Ministro tenta esvaziar greve dos médicos com esclarecimentos sobre “lei da rolha” e medicina do trabalho

Ministro da Saúde avançou nesta quarta-feira, no Parlamento, que ficou surpreendido com a ameaça de uma greve dos médicos e garantiu que o polémico projecto do código de éticapara as unidades de saúde avançará "sem qualquer intenção implícita ou explícita de cortar a liberdade de expressão".

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Enric Vives-Rubio (arquivo)

Foi com uma ameaça de greve dos médicos em cima da mesa que o ministro da Saúde esteve nesta quarta-feira no Parlamento, onde tentou esvaziar alguns dos principais motivos que estão na base da paralisação destes profissionais nos próximos dias 8 e 9 de Julho. Paulo Macedo garantiu aos deputados que o código de ética para as unidades de saúde, que ficou conhecido como “lei da rolha”, vai avançar “sem qualquer intenção implícita ou explícita de cortar a liberdade de expressão”. E prometeu também “clarificações” sobre o diploma que refere que os médicos de família vão passar a fazer consultas de medicina do trabalho.

Para cancelar a greve, a Federação Nacional dos Médicos (FNAM) exigia, além da suspensão imediata do artigo da proposta de código de ética que estabelece a proibição de falar por exemplo com a comunicação social, também a revogação da portaria que classifica e reestrutura os hospitais do SNS, implicando o fecho de vários serviços, e do diploma que prevê que os médicos de família passem a fazer consultas de medicina do trabalho já a partir do fim deste mês.

Paralelamente, a FNAM reclama o regresso do anterior programa de prescrição manual de medicamentos, enquanto o novo sistema electrónico não estiver a funcionar em pleno, e quer ver clarificado o novo regime de formação médica e alterada a legislação que prevê que os podologistas possam desempenhar funções que consideram ser exclusivas da sua profissão.

O ministro, durante a comissão parlamentar de Saúde, garantiu que o polémico projecto do código de ética e conduta para as unidades de saúde avançará “sem qualquer tentativa de censura”. O projecto foi mal acolhido pelos profissionais de saúde e partidos, que o apelidaram de “lei da rolha” por conter referências a limitações sobre as declarações que podiam ser feitas sobre os problemas das unidades de saúde.

Limitações à liberdade de expressão ficam de fora

Paulo Macedo não disse directamente os termos em que pretende que o código avance, mas reforçou que o texto que foi conhecimento público era apenas uma versão inicial e que no documento final “não pode haver qualquer referência” a questões que “limitem a liberdade de expressão”. O ministro comprometeu-se também a manter “mecanismos de denúncia” de todos os casos que se justifiquem e avançou que a proposta estará em consulta pública durante mais alguns dias, querendo a tutela que o documento esteja pronto a tempo de ser publicado nos primeiros dias de Julho. “Não constará do texto qualquer parte dada a interpretações que não são as que nós queremos”, reforçou no final, em declarações aos jornalistas.

A confusão instalou-se depois de o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) ter divulgado, em Maio, o parecer sobre um projecto de despacho, do gabinete do ministro da Saúde, que institui a obrigatoriedade de códigos de ética em todas as instituições do SNS e inclui uma proposta do modelo a seguir. O CNECV validou a proposta, apesar de ter sugerido algumas alterações.

O ponto que tem estado a desencadear maior controvérsia estipula que os funcionários do SNS “devem abster-se de emitir declarações públicas, por sua iniciativa ou mediante solicitação de terceiros, nomeadamente quando possam pôr em causa a imagem [do serviço ou organismo], em especial fazendo uso dos meios de comunicação social”. É o regresso da “lei da rolha”, classificaram vários responsáveis da Ordem dos Médicos, que se desmultiplicaram em críticas veementes ao projecto.

"Fomos surpreendidos com a ameaça de uma greve"

Já no que diz respeito à polémica sobre a Portaria 112/2014, que prevê uma “substituição dos médicos do trabalho por médicos de família”, foi o secretário de Estado Adjunto da Saúde, Fernando Leal da Costa, a prometer “clarificações” para breve. A equipa ministerial não avançou os esclarecimentos concretos, mas a tutela já tinha emitido um comunicado em que garantia que a portaria apenas vem regulamentar o que já existia e que “os médicos de família apenas continuarão a fazer o que já fazem”. Explicações que não têm convencido a Ordem dos Médicos e os sindicatos, que apelaram a que os profissionais de saúde não acatem as mudanças.

Sobre a greve em concreto, Paulo Macedo, em resposta a uma intervenção do PSD, admitiu que perante as conversações que têm decorrido com os sindicatos foram “surpreendidos com a ameaça de uma greve”. O deputado social-democrata Nuno Reis referiu-se a uma “guerrilha artificial” no sector da saúde e pediu uma reacção ao ministro. Paulo Macedo reconheceu que os profissionais têm trabalhado em condições difíceis, mas garantiu que a tutela tem dado passos “sem precedentes”, nomeadamente no que diz respeito às carreiras médicas que estavam congeladas.

Na comissão, Paulo Macedo aproveitou, ainda, para anunciar alguns números relacionados com as fraudes na área da saúde. Desde o início do ano já foram concluídos 21 inquéritos, 85 estão em curso e há 40 arguidos.

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