Carta aberta aos jovens portugueses

Se ainda não sabem exactamente qual rota seguir, sugiro o seguinte: Não sigam caminhos fáceis.

A semana passada quando estava a falar com o meu colega John Goodenough, de 91 anos, nomeado várias vezes para o Prémio Nobel, perguntei-lhe o que é que gostaria que lhe tivessem dito quando tinha 17 anos. Ele respondeu: “You can change things”. Este encontro fez-me pensar também no que eu teria gostado que me dissessem. Deixo aqui estes pensamentos.

A primeira prioridade é conhecerem as opções que têm. Não precisam de se sentir com pressa em definir um caminho muito específico. O que é de facto importante é descobrirem aquilo de que gostam. Se querem ser bons profissionais, têm que sentir prazer naquilo que fazem. Poderá parecer fácil definir este percurso. Contudo, esta escolha não é trivial devido à 1) falta de exposição a muitas áreas do saber, 2) dificuldade em avaliar na prática os detalhes da profissão e 3) desconhecer por completo as novas tendências da sociedade. O mundo de hoje avança a uma velocidade estonteante, pelo que temos que nos habituar à constante mudança.

Acima de tudo, é importante não deixarem de seguir os vossos sonhos. Não subestimem o vosso potencial. Aqueles que conseguiram alcançar grandes objectivos na vida começaram como vocês, a pensar, a sonhar. Explorem as opções que existem e escolham aquelas que abram mais hipóteses no futuro, sem abdicar dos sonhos. Três anos antes de publicar o seu primeiro volume da série Harry Porter, a escritora J.K. Rowling tinha acabado de se divorciar, estava desempregada e quase não conseguia juntar o suficiente para alimentar o seu filho. Dada a sua condição económica e sem computador, ela teve que escrever manualmente cada cópia de 200 páginas enviada às editoras. Antes de ser aceite pela Bloomsbury, o livro foi rejeitado dúzias de vezes. Hoje o livro Harry Porter e a Pedra Filosofal já vendeu 100 milhões de cópias.

Neste percurso, se ainda não sabem exactamente qual rota seguir, sugiro o seguinte: Não sigam caminhos fáceis. Há um prazer tremendo em vencer desafios, ir à procura de grandes ideias. Porém, estes grandes projectos não aparecem de imediato. É preciso talento, evidentemente, mas mais importante é dedicar tempo. Qualidade e excelência, seja ela no trabalho ou num relacionamento humano exige dedicação, concentração e capacidade autocrítica. É a superação das dificuldades que origina autoconfiança. Quando Bill Gates tinha 16 anos levantava-se diariamente às 2 da madrugada para ter acesso ao computador gigante da Universidade de Washington entre as 3 e 6 da manhã para programar. Em 1975, quando fundou a empresa Microsoft com apenas 18 anos, Bill Gates tinha já mais de 3000 horas de experiência em programação. Nunca pensem que o sucesso seja limitado pelos contactos pessoais, pelo acaso, pelo divino. Não se conformem com o mais-ou-menos, não deixem tarefas a meio, arrisquem.

Com o risco surgem novas experiências, as quais acompanham novos desafios. Estes percursos fora da zona de conforto, fazem-nos entender melhor aquilo que somos e aquilo que queremos ser. Fazem-nos modestos, pacientes, flexíveis. Abrem as perspectivas relativamente a outras ideias e transmite-nos a capacidade de aceitar o risco, o que aprofunda a maturidade intelectual e encoraja o pensamento independente.

Afinal de contas, a juventude é curta mas as oportunidades são imensas. Segue a tua bússola. Não desistas. Se não fores tu a fazê-lo por ti, ninguém o fará. E como disse o John Goodenough: “Muda as coisas”.

Professor Catedrático, Materials Science and Engineering Program, University of Texas at Austin, USA

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