As aulas de ilusionismo estão prestes a começar

Esta sexta-feira celebra-se o dia mundial dos mágicos. O PÚBLICO foi a duas escolas e conversou com alguns mágicos para conhecer os seus segredos.

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Espectáculo de magia nos encontros MagicValongo manuel roberto/arquivo

As malas abrem-se: começam a voar cartas, cartolas e “varinhas mágicas”. As aulas de ilusionismo estão prestes a começar. O ilusionismo é uma arte e são necessários alguns truques para aprendê-la.

É no 2.º andar do número 145 na Rua Marechal Saldanha, no Porto, que a magia acontece. Desde o nível de iniciação até ao clube de magia, vários são os alunos que por ali passam para aprender a arte de iludir.

Os estudantes, dos dez aos 73 anos, juntam-se em volta da mesa, coberta por uma toalha azul e colocada em frente ao palco, para aprender como fazer os últimos truques a que assistiram. O gosto e o interesse que os une trouxe-os até ali.

Gonçalo Gil e João Miranda conheceram-se num encontro de magia, o Magic Valongo, e a proximidade de idades permitiu-lhes criar laços de amizade. Em Setembro de 2011 e insatisfeitos com os planos pedagógicos de magia que tinham presenciado até então, decidiram criar um modelo próprio. É assim que nasce a Escola de Magia do Porto.

Com um estilo definido, o principal objectivo é trazer ao público um novo conceito de magia: “Há muito a ideia do mágico da cartola, aquelas coisas mesmo antigas, e queremos desmistificar esse mito, batalhamos contra isso. Quando faço magia, não ando nem de fraque, nem de preto. Invisto um pouco mais na parte humorística e num contexto informal”, explica Gonçalo Gil.

Aprender como se faz
Mais a sul, é sábado à tarde, e a cave da Sociedade Recreativa União Pragalense, em Almada – que se encontra fechada durante toda a semana –, abre as portas para aqueles que têm a ânsia de saber como se faz magia. As paredes do palco cobertas de preto envolvem a atmosfera da sala de mistério e curiosidade.

Oliver Magic surge em 2007 em Cacilhas, impulsionada por Jorge Oliveira, e muda-se em 2010 para as actuais instalações. Após uma pausa de seis meses, a escola reabriu em Setembro de 2013, com a colaboração de Miguel Melo. Actualmente, esta dupla ensina a arte da ilusão. Jorge Oliveira reconhece que quando se trata de adultos, a intenção é dar um certo impulso e orientar o “trabalho de casa”.

“Ser mágico é um trabalho solitário. Cada artista tem a sua imagem e adopta a sua forma de apresentação”, concorda Miguel Melo. Quanto às crianças, o método é ligeiramente diferente. As aulas de ilusionismo são aliadas às aulas de teatro, pois a apresentação é considerada uma componente muito importante no mundo da magia.

Magia na primeira pessoa
Estava a meio de uma conversa sobre magia com os amigos da faculdade. Entretanto, improvisou um truque. Jamais pensou que este episódio iria levá-lo à descoberta de uma nova realidade. Gonçalo Lourenço ou “Mágico” como ficou conhecido no círculo de amigos após o sucedido, nunca se tinha interessado por magia.

No entanto, a sua alcunha despertava curiosidade por parte dos que o rodeavam e o questionavam se realmente fazia magia. Farto de responder “não”, o estudante de Engenharia de Telecomunicações decidiu comprar um baralho de cartas e dar uso ao nome: “Fui ao Youtube aprender um ou dois truques e comecei a abordar pessoas na rua a fazer magia. Desde então que ando todos os dias com um baralho de cartas no bolso”. A paixão foi crescendo e hoje afirma que é uma das coisas que o deixa mais feliz.

“Canal do Mágico” é como intitula a sua página no Facebook e o canal no Youtube, vias que utiliza para a divulgação.

Actualmente, começam a surgir convites para performances em eventos privados. Considera-se um autodidacta e lamenta a falta de divulgação neste campo. “Infelizmente nunca tive aulas nem participei em workshops de magia. Existem muito poucos e normalmente não se tem conhecimento deles facilmente”, confirma.

No outro lado do Atlântico, está Hélder Guimarães. Com quatro anos de idade, deu o seu primeiro espectáculo de magia na escola. Com 12, começou a participar em diversas competições nacionais e internacionais. Com 22 venceu o Ascanio Prize, prémio atribuído pela Sociedade Espanhola de Ilusionismo, e com 26 sagrou-se o Campeão Mundial de Magia. Em 2013, recebeu pela segunda vez consecutiva o galardão Parlour Magician of the Year atribuído pela Academy of Magical Arts em Hollywood, EUA.

Dedica-se à magia a tempo inteiro e as suas performances já passaram por palcos em várias partes do mundo, nomeadamente na Broadway, onde estreou recentemente um espectáculo. Natural do Porto, reside actualmente em Los Angeles e são muitas as diferenças que identifica entre Portugal e os EUA. Por lá encontra "mais oportunidades mas também mais competição". Por isso, apenas trabalhos de grande qualidade acabam por vingar por lá, justifica. "Creio que em Portugal não se procuram trabalhos de excelência, dando visibilidade a coisas que não primam pela qualidade”, acrescenta.

“Se as pessoas dizem que não gostam de magia, é porque ainda não viram boa magia. É tão ridículo alguém dizer que não gosta de magia como alguém dizer que não gosta de música”, conclui.


Ilusionismo sem apoio
Apesar de Portugal já ter tido vários representantes em campeonatos mundiais e alguns terem mesmo arrecadado troféus e medalhas, os apoios parecem ser inexistentes. A Associação Portuguesa de Ilusionismo (API) reúne mágicos de todas as partes do país. Actualmente tem cerca de 150 filiados. No entanto, é impossível calcular quantos são os ilusionistas em Portugal. “Ser mágico sempre foi difícil, mas agora é super difícil”, considera Vitor Alves, presidente da API. O

investimento monetário tem de ser feito a título pessoal. “A aposta é escassa e a logística é pesada. A componente artística está completamente fundida com a questão económica”, lamenta Miguel Melo. “Há falta de oportunidade. Existem investimentos no cinema, na música, no teatro, mas em magia…”, vacila Gonçalo Gil.

Jorge Oliveira recorda que na década de 1990, quando regressou dos EUA onde trabalhava como barman e mágico, as pessoas ainda demonstravam uma certa repulsa para com os ilusionistas em Portugal. Actualmente, apesar de admitir que começa a existir mais aceitação, considera que ainda existe muito a mentalidade de que “é melhor o meu filho ser futebolista”.

Gonçalo Gil explica que os mágicos têm muito pouco tempo para captar a atenção do público: “Quando começamos a fazer magia, os espectadores têm a tendência de tentar ver onde está o truque, 'apanhar o mágico'. Mas depois há um momento em que as pessoas se deixam levar e começam a acreditar no que o mágico está a fazer e desfrutam muito mais do efeito mágico”.

Quanto à criação de truques de magia originais, o mágico constrói uma analogia com a música: “Eu gosto de criar. É como um músico. Depois de termos uma base sólida, queremos criar as nossas próprias magias”.

Ser um mestre da ilusão em Portugal não é fácil e o mercado nem sempre está disponível para todo o tipo de espectáculos. Por vezes a busca de oportunidades maiores, leva à necessidade de emigrar, garante Gonçalo Gil. Ainda assim, os conselhos não variam entre os vários ilusionistas: deve estudar-se bastante, ler os livros certos e a dedicação é fundamental.

Não é qualquer um que pode ser mágico. Porque não é só saber fazer truques de magia, é necessário saber apresentá-los, saber ser um entertainer. “Saber fazer truques e fazer magia são coisas diferentes”, afirma Gonçalo Gil. Hélder Guimarães corrobora: “Acho que as pessoas que realmente se convertem em mágicos extraordinários não necessitam de conselhos. E normalmente, em vez de ambição, essas pessoas têm apenas o prazer de fazer o que fazem. E isso é o essencial.”

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