das 10h quando sai sem ser atendida. "Uma pessoa espera tanto tempo e não me fizeram o penso. Dizem que há greve e vamos lá ver se amanhã me atendem, que parece que há outra vez", diz ao PÚBLICO, apoiada no braço do marido que a ajuda a encaminhar-se para a saída.

48 a 56 horas semanais
A greve nacional dos enfermeiros foi anunciada no dia 4 de Setembro, depois de um Verão marcado por paralisações isoladas em várias instituições. Na altura, José Carlos Martins, da direcção do SEP, afirmou que o protesto foi “determinado pelo Ministério da Saúde”, por se limitar a dar “respostas políticas” às reivindicações da classe. No Serviço Nacional de Saúde trabalham cerca de 39 mil enfermeiros. Agora, num comunicado sobre a greve, o SEP reforça que "a quase totalidade dos enfermeiros faz entre 48 a 56 horas por semana, está impedida de gozar as folgas que a lei impõe e não se perspectiva quando poderão gozar os milhares de dias em dívida".

Depois do anúncio, o SEP ainda teve dois encontros com o MS, o Ministério das Finanças e a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), mas o diálogo falhou. Na segunda-feira, a tutela ainda apresentou uma proposta que passa por fechar este ano com uma contratação total de cerca de mil enfermeiros e de mais perto de 700 em 2015.

Números considerados insuficientes pelo SEP, com Guadalupe Simões, também da direcção do sindicato, a afirmar ao PÚBLICO que, com esta proposta, “não resta outra alternativa e solução que não seja avançar para a greve de 24 e 25 de Setembro”. Nas contas da dirigente, para o país deixar de ter carência destes profissionais seria necessário contratar mais 6000 enfermeiros para os cuidados de saúde primários e 19 mil para os hospitalares e “estes números não permitem sequer aproximação” nos próximos anos.

Greve afecta utentes
Já do lado da tutela, através de um comunicado da ACSS, foi lamentada a “banalização da greve" perante a disponibilidade demonstrada para negociar. “No último ano, o Ministério da Saúde tem feito um esforço no sentido de reforçar a capacitação do SNS, tendo sido já autorizados cerca de 600 enfermeiros e estando em fase de contratação mais 400 – o que perfaz um total de cerca de mil novos postos de trabalho na área da enfermagem”, dizia a nota, que lembrava que a paralisação iria “prejudicar apenas os utentes do SNS”. A greve afecta tanto os tratamentos prestados pelos enfermeiros nos cuidados de saúde primários como nos hospitais, assim como cirurgias programadas. Tanto as urgências como serviços como a quimioterapia estão assegurados.

Na carta de reivindicações da greve nacional estão inscritos vários problemas que vão da carência generalizada de enfermeiros, à passagem do horário semanal de trabalho de 35 horas para 40 horas e ao número de horas extraordinárias, com os profissionais a revelarem “exaustão”. A harmonização de salários de enfermeiros que na mesma categoria ganham mil e 1200 euros, o atraso na abertura de concursos para a categoria de enfermeiro principal e os pagamentos de incentivos a quem trabalha nas chamadas unidades de saúde familiar nos cuidados de saúde primários, em atraso desde Julho, são outros dos problemas denunciados.

Ainda a este propósito, a ACSS manifestou-se disponível para “harmonizar o regime remuneratório dos enfermeiros” e contrapõe que “foi manifestada a total disponibilidade do Ministério da Saúde para iniciar o processo negocial tendo em vista a celebração de dois acordos colectivos de trabalho no âmbito da carreira de enfermagem”, assim como para “dar início à concretização da progressão dos enfermeiros para enfermeiro principal, mediante a abertura de concursos para postos de trabalho nesta categoria”.

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