Direitos das mulheres com "maior recuo" desde o 25 de Abril

Avaliação feita pela PpDM da Plataforma de Acção de Pequim conclui que continuam a existir restrições à capacidade civil, livre arbítrio e reserva da intimidade.

Foto
Continua por eliminar a disparidade de género no emprego, no trabalho remunerado e não remunerado Adriano Miranda

Os direitos fundamentais das mulheres enfrentam o maior recuo desde o 25 de Abril, defende um colectivo de organizações, para o qual a igualdade de género não é considerada de forma séria. O maior desafio está nas mentalidades, defendem.

A avaliação é feita pela Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres (PpDM), num relatório onde analisam os 20 anos da Plataforma de Acção de Pequim, aprovada em 1995, no decorrer da Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, e que se traduziu no quadro de políticas mais amplo tendo em vista a igualdade de género, o desenvolvimento e a paz.

Em comunicado, a PpDM sublinha que, apesar das várias conquistas e dos progressos feitos, "os direitos fundamentais das mulheres enfrentam o maior recuo de sempre desde o 25 de Abril de 1974, no que respeita às restrições à sua capacidade civil, ao seu livre arbítrio e à reserva da sua intimidade que constitui a aprovação das alterações à legislação sobre a IVG [Interrupção Voluntária de Gravidez] ". 

Por outro lado, entendem que a igualdade de género não é considerada de forma séria e lembram que as previsões apontam para que, na ausência de medidas estruturais, "serão necessários mais de 100 anos para eliminar a disparidade de género no emprego, no trabalho remunerado e não remunerado".

Para a PpDM, os estereótipos de género persistem e estão presentes em todas as esferas da sociedade. "Estereótipos que moldam brinquedos, influenciam as escolhas, impedem mulheres de acederem a alguns empregos, e cargos de tomada de decisão, concentram sobre as mulheres a maioria do trabalho na esfera do privado e do cuidado, que têm impacto na saúde das mulheres e das raparigas, que legitimam a violência e o sexismo diário, que veiculam mensagens sobre o papel das mulheres na sociedade", ressalvam.

O maior desafio continua a ser a mudança de mentalidades, sublinhando que apesar de a legislação ser fundamental, "não é suficiente e deve ser acompanhada por uma forte vontade política e acções promotoras de uma mudança real". Alertam também para o facto de os "sistemáticos decréscimos nos programas de apoio e cortes orçamentais" ameaçarem a existência das organizações de defesa dos direitos das mulheres.

Aproveitam a avaliação para fazerem um conjunto de exigências, nomeadamente que Portugal cumpra integralmente os compromissos internacionais assumidos ou que a elaboração do Orçamento do Estado seja feita tendo em conta uma afectação de recursos que garanta uma efetiva promoção da igualdade de mulheres e homens.

Pedem a paridade na tomada de decisão a todos os níveis, uma linguagem institucional inclusiva, uma análise feminista, em todas as políticas públicas, das relações hierarquizadas de poder e um conhecimento da realidade, através de dados qualitativos e quantitativos que permitam caracterizar a situação em todas as áreas críticas.

Querem igualmente que seja promovida a formação e informação de todos os agentes do Estado sobre as questões dos direitos das mulheres, inclusive na formação obrigatória para ingresso na administração pública, bem como mais cooperação entre o Estado e as organizações de direitos das mulheres.

Por último, pretendem que seja dado apoio financeiro e técnico às organizações não-governamentais de direitos das mulheres, inclusivamente à própria PpDM, já que se trata da única plataforma de organizações de mulheres existente em Portugal.

Estas e outras conclusões são divulgadas este sábado no decorrer do seminário "Das palavras à [monitoriz]ação: 20 anos da Plataforma de Acção de Pequim na perspectiva das organizações de mulheres em Portugal, que decorre no Centro Maria Alzira Lemos, em Lisboa.

Sugerir correcção
Comentar