A escuridão

Portugal fica feio quando está pardacento. As nossas paisagens foram feitas para se verem. As nossas cores dão-se mal com a falta de luz.

Não é só o frio, que parece sempre novo, mais frio do que o frio de que nos lembramos. Como é que o frio piora de ano para ano? Se calhar o que piora é a nossa capacidade para aguentá-lo.

Nem é só a chuva, que parece mais molhada do que a anterior e mais enviesada, para mais bem nos poder encharcar.

Nem é só o vento que sabe ser mau só por si mas que está sempre a arranjar maneiras novas de conspirar com o frio e com a chuva, alcançando combinações tão horríveis que nem sequer somos capazes de admirar a originalidade de cada uma.

É também a escuridão. Odeio a escuridão. A escuridão do meio-dia é mais tenebrosa do que a escuridão da meia-noite. É melancólico ter todas as luzes acesas às duas da tarde e vê-las continuar acesas pela tarde e pela noite fora, até ser hora de nos deitarmos e de finalmente fazer sentido a escuridão.

Quando é inverno os dias de sol são recebidos como milagres. No outono os dias de escuridão são vistos como pragas de mau gosto, se ainda nem é Inverno nem nada.

Portugal fica feio quando está pardacento. As nossas paisagens foram feitas para se verem. As nossas cores dão-se mal com a falta de luz.

Pode estar frio mas basta um dia de sol, sem vento ou chuva, para nosdevolver o mundo perdido. A luz de Dezembro é nítida e longínqua. Os olhos encantam-se com vistas inesperadas de árvores com folhas a dançar à volta delas, algumas delas a caírem-nos aos pés.

Mas quando chove e está frio e vento a escuridão apaga a esperança e a memória da luz e do sol.

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