Contra o facilitismo nas políticas de educação

Com o novo cenário governativo, aguardam-se mudanças na política educativa nacional. Vários investigadores e peritos têm alertado publicamente para a necessidade de dar prioridade à educação neste novo ciclo. Muitos concordam que é tempo de repor a ordem e rever algumas políticas implementadas, mesmo conscientes dos custos que representam as mudanças sucessivas na política educativa nacional. É tempo de recusar o facilitismo e encarar a difícil missão de garantir condições e instrumentos que permitam a promoção do sucesso educativo dos jovens e de um melhor desempenho das escolas.

Mas é também importante não cair na tentação de reverter acriticamente todos os processos iniciados anteriormente, alguns dos quais tiveram início há mais de uma década. É o caso da instituição de instrumentos de comparação sistemática de resultados educativos entre escolas – testes nacionais e exames – e que estão na base da informação utilizada para construir os rankings das escolas que o Ministério da Educação (ME) apresentou.

Este ano, são disponibilizados dados que avaliam os efeitos do contexto social nos resultados atingidos e são seguidas séries de alunos, traçando a progressão entre exames de 6.º e de 9.º ano. É mais fácil e fiável agora comparar o comparável e produzir estudos de avaliação de impacto das diferentes experiências pedagógicas desenvolvidas nas escolas.

Esta novidade, em conjunto com o fim dos exames do 4.º ano e a, para já, manutenção de provas de avaliação de conteúdos no 6.º, no 9.º ano e no ensino secundário emprestam confiança ao otimismo com que se espera o futuro. Revelam a não diabolização dos momentos e instrumentos de prestação de contas, procurando neles implicar alunos, escolas, comunidades locais e o ME, garantindo, contudo, que são acautelados os efeitos que podem ter no processo de ensino-aprendizagem, nomeadamente quando aplicados numa idade muito precoce e condicionando progressões académicas posteriores.

Este pode ser um sinal de uma mudança há muito esperada e que marca a passagem de um paradigma que apenas responsabiliza alunos e famílias pelo sucesso educativo para outro, de regulação e avaliação das políticas públicas, em que o foco de análise é o desempenho das escolas e do ME na promoção do sucesso educativo. Neste novo enquadramento, os testes são, fundamentalmente, resultados a serem utilizados na avaliação e melhoria contínua do sistema educativo. São, efetivamente, a recusa do facilitismo.

Um dos principais desafios será garantir que esta forma de regulação da atividade das escolas e do sistema, baseada nos resultados de alunos em provas externas, não redunda numa excessiva e indesejada focalização em disciplinas alvo de exame, em conteúdos memorizáveis e numa subalternização das aprendizagens práticas face aos saberes teóricos apenas por serem mais facilmente comparáveis.

Para o futuro espera-se que estes esforços de monitorização e avaliação do desempenho comparado das escolas possam incluir também as ofertas vocacionais e profissionalizantes. A mesma atenção à qualidade das aprendizagens e a mesma exposição pública dos resultados atingidos é necessária no que se refere a estes cursos. Este progresso é importante também para que que estes não possam servir para encaixar os alunos que poderiam produzir resultados menos positivos nas comparações feitas com base nos exames aplicados nas ofertas regulares.

É tempo de voltar a colocar a equidade no centro das políticas educativas e de assumir, com responsabilidade, a função de promover políticas públicas de qualidade, colocando a prestação de contas no centro da relação com os cidadãos. Contra o facilitismo é necessário mudar.

Investigadora Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), Centro de Investigação e Estudos de Sociologia, Lisboa

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