Direita ficou "excitadíssima" com Maria de Belém

Correia de Campos diz que Maria de Belém escolheu uma "trajectória de colisão" com o PS

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Rui Gaudêncio

O ex-ministro da saúde, António Correia de Campos, afirma, em entrevista ao PÚBLICO, que ninguém acredita que os juros da dívida vão baixar para menos de metade, como o Governo "argumenta". E repete que os nossos governantes se portaram em Bruxelas como "panhonhas".

PÚBLICO: Escreveu, no início do ano, que o PS tinha que acordar? Acordou?
António Correia de Campos: Acordar, acordou (risos), mas entretanto houve outros acontecimentos. A maioria conseguiu capitalizar nas décimas. Quando se bate no fundo, para se voltar à superfície, começa-se por ganhar uma décimas, só que eles transformaram as décimas em unidades. A partir daí, tem sido a propaganda bem organizada, uma tentativa de omissão do passado, um simplismo condenatório do PS . [Do outro lado] há todos os problemas ligados a uma liderança nova, uma necessidade de substituir pessoas e  ainda o caso José Sócrates. Mas é a primeira vez que se apresenta um programa económico quantificado.

Disse que na Comissão Europeia não fomos capazes de bater o pé. Até escreveu que os nossos governantes se portaram em Bruxelas como panhonhas.
Exactamente. O doutor Durão Barroso já passou à história e não ficou provavelmente na história. Fiquei várias vezes envergonhado com ele, com as suas mudanças de posição, quando a senhora Merkel dizia outra coisa...[De resto], os nossos governantes calaram-se. Nunca exigiram prolongamento [da dívida] nem prazos mais confortáveis, nem juros mais baixos. O que se passa agora é que, de acordo com as projecções do Governo, vamos chegar ao fim deste ano ainda com um maior aumento da dívida pública  e depois o Governo argumenta que os juros vão baixar para menos de metade. Ninguém acredita.

O futuro ainda vai ser mais complicado?
A governação não vai ser fácil, porque estes sintomas de melhoria que estão a ser fortemente amplificados pelo Governo podem não se concretizar. Vamos ter muito provavelmente a sorte de o euro e o petróleo se manterem baixos, mas ninguém sabe o que vem do cataclismo da China.  

Não está preocupado com últimas sondagens para as eleições legislativas?
O PS está a lutar contra dois acumulados, mas fica muitos pontos acima do PSD e muitíssimos pontos acima do CDS. Sendo o partido mais votado, a coligação desfaz-se e o PS ficará uma espécie de king maker, sempre na situação de controlar o jogo.

No caso da vitória do PS, acha possível um regresso ao bloco central?
Em teoria o bloco central é sempre possível. Mas no passado isso foi mais fácil do que será agora, porque neste momento os dois programas são muito diferentes, o do PSD não é social democrata, é da direita liberal, houve uma deriva direitista do PSD, até mais para além do CDS, que tornou qualquer acordo posterior mais difícil. O bloco central foi possível em 1983 porque havia duas pessoas que se estimavam muito, tinham respeito mútuo, Mota Pinto e Mário Soares.

O que pensa da candidatura de Maria de Belém à Presidência da República?
A doutora  Maria Belém escolheu uma trajectória de colisão com o PS. Escolheu o dia em que António Costa dava uma entrevista importante, sabendo que iria retirar protagonismo a essa entrevista. E quem é que a apoia?  São os seguristas, os excluídos das listas parlamentares, depois mais uma ou outra pessoa, o Manuel Alegre. Repare no regozijo da direita pelo seu aparecimento, ficou tudo excitadíssimo. Mas não haja ilusões. Ela sabe bem que um grande resultado eleitoral do PS representa a sua retirada e que um mau resultado do PS representa mais um pouco de esperança para se manter até ao fim.

É possível que haja um Portugal um partido que junte toda a esquerda?
António Costa tem grande qualidades de negociador, agora não sei se consegue fazer isso. Não tenho uma bola de cristal.

Quantas vezes visitou José Sócrates na prisão?
Três vezes. Da última vez encontrei-o muito bem. Fisicamente melhor, antes estava mais magro, mais nervoso. Desta vez estava preocupado, emocionando-se quando falava da família, lamentando, por exemplo, não ter podido acompanhar o filho mais velho que vai estudar para uma universidade no estrangeiro.

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