Correia de Campos condenado a pagar dez mil euros por injúrias a gestores hospitalares

Ex-ministro da Saúde perdeu o recurso da sentença que dava como provado que ofendeu a honra de dois ex-administradores do Hospital de S. João, no Porto.

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“Não é pelo facto de ser ministro que [...] pode dizer tudo o que quiser”, advertiu o tribunal Pedro Cunha

O Tribunal Central Administrativo do Norte confirmou a sentença que condena António Correia de Campos a pagar cinco mil euros a cada um dos dois ex-gestores do Hospital de S. João, no Porto, que afastou dos cargos quando era ministro da Saúde.

A justiça tinha dado como provado que o antigo ministro socialista da Saúde ofendeu “a honra, bom- nome e reputação social” de Fernandes Tato e Carvalho da Silva quando, em 2005, na cerimónia de tomada de posse do conselho de administração que sucedeu a este dois gestores, afirmou que naquele momento se concluía "um ciclo de instabilidade infelizmente pontuado por negocismo e alguns laivos de clientelismo".

Os dois gestores, que tinham sido nomeados para os seus cargos um ano antes por Luís Filipe Pereira (antecessor de Correia de Campos no ministério), processaram o ex-ministro. A acção correu por vários tribunais durante anos. Em 2011, o juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto condenou-o a pagar cinco mil euros a cada um dos queixosos, num total de dez mil euros de indemnização.

Correia de Campos – que não quis comentar o acórdão agora conhecido, por ainda não ter sido notificado do mesmo – nunca se retractou das declarações proferidas na cerimónia de 2005. No recurso da sentença do TAF, pede-se a nulidade da decisão da primeira instância e alega-se que o ex-ministro da Saúde “não se dirigiu nem quis dirigir à gestão dos autores, mas a duas situações com génese muito anterior à administração dos autores e que vinham perturbando a prossecução do interesse público colocado a cargo do Hospital de S. João: o traçado do metro que circulava em frente da entrada para as urgências e a implantação de um empreendimento imobiliário [da empresa Bragaparques] nos jardins do hospital”. As expressões “clientelismo” e “negocismo”, lê-se nos fundamentos do recurso, foram assim usadas para qualificar essas situações.

Sobre o facto de ter aconselhado o conselho de administração que tomava posse a fazer auditorias à gestão anterior, o recurso considera que o tribunal retirou “ilações não-sustentadas”, dado que o ex-ministro da Saúde se referia “ao ciclo gestionário que se concluía com a tomada de posse, e que gerou as situações anormais criticadas, e não especificamente à gestão dos autores”.

Negócio polémico

Em causa estava o negócio entre a Bragaparques e o Hospital de S. João (a empresa explora o parque de estacionamento, hotel e centro comercial construídos em terrenos da unidade de saúde) que motivou grande controvérsia na altura. O reajuste ao contrato inicial de concessão, assinado por outro conselho de administração, em 2002, transformou o hospital de credor em devedor da Bragaparques. O conselho de administração que lhe sucedeu decidiu não pagar, a presidente foi exonerada, e os gestores nomeados em 2004 negociaram um acordo de compensação de créditos – que foi aprovado pelo secretário de Estado de Luís Filipe Pereira no último dia da campanha eleitoral que conduziu à substituição do Governo de Santana Lopes pelo de José Sócrates.

O Tribunal Central Administrativo (TCA) do Norte considerou agora como improcedentes as várias nulidades invocadas, processuais e outras, pedidas por Correia de Campos. “Temos de concluir que as expressões utilizadas pelo recorrente de ‘negocistas’ e ‘clientelismo’ no modo, tempo e lugar, são ofensivas do bom-nome e reputação dos recorridos e não podem reclamar-se de manifestações de liberdade de expressão ou mesmo de informação, na prossecução do interesse público”, refere o TCA, determinando que existe um facto ilícito, culposo e danoso.

Por fim, o tribunal conclui que Correia de Campos violou “os limites do cargo que ocupava, pois não é pelo facto de ser ministro que no uso da liberdade de expressão pode dizer tudo o que quiser”, não restando dúvidas de que, “ao proferir aquelas frases no contexto e nas circunstâncias em que o foram, o recorrente queria e sabia que, ao fazê-lo, estava a pôr em causa o bom-nome e reputação dos recorridos, ou seja, a culpabilidade é grave, é dolosa”.

 

 

 
 

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