400 polícias aguentaram protesto de colegas e oposição exige soluções

Oposição critica o Governo considerando que deve dar melhores condições aos polícias. Cavaco Silva lembra que “nunca se pode ignorar as vozes que se fazem ouvir na rua, quaisquer que elas sejam”.

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miguel manso

O Corpo de Intervenção (CI) da Unidade Especial de Polícia (UEP) contou com 400 agentes na manifestação de quinta-feira junto ao Parlamento. Todo o CI de Lisboa esteve empenhado num dispositivo nunca antes visto em manifestações, disse fonte policial. A PSP tinha ainda em prevenção, no Quartel da Calçada da Ajuda, 90 elementos do CI vindos do Porto, mas não chegaram a ser necessários. Também os elementos do CI de Faro, que estavam em prevenção, não chegaram a sair daquela cidade.

Nas duas horas de tensão vividas em frente à Assembleia da República (AR) enfrentaram-se dois grupos: de um lado 400 homens de serviço, do outro quase 20 mil colegas polícias manifestantes. “Registaram-se dez feridos e duas pessoas foram identificadas”, disse o subintendente Paulo Flor, da Direcção Nacional da PSP. Seis feridos eram polícias de serviço e quatro eram manifestantes. Dois dos polícias tiveram de receber tratamento no hospital.

Segundo fonte do CI, entre os empurrões verificaram-se agressões, algumas delas com armas brancas. Dois agentes foram ao hospital com cortes nos braços. E há relatos de que alguns manifestantes usaram gás pimenta na direcção dos polícias de serviço.

Os dois manifestantes identificados são guardas prisionais e passaram o cordão policial, tendo subido alguns degraus da escadaria da AR. Nenhum foi detido e deverão agora ser arguidos num inquérito ao caso. Um deles, noticiou o Diário de Notícias, está com pulseira electrónica por violência doméstica.

A liderança do dispositivo no local chegou a dar ordem para que fossem usados os cães de manutenção da ordem pública no momento de maior tensão. Quando os manifestantes derrubaram as barreiras e forçaram de sobremaneira o cordão policial, foi dada ordem às equipas de binómios cinotécnicos — 20 agentes tratadores e 20 cães — para saírem de imediato das viaturas e estarem a postos para avançar sobre os manifestantes, esclareceu fonte do CI.

Segundo a mesma fonte, a sua acção serviria para “limpar” a praça em frente à AR impedindo o avanço sobre a escadaria. Mas neste jogo de empurra entre polícias manifestantes e polícias de serviço, a ordem poderia ter sido trágica. É que os cães atacariam violentamente, tal como estão treinados, qualquer manifestante que empurrasse o tratador. A ordem foi abortada em segundos.

Também não chegou a ser lançado o gás lacrimogéneo para o qual havia ordem de uso em último recurso. Aliás, tal como o PÚBLICO havia noticiado, a PSP comprou há uma semana novos lotes daquele gás para substituir inúmeros lotes que estavam fora do prazo há cerca de três anos.

O secretário-nacional da Comissão Coordenadora Permanente, Paulo Rodrigues, que representa os principais sindicatos do sector, foi recebido pela presidente da AR, Assunção Esteves, e adiantou que esta se mostrou muito receptiva a discutir os problemas dos polícias. Rodrigues não deixou, porém, de sublinhar que a manifestação foi “uma bofetada de luva branca” para os que achavam que iria terminar em confrontos.

Passos não comenta
O protesto não mereceu qualquer reacção do primeiro-ministro. Nesta sexta-feira, Passos Coelho recusou comentar a situação após o congresso do PPE em Dublin. “Agora não”, disse aos jornalistas. Também o Ministério da Administração Interna, que tutela as polícias, rejeitou fazer qualquer comentário ao PÚBLICO.

A única voz do Governo a comentar o protesto foi o ministro da Defesa, Aguiar-Branco, considerando que “nem os próprios gostariam de ter uma situação que fosse considerada de privilégio quando há uma necessidade [de todos os portugueses] de fazer sacrifícios”.

Outra opinião tem a oposição. “Desta vez, o Governo não tem nenhuma desculpa para não encontrar soluções para os problemas que afectam os agentes que integram as forças de segurança”, disse o secretário-nacional do PS, António Galamba. O socialista lembrou que muitos agentes estão “numa situação pessoal insustentável”.

Também o PCP, através do deputado António Filipe, defendeu que o Governo “não pode permanecer indiferente” perante a manifestação e as justas reivindicações” dos polícias. E o BE apontou igualmente críticas ao Governo. A deputada Cecília Honório considerou ontem que o MAI deve criar condições necessárias para que as forças de segurança cumpram a sua missão.

Já o PSD, através do deputado Fernando Negrão, assumiu que a manifestação teve “obviamente” eco no Governo e que é importante “acentuar o diálogo com os sindicatos de policia. Telmo Correia, do CDS-PP, condenou as tentativas de subir a escadaria do Parlamento considerando-as inaceitáveis, apesar de reconhecer a relevância do protesto.

Já o Presidente da República disse que “nunca se pode ignorar as vozes que se fazem ouvir na rua, quaisquer que elas sejam desde que se apresentem como razoáveis”. E acrescentou que, de acordo com as informações de que dispõe, “houve bom senso e a contenção acabou por prevalecer” durante a manifestação das forças de segurança, pelas quais afirmou que tem “grande consideração”.

“Tenho imensa consideração pelas nossas forças policiais e das Forças Armadas. As forças policiais têm uma responsabilidade muito grande porque elas têm de ser o exemplo no cumprimento das leis da República”, sublinhou Cavaco Silva.

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