Cerca de 86% dos enfermeiros do Alto Minho em greve para reclamar mais 350 contratações

Paralisação nos hospitais de Viana do Castelo e de Ponte de Lima e em 13 centros de saúde assinala fim de uma série de greves convocadas pelo Sindicato dos Enfermeiros Portugueses durante este Verão.

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Segundo o SEP, é frequente os enfermeiros fazerem 50 horas a mais por mês Rui Gaudêncio

A greve de dois dias na Unidade Local de Saúde (ULS) do Alto Minho contou neste primeiro dia com uma adesão dos enfermeiros superior a 80%, com os valores a variarem entre os 85% no Hospital de Viana do Castelo e os 100% no Hospital de Ponte de Lima, segundo os dados do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), que indicam ainda que nos centros de saúde a adesão variou entre os 60% e os 100%.

Para Guadalupe Simões, da direcção da estrutura sindical, a adesão no turno da manhã superou as expectativas e “demonstra o elevado descontentamento” dos mais de 800 enfermeiros que trabalham nos dois hospitais e nos 13 centros de saúde que integram a ULS, para os quais o SEP reclama a contratação de mais 350 profissionais. Além da greve que termina na sexta-feira, o SEP assinalou ainda o protesto com uma concentração à porta do Hospital de Viana do Castelo durante a parte da manhã.

O principal motivo da paralisação, à semelhança do que tem acontecido noutras unidades de saúde, é a falta de profissionais e a sobrecarga de trabalho que coloca em risco a qualidade dos cuidados prestados. Segundo Guadalupe Simões, na ULS do Alto Minho há vários casos de horários de enfermeiros com 1000 horas a mais, sem que sejam contabilizadas como sendo extraordinárias, e pagamentos de trabalho extraordinário em atraso há seis meses, com os profissionais a não conseguirem gozar as folgas a que têm direito.

Porém, segundo a sindicalista, ao contrário do que acontece com administrações de outros hospitais, “neste caso é dito aos enfermeiros que estão sobrecarregados e a fazer um esforço enorme há muitos meses com uma carga de trabalho enormíssima que só é preciso contratar mais 19 pessoas”. Guadalupe Simões lamenta, por isso, a posição da administração da ULS numa altura em que “os enfermeiros estão a trabalhar em média pelo menos mais 50 horas por mês”. A dirigente relata ainda situações de contratos que não são atempadamente renovados pelo que os enfermeiros acabam por ir para casa um ou dois meses. “Mas quando voltam, como a data do contrato é colada à do anterior, acabam por ter de trabalhar 70 horas semanais em vez das 35 para compensar o tempo que estiveram em casa, mas em que também estiveram sem receber”, acrescenta.

De acordo com os dados do SEP, há enfermeiros responsáveis por 3100 utentes quando as recomendações da Organização Mundial de Saúde para as dotações seguras preconizam um atendimento que não exceda os 1200 (o equivalente a 350 famílias). Por outro lado, a falta de uma direcção de enfermagem neste estabelecimento é outro dos motivos do protesto.

Do lado da instituição, a administração da ULS do Alto Minho, num comunicado citado pela Lusa, sem avançar dados da greve, garante apenas que “os serviços assistenciais à população encontram-se assegurados, reconhecendo o Conselho de Administração a dedicação e empenho dos profissionais de enfermagem”. Na nota é ainda referido que as questões levantadas pelo sindicato na reunião que teve a 7 de Agosto com o conselho de administração “estão a ser objecto de apreciação”.

A greve na ULS do Alto Minho acontece na mesma semana em que o SEP fez também uma paralisação de nove horas no Centro Hospitalar de Lisboa Central, na terça-feira, e que contou com uma adesão superior a 80%. Este é o último protesto marcado para este Verão pelo sindicato, que fez nas últimas semanas greves em unidades de todo o país.

Contratação será prioritária

Entretanto, nesta semana a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) já veio dizer, na sequência de uma reunião com o SEP, que a contratação de enfermeiros será uma prioridade no reforço do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Em comunicado citado pela Lusa, a ACSS explicou que no encontro com o sindicato foi possível analisar as contratações já realizadas neste ano (cerca de 400) e as 579 no ano passado, contra 432 saídas em 2013. No encontro foram ainda analisadas em contratações em curso e definidas as necessidades e critérios para a categoria de enfermeiro-principal nos serviços do SNS.

“Em comparação com outros países da OCDE, Portugal registava, em 2013, um rácio de enfermeiros por mil habitantes de 6,23 e, em 2010, esse valor era de 5,92. Em 2012, Espanha registava um ratio de 5,3 enfermeiros por cada mil habitantes”, reforçava, ainda, o comunicado da ACSS.

Ainda assim, a verdade é que os rácios internacionais apontam para que Portugal esteja aquém do recomendado. Os dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), relativos a 2011, indicam que nessa altura existiam na média desta organização 8,8 enfermeiros por cada mil habitantes. Os números da OCDE mostravam ainda que o rácio de enfermeiro por médico é de 1,5, muito abaixo da média dos países da União Europeia, de 2,8. Já neste ano, o próprio Instituto Nacional de Estatística, a propósito do Dia Mundial da Saúde, também divulgou dados que indicavam que entre 2002 e 2012 houve um acréscimo de 23 mil enfermeiros com o rácio a passar de 4,0 em 2002 para 6,2 em 2012.

A falta destes profissionais também já foi mencionada pela própria troika (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu), que alertou para o “impacto ao nível de custos que poderá advir de uma utilização de médicos em cuidados que poderiam ser prestados por enfermeiros”, recomendado o reforço da oferta de enfermeiros como forma de tornar o Serviço Nacional de Saúde mais sustentável.

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