Detidos do escândalo dos selos serão ouvidos hoje pelo tribunal

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Vários investidores da Afinsa estiveram ontem em Madrid Pedro Armestre/AFP

Os nove detidos na investigação da Afinsa e Fórum Filatélico, sociedades de investimento em bens tangíveis – filatelia, obras de arte, numismática e antiguidades – começam hoje a ser interrogados na Audiência Nacional da capital espanhola. Também hoje, responsáveis do Ministério da Saúde e Consumo de Espanha, que tutela o sector, reúnem-se com representantesdos governos regionais para estudar a alegada fraude.

Entre os detidos que hoje são ouvidos pelo juiz Santiago Pedraz, que se ocupa da investigação, estão o presidente de honra da empresa, o português Albertino de Figueiredo, o seu filho Carlos de Figueiredo Escribá, e o presidente Juan António Cano Cuevas. O magistrado interrogará também Francisco Guijarro López, empresário do sector filatélico, em casa de quem, num esconderijo, foram encontrados 10 milhões de euros em notas de 500. O cheiro a estuque fresco, detectado pelos agentes denunciou um buraco recente numa parede. Todos os detidos têm permanecido desde terça-feira nas instalações da polícia de Canillas, em Madrid.

Para além dos interrogatórios, os magistrados têm em agenda a nomeação de interventores judiciais antes de declararem uma possível insolvência. Caberá ao interventor nomeado pela Justiça a elaboração de um relatório sobre o estado das contas e a situação patrimonial da Afinsa e do Fórum Filatélico. Os dois juízes da Audiência Nacional terão ainda de decidir sobre a possível responsabilidade penal e civil dos responsáveis das sociedades. E, por fim, concluir a investigação da documentação apreendida durante as buscas efectuadas no âmbito da operação Átrio, uma acção que envolveu cerca de 300 agentes de vários serviços policiais, entre os quais um perito britânico em avaliação de selos.

Os primeiros cálculos da investigação indicam que entre as duas sociedades poderia existir a cinco mil milhões de euros. A existência de desfasamentos na contabilidade da Afinsa, segundo a imprensa espanhola, terá sido mesmo detectada pela auditoria da Gestynsa. Em causa estariam as existências de filatelia da sociedade, pois a Afinsa não teria justificado as facturas de compra. Uma situação que a Afinsa contesta. Juan José Martin, responsável de comunicação da sociedade,

afirmou que o património da empresa é suficiente para fazer frente a todas as obrigações e que os clientes poderão recuperar o dinheiro, quando os juízes desbloquearem as contas. Em declarações à agência EFE, Martin negou também notícias sobre o fim da apólice de seguros da Lloyds britânica. Explicou que os selos estão no seguro e precisou que a apólice cobre riscos como incêndio ou inundação, mas não obriga a seguradora a devolver aos clientes as poupanças investidas.

Governo quer mudar lei

A opinião que não é unânime no sector da filatelia. “Ainda que o valor do selo tenha sempre tendência a subir, ninguém pode garantir uma revalorização de seis por cento”, referiu Pedro Ayala Díaz, da direcção da Associação Nacional de Empresários de Filatelia e Numismática. Segundo Diaz, as sociedades agora investigadas “utilizam o selo como referente da sua actividade, mas este não é o centro dos seus investimentos; é impossível que o investido por 350 mil pessoas esteja no mercado filatélico, ainda que se mova por todo o mundo”. Por isso, sublinhou: “Embora não nos conste que estas actividades sejam uma fraude, as pessoas têm de saber onde investem e como funcionam estas empresas.”

O Governo admitiu ontem ter iniciado os trabalhos para rever a Lei de Investimentos Colectivos de 2003 da qual dependem as actividades promovidas por sociedades como Afinsa e Fórum Filatélico. “Não é todo o sector que está afectado pelo escândalo, apenas duas empresas, mas há que reconsiderar a situação”, referiu a directora-geral do Consumo. É que, segundo a legislação em vigor, os investimentos colectivos são considerados bens de consumo e não produtos financeiros. Razão pela qual o Banco de Espanha ou a Comissão Nacional do Mercado de Valores não têm a tutela sobre aquela actividade, pelo que não vigora o fundo de garantia bancário e os investidores, em caso de perdas, não podem contar com apoio do Estado.

Contudo, como as competências sobre saúde e consumo estão delegadas em Espanha nas Comunidades Autónomas, cabe aos governos regionais o acompanhamento desta actividade – algo que muitos executivos autonómicos querem rever. Hoje vão defender junto do Governo central que a competência, nestes casos, não seja exclusiva das Comunidades.

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