A ministra da Justiça e o banco de dados

São previsíveis. A abertura solene e pomposa do ano judicial é isso. Sempre o mesmo. Missa e discursos. Nada fica, ou quase. Falam entre si. Recados uns aos outros. Para a comunidade, nada.

Ficou aquele compromisso da ministra da Justiça. O seu ministério, disse, estava a preparar um registo de pedófilos. Dos predadores sexuais. Para protecção e defesa dos menores.

Vai tarde. Já devia ter feito isso há tempos se cumprisse as regras do Parlamento Europeu e do Conselho a que está sujeita. Devia ter consultado, registado e cumprido a Directiva 2011/92/EU, de 13 de Dezembro de 2011. A directiva, que diz respeito “à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e à pornografia infantil”, obriga o Governo a legislar sobre o tema até 18 de Dezembro de 2013. A ministra teve mais de dois anos para cumprir a legislação comunitária. Mas isso que interessa? Se se tratasse de autorização para gerar impostos, a prontidão seria outra. A ministra asseverou, não vai lá muito tempo, que tomava na Justiça duas medidas estruturais por semana. Desta vai agora tratar! Versou-a como se fosse iniciativa do seu ministério.

Medidas de prevenção e protecção de crianças podem esperar. Inibições que constam da directiva podem esperar. Saber em que condicionalismos o Estado vai impedir contactos com crianças, temporária ou permanentemente, de condenados por abusos sexuais de crianças, pode esperar. Definir os requisitos para que o Estado forneça aos empregadores elementos dos certificados do registo criminal dos abusadores sexuais, pode esperar.

O relevante é discursar. Os órgãos de comunicação social publicam. Isso é que interessa. Constitui prioridade. Prioridades são o “massacre de impostos” de que falou na mesma sessão a novel bastonária da Ordem dos Advogados.

A ministra não esqueceu o lugar-comum: “Uma Justiça tardia nunca será uma verdadeira Justiça”. É verdade. Também lhe cabe a sua quota-parte.

Sobre a matéria, o Governo tem definidos na directiva as traves mestras da legislação a criar, os princípios essenciais. E basta. É só ter saber e arte para lhes dar corpo. O Governo não tem.

João Miguel Tavares escreveu no PÚBLICO que, em matéria de arte, o Governo está uns degraus acima dos taliban e outros tantos abaixo dos filisteus. Na arte e noutros assuntos.

Diploma de registo de abusadores sexuais, acesso a esse registo e para que efeitos. Por quem? Em que condicionalismos? Que inibições para os mesmos? Respeitando os seus direitos de cidadãos.

É assim coisa tão hercúlea que implique um batalhão de assessores e anos e anos de árdua investigação e trabalho?

 

Sugerir correcção
Comentar