Campanha defende contracepção de longa duração como alternativa à pílula

Derrubar os mitos dos métodos contraceptivos de longa duração é o principal objectivo de uma campanha a lançar nesta terça-feira.

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A maioria das mulheres recorre à pílula, mas há outros métodos contraceptivos disponíveis Enric Vives-Rubio

Para muitas mulheres, o conceito de “métodos contraceptivos de longa duração” diz pouco. O dispositivo intra-uterino (DIU), o sistema intra-uterino (SIU) e o implante hormonal são daquelas questões que suscitam imensas dúvidas e estão carregadas de mitos. Há quem ache que, uma vez colocados, são impossíveis de retirar durante um longo período de tempo. Há quem pense que são só para mulheres que não querem engravidar. Há ainda quem considere que são muito caros ou “só para idosas”. Mas vamos por partes, sobre uma questão em que em Portugal “ainda há muito pouca informação”. Quem o diz é Fernando Cirurgião, ginecologista e porta-voz da campanha de informação sobre contracepção de longa duração A Liberdade Começa Agora.

Os três são métodos contraceptivos de longa duração, apresentados nesta campanha como uma alternativa ao método mais popular de contracepção feminina, a pílula, que, segundo um estudo de 2015 da Sociedade Portuguesa de Ginecologia e Sociedade Portuguesa de Contracepção, é usado por cerca de 58% das mulheres em idade fértil. O objectivo é que as mulheres portuguesas se libertem do “regime diário de contracepção” e adoptem um método “sem horas nem datas marcadas”, destaca Fernando Cirurgião.

Aqui, o combate é precisamente contra estas “horas marcadas” para tomar a pílula que não raras vezes caem no esquecimento, tornando-a num método de contracepção susceptível a falhas. Segundo os dados disponíveis no site da campanha, neste tipo de casos, nove em cada 100 mulheres que tomam a pílula engravidam. No entanto, quando usada correctamente (tomada todos os dias, à mesma hora), apenas 0,3 em cada 100 engravidam. O site refere ainda que menos de uma em cada 100 mulheres engravida com o uso habitual de SIU, DIU ou implante hormonal.

A campanha pretende desmistificar e, acima de tudo, fornecer o material necessário para que “as mulheres possam fazer uma escolha informada”, salienta Fernando Cirurgião.

Três alternativas

As alternativas apresentadas pela campanha são o SIU, um dispositivo de plástico flexível em forma de T colocado no útero, o DIU, também intra-uterino e em forma de T que contém um fio de cobre, e o implante hormonal, que consiste num tubo de plástico flexível colocado no braço, debaixo da pele. Todos podem ter uma composição hormonal, mas “desde logo essa composição hormonal é muito inferior à que tem uma pílula”, garante o ginecologista, uma vez que a “descarga de hormonas é feita dentro do útero, o que quer dizer que o que poderá entrar em circulação é uma ínfima quantidade hormonal”. Se quisermos comparar, o médico garante que seria como tomar dois comprimidos numa semana, em vez dos habituais sete.

Já a correr nas redes sociais Instagram, Pinterest e YouTube, A Liberdade Começa Agora é lançada oficialmente nesta terça-feira. A campanha, de iniciativa da Bayer e com a chancela da Sociedade Portuguesa da Contracepção e da Associação para o Planeamento da Família, procura sensibilizar as mulheres jovens e a população feminina em idade reprodutiva para os benefícios que dizem ter este tipo de contracepção. Estão disponíveis vídeos, estatísticas e respostas às principais dúvidas.

Ao contrário do que é sustentado por vários mitos, estes são também métodos de contracepção “reversíveis”, explica o ginecologista. Apesar de ter uma duração longa, que pode ir dos três aos cinco anos no caso do SIU, dos cinco aos dez anos no caso do DIU e até aos três anos no caso do implante hormonal, qualquer um destes métodos pode ser retirado a qualquer momento por um médico caso seja essa a vontade da mulher. A colocação do SIU e do DIU é bastante rápida, segundo o especialista, e a utente pode ir embora logo após a consulta. No caso do implante hormonal, a sua colocação exige a administração de anestesia local.

Derrubar mitos

Segundo o médico do Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa, o receio das portuguesas perante estes métodos prende-se na questão de métodos como o SIU e o implante hormonal poderem reduzir o fluxo menstrual e diminuir a sua duração. O medo de que isto tenha implicações na saúde é fruto de uma “questão cultural”, defende o ginecologista. “Da mesma maneira que existiam mitos de que o sangue menstrual tinha que sair senão podia subir à cabeça, há questões culturais que têm vindo a perder peso”, diz, reiterando que “é possível não ter menstruação sem que isso seja patológico”. A ideia passa também por poder privar as mulheres “daquele desconforto que é, por vezes, a menstruação. Até porque a maioria das mulheres sente-se agradada com a ideia de não a ter”, afirma o ginecologista.

Tal como a pílula, o SIU e o implante hormonal são comparticipados pelo Estado e podem ser colocados gratuitamente numa consulta de planeamento familiar no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Por sua vez, o DIU não é comparticipado mas, segundo a campanha, é igualmente gratuito através das consultas no SNS.

Em dez anos, aumentou em mais de 8% o número de mulheres que usa métodos para prevenir a gravidez. Em alternativa à pílula, as portuguesas optam pela utilização do preservativo (14,3%), do DIU (11,8%) e, em menor expressão, do implante hormonal (5,4%). Segundo o estudo da Sociedade Portuguesa de Ginecologia e Sociedade Portuguesa de Contracepção, as mais jovens têm mais propensão para o uso do preservativo e o grupo dos 40 aos 49 anos afirmou-se pela utilização do DIU.

Efeitos secundários

Tanto o SIU como o implante hormonal têm efeitos secundários frequentes. Sintomas como dores de cabeça, dores abdominais e pélvicas, acne, alterações menstruais, aparecimento de quisto ovárico e inflamações afectam uma em cada dez mulheres, segundo os dados da campanha. Os benefícios podem, no entanto, compensar a preferência por estes métodos, consideram os seus promotores. E há um outro alerta: nenhum dos três métodos de longa duração protege contra a infecção do VIH/sida ou outras doenças sexualmente transmissíveis (DST).

A colocação e a remoção destes métodos devem ser feitas por um médico especializado — ginecologista ou médico de família. Fernando Cirurgião garante que a intervenção pode ser feita num centro de saúde e que estas entidades estão preparadas para a pequena intervenção.

Num período de dez anos, foi evidente para os investigadores a melhoria do acesso aos métodos de contracepção, com a legalização da venda de contracepção de emergência fora das farmácias (2005) e a democratização do acesso à informação com o ensino da educação sexual nas escolas de ensino básico e secundário (a partir de 2010). O grande passo foi, no entanto, dado pela despenalização da interrupção voluntária da gravidez, em 2007, que contribuiu para um maior conhecimento da população sobre as medidas contraceptivas a adoptar. As consultas de planeamento familiar entraram nos centro de saúde e nos hospitais, o que permitiu enraizar uma “noção de aconselhamento” entre as famílias e os adolescentes.

Texto editado por Tiago Luz Pedro

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