Criador do Tugaleaks detido por ataque informático à Procuradoria de Lisboa

Fundador do portal tem cartão de equiparado a jornalista, mas Judiciária suspeita que se dedicava à pirataria. Mais seis pessoas foram detidas em buscas em Lisboa e Porto. Detidos estarão ligados aos Anonymous.

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PAULO PIMENTA/ARQUIVO
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Rui Cruz, criador do site Tugaleaks DR

A Polícia Judiciária (PJ) deteve na manhã desta quinta-feira o criador do site Tugaleaks, Rui Cruz, no âmbito de uma investigação a vários ataques informáticos, dois dos quais visaram a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa (PGDL) em Abril e Junho do ano passado.

Um dos ataques, a 25 de Abril, tinha sido reivindicado pelos Sudoh4k3rs, um grupo ligado ao colectivo Anonymous, tendo os contactos pessoais e profissionais de quase dois mil procuradores sido divulgados na Internet. Na altura, foram também expostas online as suas palavras-chave de acesso ao sistema informático do Ministério Público. Esta investida dos hackers foi desde logo divulgada no site Tugaleaks, que está registado como órgão de comunicação social.

O mesmo aconteceu com outro ataque à PGDL em Junho do ano passado, no qual os OutsideTheLaw alteraram a homepage da procuradoria. As investidas eram justificadas pelo grupo com mensagens em que diziam defender a liberdade de expressão. Quando os piratas descobriram que os ataques estavam a ser investigados pelo procurador Pedro Verdelho, do gabinete do cibercrime da Procuradoria-Geral da República, colocaram na Internet uma fotografia do magistrado com a família.

Uma das buscas da Judiciária nesta quinta-feira decorreu precisamente em casa de Rui Cruz, na área da grande Lisboa, que serve também de sede daquele site. Devido à criação deste portal, Rui Cruz é detentor de um cartão que o equipara a jornalista. A polícia suspeita, porém, que desenvolva também actividades relacionadas com a pirataria informática. Em alguns casos terá agido como instigador dos ataques e noutros terá mesmo colaborado.

A operação da Judiciária incluiu 24 buscas em Lisboa e no Porto, tendo sido detidas mais seis pessoas além do fundador do Tugaleaks, uma das quais do sexo feminino. Ao início da noite desta quinta-feira, os inspectores ainda realizavam diligências no sentido de reunirem indícios fortes que serão esta sexta-feira apresentados pelo Ministério Público no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, onde os suspeitos serão ouvidos por um juiz para a aplicação das medidas de coacção. Com idades entre os 17 e os 40 anos, os detidos são suspeitos dos crimes de acesso ilegítimo, dano informático e sabotagem informática.

Foram ainda constituídos outros 14 arguidos face a suspeitas de envolvimento nos crimes nesta operação à qual a Judiciária deu o nome de código C4R3T05 (Caretos), numa alusão à típica máscara que simboliza os Anonymous.



Material de trabalho de Rui Cruz numa foto de 2014 no Facebook

As buscas ocorreram menos de um mês depois de o Ministério Público ter arquivado um processo contra Rui Cruz por alegada violação de correspondência ou telecomunicações. O fundador da página Tugaleaks declarou então que iria pedir uma indemnização pelos “graves problemas financeiros” causados pela apreensão de material informático, incluindo um portátil, durante os quase três anos do processo. Essa acção da Judiciária realizou-se em 2012 também em casa de Rui Cruz e os investigadores continuaram até agora a seguir todos os seus passos online.

Foi já em Abril do ano passado que os inspectores especializados no combate ao crime informático começaram a investigar os “ataques informáticos a servidores que alojam sites do Ministério Público, da Polícia Judiciária, do Conselho Superior da Magistratura, da EDP e da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista”, adianta um comunicado da Procuradoria-Geral da República. Além dos ataques a sistemas do Estado, a Judiciária acrescenta que também foram afectados os servidores de “empresas relevantes do sector privado”. Na “vasta operação de combate à criminalidade informática e tecnológica” que resultou, segundo um comunicado da polícia, de uma “estreita articulação com o gabinete do cibercrime da Procuradoria-Geral da República”, trabalharam 70 funcionários “altamente especializados”.

O que terá motivado os suspeitos? Segundo o coordenador de investigação criminal da Judiciária Carlos Cabreiro poderá ter sido “exclusivamente o êxito pessoal”.

A Comissão da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, que não vê com bons olhos a equiparação deste tipo de blogs a órgãos de comunicação social, tinha suspendido há algum tempo a certificação profissional a Rui Cruz. “A Entidade Reguladora para a Comunicação Social entendeu rotular o Tugaleaks como órgão de comunicação social, o que nos criou muitas reservas”, observa o presidente da comissão, o juiz Pedro Mourão. “Na sequência disso tivemos de lhe entregar uma carteira profissional equiparada a jornalista. Mas não foi caso único, há imensas situações idênticas. E isto não pode continuar, não se pode continuar a decidir com tanta ligeireza”. Pedro Mourão não revela por que razão havia suspendido a carteira a Rui Cruz, mas refere-se ao seu comportamento como sendo quezilento e um pouco estranho. A sua detenção por ligações à pirataria informática não o surpreendeu: o juiz conta que na véspera de o site da comissão ser atacado por hackers, no início deste mês, o fundador do Tugaleaks tinha telefonado para este organismo a perguntar se tinham problemas no sistema informático. com Ana Henriques

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