Dos títulos ao conteúdo dos textos

A utilização deste canal (provedor/jornal/jornalista) não é uma caixa de queixas e queixinhas, mas um contributo válido para que jornal e jornalistas corrijam os seus próprios erros ou desvios.

Não é a primeira vez que trato deste assunto. Aliás, anteriores provedores deste jornal foram obrigados a escrever sobre este tema. Não raras vezes, os títulos “atraiçoam” o conteúdo do texto. Nalguns casos, o texto nem comporta a informação a que o título faz referência ou então alteram o contexto ou os próprios dados referenciados no corpo do artigo.

Um dos primeiros provedores de imprensa, o jornalista e professor Mário Mesquita, (ex-provedor do Diário de Notícias), referia-se a este assunto como “a arte dramática de bem titular”. Efectivamente, titular, na prática jornalística, é uma arte. Um título tem de resumir, condensar, a informação contida no texto. Por outro lado, tem ou tende a assumir um carácter sedutor. Isto é, o título pretende “assediar” o leitor à leitura da notícia ou do artigo e até, no caso das primeiras páginas, levar o leitor à compra do jornal. E, hoje, sobretudo, nas páginas online, não é só o título, mas a própria súmula dos artigos ou notícias, que visam essa dupla função: resumir e seduzir. Acontece muitas vezes que não são os jornalistas autores do texto que fazem os títulos. São os editores ou os responsáveis pelo fecho de uma edição, embora a “acusação” recaia sobre o jornalista que assina o texto.

Obviamente, sem deixar de recomendar que esta prática – que se percebe numa intenção de que jornalismo sem suscitar interesse, adesão, da parte dos leitores, é, de certo modo, coxo, porventura, pouco atraente e também redutor – terá de ser coerente, cumprir regras e não adulterar o supremo compromisso de não enganar ou iludir os leitores. No Correio dos Leitores/Provedor, que, habitualmente, incluo nesta página, tenho referido alguns exemplos, como ainda hoje o faço. Admiro o procedimento de alguns leitores que me dizem: provedor, não é preciso referir este meu comentário ou discordância. Transmita-o simplesmente aos jornalistas visados. E assim tenho procedido, pois acho que esta atitude de um leitor ou leitora significa a assunção de que a utilização deste canal (provedor/jornal/jornalista) não é uma caixa de queixas e queixinhas, mas um contributo válido para que jornal e jornalistas corrijam os seus próprios erros ou desvios incompatíveis com um jornal que se proclama de qualidade, como é o caso do PÚBLICO.

 

CORREIO LEITORES/ PROVEDOR


Ciência vs. pseudociência

Alguns leitores escreveram-me a solicitar que o PÚBLICO deveria abrir, nas suas colunas, um debate sobre a homeopatia. Segundo estes leitores, o PÚBLICO tem dado a palavra, muito especialmente, sobre este tema aos cientistas que tomam posição de “negação dogmática” acerca da homeopatia. Um desses leitores insurge-se mesmo, de algum modo, contra aquilo que classifica de parcialidade do PÚBLICO. E numa carta da qual resumo apenas algumas passagens diz:

“É sempre engraçado quando um jornal perde a imparcialidade. Ultimamente estranho que o PÚBLICO ataque tanto as homeopatias, as supostas 'pseudociências', quase não permitindo a expressão dos epistemólogos e dos historiadores de ciência.” Escreve o leitor que, “sem querer defender gurus e 'terapeutas'", entende, todavia, que não deve o PÚBLICO acolher posições somente de um lado. “E o PÚBLICO, que tem publicado vários artigos de cientistas mas infirmado a possibilidade de dar luz aos conceitos anteriores – pergunto-me porque nunca se publicou um artigo sobre as 'origens' do conceito/método científico, bem como algo alusivo às epistemologias de Popper, Lakatos, Kuhn, etc. –, e que agora vem trazer 'à luz' a carta aberta dos cientistas, também vem contribuir para o exercício parcial da ignorância." E mais adiante, afirma: “Sim, é verdade que muitas pseudociências são charlatanices, mas, nesse exercício, também a Ciência (no sentido moderno do termo) tem muitas contas a prestar. Esta nova atitude persecutória por parte dos 'cientistas' parece-me pouco científica, pouco rigorosa, muito pseudocientífica. Pergunto-me: será a ciência um novo ópio?” (...)

Aqui deixo expresso ao PÚBLICO o pedido dos leitores.

 

A diferença entre “os” funcionários públicos e “alguns”

A propósito do artigo “Funcionários de empresas públicas são os que mais aceitam subornos internacionais”, publicado na edição de 03/12/2014, pág.19, vem um leitor chamar a atenção para muitas dúvidas que lhe suscitou o suporte notícia deste artigo, ou seja, o Relatório da OCDE sobre Suborno Estrangeiro. Uma Análise do Crime de Corrupção de Assalariados Públicos Ligados a Negócios Estrangeiros.

 

Escreve o leitor: “O artigo merece-me os seguintes reparos:

1 – Confronte-se o título da notícia, 'FUNCIONÁRIOS DE EMPRESAS PÚBLICAS SÃO OS QUE MAIS ACEITAM SUBORNOS INTERNACIONAIS' com o do relatório 'CRIME DE CORRUPÇÃO DE ASSALARIADOS PÚBLICOS LIGADOS A NEGÓCIOS ESTRANGEIROS': parece-me que, enquanto o título da OCDE é informativo, o do jornal é programático/ideológico/tendencioso. Tentarei explicar porquê abaixo.

2 – (...) O uso, abusivo em minha opinião, de pronomes definidos (os), demasiado generalizantes" – o leitor dá vários exemplos – “quando devia ter usado a forma indefinida (alguns) ou enumerar os crimes, os que foram mesmo muito poucos (ex., dois ou três chefes de Estado). (...)

3 – (...) O jornalista muitas vezes sugere que tudo são subornos consumados, mas o relatório da OCDE também se refere a tentativas apenas de suborno. No relatório, a palavra subornos vem sempre acompanhada de prometidos, oferecidos ou dados. (...) 'Dado que um terço dos 427 casos foram descobertos por denúncia dos actores do processo, é de deduzir que sejam em número significativo os subornos apenas tentados e não aceites, i.e., denunciados.'

4 – Sobre o destaque da notícia: 'OCDE indica Portugal como um dos países em que houve casos de corrupção de elementos do Estado por pessoas ou entidades estrangeiras'. (...)

No relatório, o nome Portugal aparece apenas uma vez, numa legenda de um mapa de 66 países em que houve casos de corrupção. Ao lado de países tão populosos como Rússia, USA, Brasil, China Índia e Indonésia. Atendendo à pequenez do nosso país, sou levado a supor que não nos pertencerão mais que três ou quatro dos 427 casos mundiais. (...)

5 – (...) O texto refere-se várias vezes a funcionários públicos, quando o relatório da OCDE refere 'assalariados públicos' – funcionários públicos ou não –, e apenas aos 'ligados a negócios com o estrangeiro'. (...) Três ou quatro casos de corrupção em 15 anos, em meio milhão de funcionários públicos portugueses, parece-me que não é muito. O artigo deveria ter tido mais cuidado em não induzir o leitor a generalizações grosseiras.

6 – Legenda da figura: 'A média registada foi de 11 milhões de euros por suborno.' (...) Se retirássemos o maior suborno, a média desceria dos 11 milhões para 5,8 milhões de euros. Se retirássemos sucessivamente os 2.º, 3.º mais altos, as médias desceriam cada vez mais. Apenas se pode presumir que uma pequena minoria dos agentes 'abocanharam' a grande maioria do dinheiro e o inverso, que uma grande maioria dos casos de corrupção implica valores modestos ou até ridículos como os 1dez euros referidos.”

 

Sair ao Teatro

Pede-me uma leitora para sugerir à secção Sair da agenda de espectáculos do PÚBLICO que, em relação à informação sobre as peças em exibição nos teatros, seja dado o mesmo destaque dado aos cinemas e aos filmes aí exibidos. Concretamente, sugere a leitora que, para além do encenador, seja indicado o autor da peça e uma lista mais completa dos actores. O Teatro merece.

À consideração do PÚBLICO.

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