Dadores de esperma e óvulos vão ser recrutados em banco público no Porto

Foto
A ideia é começar pela colheita e criopreservação de espermatozóides Fernando Veludo

Se alguma vez lhe passou pela cabeça doar esperma ou óvulos a casais que estão impossibilitados de ter filhos, vai poder fazê-lo em breve. Mais de três anos depois de ter sido oficialmente anunciado, o banco público de esperma e de óvulos doados por terceiros tem finalmente luz verde da tutela para avançar.

A instalar no Centro Hospitalar do Porto (que integra o Hospital de Santo António e a Maternidade Júlio Dinis), o banco vai proceder ao recrutamento e selecção de dadores de esperma e de ovócitos para dar resposta a muitos casais que não dispõem de células reprodutivas próprias - estima-se que cerca de dez por cento dos casais inférteis estão nesta situação.

Até agora, os centros que fazem procriação medicamente assistida (PMA) em Portugal têm sido obrigados a recorrer a gâmetas de outros países, importando sobretudo esperma. A ministra da Saúde já tinha anunciado, em 2008, que o banco ia avançar, mas os passos necessários arrastavam-se. Em Janeiro passado, o Bloco de Esquerda viu aprovado, na Assembleia da República, um projecto de resolução que recomendava ao Governo a criação urgente desta estrutura.

Mas por que motivo se optou pelo Norte? "O Centro Hospitalar do Porto candidatou-se, foi aprovado pelo Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida [CNPMA] e tem condições para arrancar desde já", justifica o secretário de Estado adjunto e da Saúde, que assina o despacho de autorização de criação do banco, hoje publicado em Diário da República.

O objectivo é ambicioso: com um financiamento da ordem dos 200 mil euros no primeiro ano, proveniente do programa público da PMA, esta estrutura deverá começar por responder às necessidades do Centro de Medicina de Reprodução da Maternidade Júlio Dinis, onde está instalado, para gradualmente ir fornecendo células reprodutivas para outras unidades, públicas e privadas.

A ideia é começar pela colheita e criopreservação de espermatozóides para "uso interno" e, quando se atingir um volume suficiente, poder fornecer outros centros, adianta a directora do Centro de Medicina de Reprodução, Joana Guimarães. No caso das mulheres, como os ovócitos são colhidos "a fresco", o que se pretende é ter uma pool de potenciais dadoras, explica a directora do banco público, Isabel Pereira Sousa.

Mas o processo será sempre demorado. Mesmo que os dadores começassem a ser recrutados nos próximos dias, os resultados práticos só se veriam passados seis meses, pois há um período de quarentena obrigatório para confirmar se está tudo bem e despistar eventuais infecções.

Elas recebem mais

Os dadores vão receber uma compensação financeira pelo tempo perdido e pelo incómodo, não um pagamento, acentuam os responsáveis pelo projecto. O valor desta compensação é calculado com base ao indexante de apoios sociais, como propôs o CNPMA, e ronda os 42 euros, no caso da doação de esperma, e os 628 euros para a doação de ovócitos. A diferença justifica-se: as dadoras têm de ser sujeitas a tratamentos de estimulação ovárica com possíveis efeitos secundários e eventuais riscos para a saúde.

A falta de definição de uma política concreta quanto à compensação a dar aos dadores também contribuiu para atrasar este processo, que era reclamado desde o final de 2009 pelo CNPMA, com o argumento de que era necessário "assegurar o acesso equitativo da população a uma técnica apenas realizada em regime privado".

Para Alberto Barros, que criou em 1985 o primeiro "banco de esperma" do país, na Faculdade de Medicina do Porto (que foi entretanto transferido para a Unidade Médica de Reprodução do Hospital de S. João), esta nova estrutura não vem acrescentar nada ao que já existe no S. João. Mas Alberto Barros admite que o director de um centro público tem "uma capacidade de divulgação muito maior". É que, quando se tentou fazer um apelo à dádiva no S. João, não apareceram candidatos.

Sugerir correcção
Comentar