Créditos do ministério beneficiam escolas de contextos mais favorecidos

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enric vives-rubio

A atribuição de créditos horários às escolas como modo de recompensa pelos ganhos obtidos é uma prática nova, sem muito histórico. É também uma prática que comporta o inconveniente de apoiar pontualmente as escolas que melhoram o seu desempenho: por um lado, o apoio é anual e premeia uma dada melhoria pontual; por outro, deixa de lado o mérito de escolas que vão melhorando progressivamente o seu desempenho, mesmo em contextos difíceis e fruto de estratégias pedagógicas sustentadas ao longo de anos de intenso trabalho.

Finalmente, estes créditos geralmente são comunicados já o ano lectivo está em marcha, o que dificulta uma cuidada distribuição do excedente de horas pelos docentes mais aptos a desempenhar as funções que a escola determinar.

A análise está fortemente limitada pelo facto de dispormos de resultados deste ano e de prémios atribuídos em função dos resultados do ano anterior. Em todo o caso, entendemos que seria de proceder a uma análise global dos dados fornecidos pelo MEC.

Em termos estatísticos, primeiro analisámos o número de agrupamentos que receberam créditos dos vários tipos, tendo feito essa análise por contexto. Depois analisámos, também por contexto, algumas variáveis que possam justificar as discrepâncias observadas — média da discrepância entre a nota interna (CIF) e a nota de exame (CIF-Exame), taxa de conclusão do 12º ano, média da diferença entre a média da escola e o valor esperado do seu contexto (VEC), e melhoria face ao ano anterior. Estas médias não foram calculadas por agrupamento, mas por escola.

Os resultados desta análise para o ensino secundário encontram-se na tabela seguinte.

Verificamos que as escolas do contexto 3 (o socioeconomicamente mais favorável) são as que apresentam em média menores disparidades entre classificações internas e notas de exame e, ao mesmo tempo, maiores taxas de conclusão do 12.º ano. São, contudo, também as escolas que apresentam menores melhorias (calculada por referência ao VEC: (mdt+1 – mdt) /(VECt+1 – VECt)) entre o ano passado e este ano. Em todos os contextos socioeconómicos em média as escolas apresentam médias inferiores ao esperado, mas a diferença face ao esperado é maior no contexto 1, onde as escolas estão em média mais abaixo daquilo que seria expectável para o seu contexto.

Analisando o número de agrupamentos que, de acordo com o MEC, superam os vários critérios, verificamos que apenas 13 agrupamentos do contexto 3 superam o critério “média dos exames acima dos limiares de sucesso”. Este facto parece justificar-se pelas notas médias mais elevadas neste contexto (ver tabela com médias por contexto) já que, em termos de diferenças face ao expectável (Md-VEC), verificamos que os contextos 2 e 3 não são em média muito distintos, pelo que seria expectável um número semelhante de escolas a obter créditos nestes dois contextos.

Relativamente ao critério “coerência entre médias internas e exames”, o MEC favorece mais uma vez as escolas do contexto 3, onde 67 são identificadas como superando este critério, e menos de 30 escolas superam este critério nos contextos 1 e 2. Verificamos de facto que as escolas no contexto 3 são as que apresentam em média menos discrepâncias entre notas internas e notas de exame, pelo que o benefício neste caso parece justificar-se.

Relativamente ao “critério evidência de melhoria no secundário” o MEC identifica um número semelhante de escolas nos três contextos, mas muito baixo (quatro escolas no contexto 1 e seis nos contextos 2 e 3). Esta distribuição semelhante pelos três contextos, não é suportada pela análise dos dados de melhoria face ao ano anterior onde, em média, observamos que as escolas dos contextos 2 e 1 são as que apresentam maiores melhorias. De notar que no nosso caso a melhoria foi ‘normalizada’ pelos valores do VEC, enquanto o ministério normalizou pelos valores esperados nacionais. A não consideração do contexto em que a escola se insere pode estar a influenciar e enviesar a análise do MEC.

A análise para o ensino básico resultou na seguinte tabela.

Mais uma vez, as escolas que mais melhoram em média relativamente ao ano anterior são as do contexto mais desfavorecido (1). As escolas do contexto mais favorecido (3) são aquelas que apresentam menores discrepâncias entre as notas internas e as notas de exame, e também, em média, as maiores taxas de conclusão. Também as escolas do ensino básico apresentam no geral médias abaixo do esperado para o seu contexto, sendo que as escolas do contexto 1 são aquelas que em média se encontram mais abaixo do esperado.

Relativamente aos agrupamentos que superam os critérios para atribuição de créditos por parte do MEC, os do contexto 3 são mais uma vez aqueles que o MEC identifica como cumprindo o critério “média dos exames acima dos limiares de sucesso”, já que a 21 agrupamentos deste contexto são atribuídos créditos, e apenas a 2 agrupamentos do contexto 2 tal é feito. Os argumentos traçados em cima parecem aplicar-se aqui também, já que de facto as escolas do contexto 1 parecem estar em média mais aquém do esperado (em termos de VEC), mas as escolas do contexto 2 e 3 não parecem distinguir-se neste critério.

Relativamente ao critério “coerência entre médias internas e exames”, também neste caso as escolas no contexto 3 são as que apresentam em média menos discrepâncias, pelo que o beneficio neste caso parece adequado.

Relativamente ao critério “evidência de melhoria no básico”, o MEC atribui créditos de forma mais ou menos equitativa a agrupamentos de cada contexto. Contudo, o contexto 1 é o que apresenta maior evidência de melhoria entre o ano passado e este ano, pelo que não é compreensível a razão pela qual não encontramos mais escolas do contexto 1 superando este critério.

Relativamente ao critério “redução de alunos em abandono”, pouco pode ser referido já que não dispomos dos dados relativos às taxas de abandono das escolas. Apraz-nos verificar que um número considerável recebeu créditos por este critério, já que esta é uma chaga do nosso sistema escolar, que importa combater.

Outro dado geral relevante, inscrito na política que subjaz a estes prémios, reside no facto de a sua atribuição beneficiar as escolas do Contexto 3, que são sempre mais do dobro das escolas do Contexto 1 (115 para 46 no ensino secundário e 146 para 67 no ensino básico).

Esta nossa análise foca-se nos grandes números, enquanto o MEC fez avaliações caso a caso, pelo que as discrepâncias encontradas podem ter razão de ser. Contudo, quando analisamos ao detalhe as escolas secundárias em alguns critérios, verificamos, por exemplo, que as escolas que mais melhoraram este ano face ao ano anterior não foram, no geral, aquelas que obtiveram este crédito no ano passado. Tal discrepância pode dever-se ao desfasamento temporal dos dados, ou ao facto de o MEC não ter em conta o contexto das escolas no cálculo do seu valor esperado.

Até os estímulos à melhoria do desempenho das escolas carecem de melhorias. O importante é não pararmos de estimular as nossas escolas a fazerem sempre melhor.

Universidade Católica Portuguesa, Centro Regional do Porto

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