Ébola e burocracia roubam alunos ao Nordeste e ao Algarve

Instituto Politécnico de Bragança queixa-se que 20% dos alunos estrangeiros de países fora dos PALOP ainda não conseguiram visto. A Universidade do Algarve também está à espera de estudantes.

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Sobrinho Teixeira, presidente do Instituto Politécnico de Bragança, queixa-se do atraso de estudantes estrangeiros Nuno Ferreira Santos (arquivo)

A crise do ébola está a dificultar o processo de obtenção de vistos de entrada em Portugal para os alunos estrangeiros.

Em declarações ao PÚBLICO, o presidente do Instituto Politécnico de Bragança (IPB), Sobrinho Teixeira, nota que "20% dos estudantes provenientes de países fora dos PALOP e da Europa ainda não puderam chegar". A Universidade do Algarve também está à espera de sete alunos dos Camarões. Além dos obstáculos criados pela crise do ébola em África, o responsável do IPB queixa-se da burocracia e falta de meios no Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) que, segundo diz, também está a colocar muitos obstáculos à entrada dos estudantes estrangeiros no país.

Estudantes dos Camarões, por exemplo, país onde Portugal não tem representação consular, recorriam à Nigéria para obter o visto de entrada em território nacional, mas a epidemia que já fez milhares de vítimas em África levou ao encerramento de fronteiras na Nigéria, impedindo, assim, a chegada dos camaroneses. Existem ainda estudantes da Serra Leoa, Guiné Conacri e Libéria. Entre os 2500 novos alunos no IPB, há cerca de 1200 que chegam do estrangeiro. 

Sobrinho Teixeira admite que tem estado “em contacto com as autoridades de saúde portuguesas”, existindo já um plano que passa “pela monitorização do estado de saúde dos alunos” provenientes desses países. “Foi-nos dito que o vírus é transmissível não no período de incubação mas no período em que se manifesta e em que começa a haver sinais, como febre, pelo que temos de ter essa atenção”, frisou.

Mas não é só o ébola que está a atrasar a chegada de estudantes estrangeiros ao Nordeste Transmontano, que devido ao sucesso dos cursos oferecidos em inglês, tem aumentado a procura. Segundo Sobrinho Teixeira, esta esbarra na “burocracia” e na “falta de meios” do MNE.

“O processo de concessão de vistos está a ser muito custoso. Não é aceitável que alunos que pediram o visto há sete meses continuem fechados numa burocracia dos Negócios Estrangeiros. E pior, na falta de funcionários do MNE, que faz com que o atraso dos vistos seja, neste momento, algo que está a provocar um retrocesso completo na capacidade de captação de alunos estrangeiros”, lamentou Sobrinho Teixeira.

O presidente do IPB lembra que o Governo lançou um programa de captação de alunos estrangeiros, concedeu bolsas, 200 delas atribuídas à instituição de ensino a que preside. Por isso, “não se compreende que todo esse esforço do Governo seja completamente inconsequente pela capacidade que o MNE está a ter em dar vazão aos pedidos que lhe chegam”, reclama.

O IPB vai duplicar a sua oferta formativa em inglês no próximo ano, passando a ter 14 cursos e mestrados ministrados unicamente em inglês. “Obviamente que os cursos de mestrado têm uma dimensão menor mas irão funcionar já este ano com candidatos internacionais, aos quais se juntam os alunos portugueses, que entendem que é uma mais-valia não só ter o mestrado mas tê-lo em inglês, porque abre outras portas, os habitua a comunicar em inglês e lhes permite ter um contacto com colegas internacionais”, explicou ao PÚBLICO Luís Pais, vice-presidente da instituição, que coordena esse pelouro.

Com os atrasos provocados, quer pelo ébola, quer pela burocracia, alguns alunos já perderam o início do ano lectivo, pelo que o IPB tentará integrá-los nos semestres do próximo ano. O PÚBLICO já pediu um esclarecimento ao MNE mas, até ao momento, ainda não obteve resposta.

Principais universidades sem problemas
O problema também se fez sentir na Universidade do Algarve, que continua à espera de sete alunos provenientes dos Camarões, que deviam ter chegado a Portugal em Setembro para fazer um mestrado. O encerramento das fronteiras com a Nigéria impediu-os de conseguir o visto através do posto consular em Lagos. Foram os próprios alunos a contactar a universidade, pedindo ajuda para resolver a situação, que até ao momento ainda não conseguiu ser ultrapassada

O PÚBLICO contactou algumas das instituições nacionais que recebem mais alunos africanos – como as universidades de Coimbra, Lisboa, Minho, Porto e Aveiro –, e em nenhuma tem havido problemas semelhantes aos registados em Bragança. “As Relações Internacionais só notaram um ou outro atraso na emissão do visto a estudantes africanos, mas sempre por suposta insuficiência de documentos no processo”, explica a reitoria da Universidade do Porto.

A esta instituição chegaram, na semana passada, “sem problemas” estudantes provenientes do Senegal, um país que chegou a estar, até ao mês passado, dentro da zona de epidemia considerada pela Organização Mundial de Saúde, apesar de não se ter registado nenhuma vítima mortal do vírus. “Os alunos têm chegado normalmente, tendo-se apenas verificado, à semelhança de anos anteriores, atrasos pontuais por causa dos vistos”, confirma fonte da Universidade de Coimbra, uma informação repetida pelas restantes universidades.

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